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terça-feira, 12 de novembro de 2013

A crescente resistência às guerras de Obama com aviões não tripulados

“Temos uma mensagem muito simples para os Estados Unidos: Como justificam matar uma avó? De que modo isso nos torna mais seguros?” questiona Mustafa Qadri, autor de um novo relatório da Amnistia Internacional.
“Antes não temia os aviões não tripulados (drones), mas agora, quando os vejo sobrevoar, pergunto-me: serei eu a próxima vítima?”. Este é o depoimento de Nabila Rehman, uma menina de 9 anos de idade do noroeste do Paquistão, que ficou ferida num ataque norte-americano com um avião não tripulado há um ano, na pequena localidade de Ghundi Kala. Nabila viu a sua avó, Mamana Bibi, ser despedaçada no ataque. O seu irmão, Zubair, também ficou ferido. O seu caso voltou a centrar a atenção no polémico programa de assassinatos seletivos que se tornou central na política externa e na estratégia de guerra do Presidente Barack Obama a nível mundial.
“Temos uma mensagem muito simples para os Estados Unidos: Como justificam matar uma avó? De que modo isso nos torna mais seguros?” Mustafa Qadri propôs esta pergunta ao programa de notícias de “DemocracyNow!”. Qadri é o autor de um novo relatório da Amnistia Internacional intitulado “Serei a próxima vítima? Os ataques dos Estados Unidos com aviões não tripulados no Paquistão” (Will I Be Next?’ U.S. Drone Strikes in Pakistan).
Nabila e o seu irmão Zubair, que tem 13 anos, fazem parte do crescente número de vítimas de ataques com aviões não tripulados, mas sua situação é especial, já que conseguiram comparecer perante o Congresso norte-americano juntamente com o seu pai, Rafiq ur Rehman, para testemunhar o ataque e de como ele destruiu a sua família. A sua história é relatada num novo documentário que será lançado esta semana de forma gratuita na Internet, denominado: “Unmanned: America’s Drone Wars”, realizado por Brave New Filmes e Robert Greenwald. No documentário, Rafiq, um mestre de escola primária, descreve assim o ocorrido no dia do ataque:
“Antes de os ataques terem ocorrido, desfrutávamos da vida. Eram 14:45h do dia 24 de outubro de 2012. Depois de finalizar as aulas nesse dia, dirigi-me à aldeia para comprar bens para a escola”. Quando regressou, disseram-lhe que a sua mãe tinha morrido. Havia uma cratera onde antes estava o jardim. A sua mãe estava a apanhar quiabos com as crianças. “Foi aqui que mataram a minha mãe. (...) A minha família ficou destruída desde que mataram a minha mãe”. Ao todo, nove crianças ficaram feridas em consequência do ataque. Este seguiu o parâmetro típico: houve um ataque inicial, seguido de outro dirigido contra quem se aproximou para socorrer os feridos.
Este é o testemunho de Zubair, de 13 anos de idade, ante o Congresso: “Quando o avião não tripulado lançou o primeiro ataque, a terra tremeu e levantou-se um fumo negro. Sentia-se no ar um cheiro tóxico. Corremos, mas minutos mais tarde o avião voltou a disparar. As pessoas da aldeia acorreram a ajudar-nos e levaram-nos para o hospital. Passámos a noite em grande agonia no hospital, e na manhã seguinte, operaram-me”.
Atacar socorristas é um crime de guerra. Mustafa Qadri, da Amnistia Internacional, explicou: “Por exemplo, um grupo de trabalhadores de uma localidade muito pobre próxima da fronteira com o Afeganistão, foi alvo de um ataque. Estavam dentro de uma tenda e oito deles morreram na ação. Os ataques também são dirigidos contra as pessoas que vão ajudar as vítimas ou procurar sobreviventes. As testemunhas e as vítimas que sobrevivem aos ataques falam-nos detalhadamente do terror, do pânico que sentem quando os aviões não tripulados os sobrevoam. O informe inclui outros casos de pessoas que são assassinadas por acudirem às vítimas. Esses casos podem constituir crimes de guerra. Trata-se de uma acusação muito grave. Há provas suficientes para demonstrar [que se trata de crimes de guerra]. Devido ao secretismo que rodeia este programa, e que se trata de uma zona muito remota, somente poderemos chegar à verdade quando os Estados Unidos começarem a falar claro e a explicarem a justificação destas matanças”.
