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quarta-feira, 1 de agosto de 2012

Espanhóis prometem protestos até recuperarem direitos eliminados com a crise


Povo tomou as ruas ao longo de todo o semestre contra política de cortes que atinge saúde, educação, aposentados e desempregados. Movimentos sociais prometem mais uma safra de grandes manifestações a partir de setembro, quando deve ocorrer nova greve geral no país ibérico. A reportagem é de Guilherme Kolling, direto de Madri

Guilherme Kolling - Carta Maior

Madri - Os protestos contra os cortes drásticos nos gastos públicos são diários na Espanha. Diversas categorias de servidores fazem atos em praças, estações de trem, em frente a hospitais e em pontos simbólicos do centro de Madri, como a Puerta del Sol. Além de ações pontuais que já fazem parte do cotidiano do país ibérico nos últimos meses, o primeiro semestre foi marcado por grandes manifestações.

A primeira da série na gestão do conservador Mariano Rajoy, que assumiu o governo espanhol no final do ano passado, foi em 29 de março: uma greve geral que parou o país. O alvo foi a reforma nas leis trabalhistas. A medida facilitou demissões na iniciativa privada e tirou direitos de trabalhadores em uma nação em que desemprego atinge a um em cada quatro habitantes da população economicamente ativa - 24,6% ou 5,7 milhões de pessoas; entre os jovens, o índice chega a 50%.

A mudança na legislação voltou a pautar outra grande mobilização, em 1º de Maio, quando as centrais sindicais lideraram os protestos, novamente com críticas ao "ajuste" nas contas públicas feito governo de direita do Partido Popular (PP) e imposto pela União Europeia, como pré-requisito para que o país recebesse recursos de fora. O cartaz de "No a los recortes!" com o desenho de uma tesoura já era onipresente e segue sendo exibido por ativistas nas ruas.

Duas semanas depois do Dia do Trabalhador, todo o país voltou a ser mobilizado, desta vez pelos "Indignados", movimento liderado por jovens que surgiu em 2011 nas redes sociais e que estava completando seu primeiro aniversário. O coletivo - conhecido como "15M", por ter sido fundado em 15 de maio - voltou a tomar a Puerta del Sol e levou milhões de pessoas às ruas de centenas de cidades da Espanha.

Apesar das palavras de ordem contra políticos e até sindicatos - "Que no! Que no! Que no nos representan!" -, o grupo tinha pelo menos um ponto em comum de luta com os manifestantes de outros atos: sua contrariedade à política de cortes de gastos, que afetam saúde e educação. A crítica também foi direcionada ao repasse de bilhões de euros para bancos.

As manifestações seguiram no primeiro semestre, mas só voltaram a pautar o noticiário com a demanda dos mineiros, que iniciaram uma marcha desacreditada no início, no norte do país. Depois de 20 dias de caminhada e 400 km percorridos, chegaram à capital aclamados por milhares de madrilenhos que foram prestar o seu apoio no dia 10 de julho. A ameaça ao emprego desses trabalhadores pela diminuição drástica de recursos para as minas virou um emblema para todas as categorias de funcionários públicos atingidas e pelos cidadãos que não estão de acordo com o ajuste nas contas.

Mas ao invés de receber o grupo, o governo colocou a tropa de choque em frente ao Ministério da Indústria e Comércio e na rua que dá acesso ao Congresso. No mesmo dia, aprovou o maior corte da história recente da democracia da Espanha, que tem 30 anos. Anunciou uma redução de gastos de 65 bilhões de euros, penalizando funcionários públicos, aposentados e desempregados.

A resposta foi imediata. Uma semana depois, espanhóis saíram às ruas em mais de 80 cidades. Com a união das principais centrais sindicais do país - algumas inclusive rivais, mas que viram nas medidas do governo um inimigo em comum -, uma massa protestou contra políticos e banqueiros, exigindo sacrifícios também das organizações financeiras e cortes em cargos e benefícios de políticos.

Centenas de entidades e milhares de cidadãos foram dar o seu apoio e cobrar sacrifício de políticos e banqueiros. E todos prometem ficar nas ruas até que o governo mude sua postura e que os direitos dos trabalhadores e os serviços sejam repostos. As mobilizações na rua devem voltar com força em setembro, culminando com uma nova greve geral.

Especialistas apostam que atos públicos ganharão força
Estudiosos dos movimentos sociais apostam que a pressão da população na Espanha vai se manter e até se reforçar. Enquanto isso, a administração comandada por Mariano Rajoy tenta se blindar, ignorando os protestos e mantendo sua política de corte de gastos.

“O governo tem medo da participação dos cidadãos. Por isso, simbolicamente rodeia o Parlamento de barricadas que impedem o acesso. Considera o povo um inimigo. Se negou a receber os mineiros, que vinham acompanhados de uma impressionante quantidade de trabalhadores”, observa o catedrático em direito do trabalho da Universidade Castilha La Macha, Antonio Baylos.

O acadêmico aponta que a luta do povo espanhol já é longa e tem cada vez mais pessoas se incorporando a ela. “As mobilizações vão continuar. E até o final de setembro ou início de outubro teremos uma grande greve.”

Baylos reforça que o mandatário espanhol, Mariano Rajoy, conseguiu produzir uma convergência de sindicalistas e associações profissionais de todo tipo para combater o seu programa. Ele diz que os movimentos sinalizam que não querem esperar até a próxima eleição para uma mudança de rumo. A principal proposta, já defendida pelos dois principais sindicatos do país, CCOO y UGT, é exigir a convocação de um referendo para que os espanhóis possam manifestar sua opinião sobre as medidas do governo que não haviam sido propostas no programa eleitoral.

O economista e vice-presidente da Fundación Alternativas, Nicolás Sartorius, um dos pensadores da esquerda espanhola, concorda que as mobilizações sociais vão continuar até que o governo modifique sua política econômica. “Só austeridade e cortes vão aprofundar a recessão e aumentar o desemprego.”

Ele ressalta que somente em Madri, nos últimos meses, foram mais de mil manifestações de rua, o que deve voltar com força depois das férias de agosto. Em setembro, os movimentos sociais planejam organizar um referendo nacional sobre as medidas do governo. A campanha, projeta Sartorius, pode durar vários meses e culminar com greve geral.

“O horizonte dos protestos dependerá da evolução econômica no país, da política europeia e da situação do governo, mas o rumo está claro: forçar uma nova política econômica que faça compatível a austeridade e o crescimento econômico”, aponta ele.

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