O próprio Presidente Obama defende sistematicamente a exatidão e a legalidade do programa de assassinatos seletivos. No entanto, a sua própria heroína da defesa dos direitos humanos, Malala Yousafzai, de 16 anos de idade, confrontou-o recentemente sobre isso. Malala é a jovem estudante paquistanesa atingida a tiro na cabeça, por um grupo de talibãs armados, por apoiar publicamente a educação de meninas e mulheres. Muitos pensaram que ganharia o Prémio Nobel da Paz este ano. Apesar de a Casa Branca não tornar públicos os seus comentários, Malala emitiu uma declaração sobre a sua visita à família Obama, na qual sustenta: “Também expressei a minha preocupação sobre os ataques com aviões não tripulados que estimulam o terrorismo. Pessoas inocentes morrem nesses ataques, e isso provoca ressentimento entre a população paquistanesa. Se centrássemos os nossos esforços na educação conseguiríamos um grande impacto”.
Cada vez há maior resistência à guerra do Presidente Obama com aviões não tripulados. No norte do estado de Nova York, cinco ativistas que se opõem aos ataques com aviões não tripulados foram absolvidos, numa decisão surpreendente, depois de terem sido julgados por bloquear a entrada da base aérea Hancock Field, da Guarda Nacional, próximo de Syracuse, em Nova York. O grupo Code Pink está a organizar uma conferência nacional em Washington D.C. para 16 e 17 de novembro, denominada “Aviões não tripulados no mundo: proliferação e resistência”. Pelo menos um piloto de avião não tripulado, Brandon Bryant, ex operador de sensores do programa ‘Predator’ da Força Aérea dos Estados Unidos, falou sobre o horror de matar civis inocentes e a síndrome de stress postraumático que sofreu como consequência. Bryant disse: “Deram-nos autorização para disparar contra essas pessoas e o modo como elas reagiram fez-me realmente duvidar da sua participação. As pessoas de lá, os residentes locais, têm que se proteger dos talibã do mesmo modo que nós o fazemos, como membros das forças norte-americanas. De maneira que acho que provavelmente estavam no lugar errado, no momento errado. Acusaram-me de usar imagens poéticas para descrever o ataque, mas eu vi este homem sangrar, vi o homem que estava atrás. A sua perna direita foi mutilada no ataque e sangrou através da artéria femoral. Vi isso no ecrã do computador. Estava pixelizado, mas podia-se ver que era um ser humano. E podia-se ver o que estava a fazer e a cratera provocada pelo avião não tripulado, do míssil Hell Fire. E provavelmente poderia ver-se as partes do corpo do homem dispersas em seu redor”.
Apesar de apenas cinco membros do Congresso (todos democratas) terem assistido ao testemunho da família Rafiq, as palavras do jovem Zubair ficaram registadas. Trata-se de um doloroso testemunho sobre a política dos denominados “assassinatos seletivos” com aviões não tripulados impulsionada pelo Presidente Obama. Zubair afirmou: “Já não gosto do céu azul. De facto, agora prefiro o céu cinzento. Os aviões não tripulados não voam quando o céu está cinzento. E por um breve período de tempo, diminui a tensão mental e o temor acalma-se, mas quando o céu se descobre, os aviões não tripulados regressam, e com eles o medo”.
Artigo publicado em Truthdig a 30 de outubro de 2013. Denis Moynihan colaborou na produção jornalística desta coluna. Texto em inglês traduzido por Mercedes Camps para espanhol. Tradução para português de Carlos Santos para Esquerda.net

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