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sexta-feira, 1 de novembro de 2013

"O filho da excelência" de Amazan e a polícia no trato da violência urbana

O Filho Da Excelência
Compositor - Amazan

Hoje a nossa polícia
Está muito fiscalizada
Por isso é que cabra ruim
Deixou de levar mãozada
É, porque antigamente
Cabra metido a valente
Quando um soldado pegava
Ficasse com foi num foi
Era cada tapa ôi
Que o mocotó entrançava.

Hoje a polícia não pode
Mais dar cacete em ninguém
Cinegrafista amador
Em toda janela tem.

Mas antes tinha uns soldado
Daquele mal encarado
Na rota da bacurau
Que andava cum farnezim
Procurando cabra ruim
Pra dar um samba de pau.

Até que um certo dia
Às duas da madrugada
O quartel passou um rádio
A bacurau foi chamada Pra ir prender um rapaz
Que andava tirando a paz
E o sono do pessoal
Com o som do carro ligado
Passando em sinal fechado
E dando cavalo-de-pau.

A bacurau fez fiapo
Para o local indicado
Não demorou encontrar
O rapaz embriagado
Tinha descido do carro
Tava comprando cigarro
Mas quando espiou de lado
Viu o camburão parando
E o soldado pulando
Já com o braço levantado.

Foi pulando e foi dizendo
- Teja preso, seu safado
Mas antes eu vou lhe dar
Um murro tão condenado
Que tu vai rolar no chão.
Aí o boy disse: _Meu irmão
Tenha calma, tu tá quente
Bater em mim ninguém vai
Senão eu conto a meu pai
O juiz Manoel Vicente.

O soldado deu um freio
Que o coturno cantou
Uma travada no braço
Que o cotovelo estalou.
Aí o cabo disse: -Junim,
Rapaz, tu aqui sozim
Essa hora biritando
Vamo pra casa, danado
Teu pai tá preocupado
E a gente lhe procurando!

Aí levaram Junim pra casa
Bateram numa janela
Manoel Vicente saiu
Com os ói chei de remela.
Aí o cabo disse: -Doutor
Esse filho do senhor
Estava um pouco alterado
Não podíamos prendê-lo
Achamos melhor trazê-lo
Em casa ele está guardado.

E nisso Manoel Vicente
Nem sabia o que fazer
Olhando para a polícia
Começou a agradecer:
Ô, que polícia educada
- Muito bem rapaziada
Gostei da iniciativa
Quando de mim precisar
Basta só me procurar
Lá na Liga Desportiva.

O soldado franziu a testa
E virou como um girassol
Você está me dizendo
Que é juiz de futebol?!
Pobre de Manoel Vicente
Respondeu todo contente:
- Sim, o melhor do estado!
Aí não disse mais nada
Levou uma burduada
Que caiu de cu trancado.

Deram um cacete em Junim
Que o mijo espirrou no chão
Jogaram os dois pelo fundo
Das calças no camburão
Pobre de Manoel Vicente
Preso inocentemente
Sem ter feito nada errado
Junim sem uma pestana
E os dois passaram a semana
Vendo o sol nascer quadrado.


Essa poesia composta por um cantador popular, Amazan, que sempre dizem o que lhes rodeia, demonstra dois aspectos, principalmente, da realidade oligárquica relacionada com o poder e a polícia; em primeira lugar os privilégios dos que mandam e do outro lado o autoritarismo e até o gosto pela brutalidade.

O poeta demonstra um certo "saudosismo" do tempo em que a polícia praticava toda sorte de agressão violenta, não que o tenha deixado, todos sabemos que as delegacias e penitenciárias brasileiras são em sua maioria centros de tortura, mas era uma violência admirada, o mesmo argumento de quem diz que os Direitos Humanos são "direitos de bandidos" são saudosos dessa maneira de policiar, quer eliminar violência com violência, uma "paz violenta", o que nunca dá certo.

O personagem não apanhou de imediato por se dizer filho de um Juiz, ou seja a lei não tem valor para os que ostentam uma posição privilegiado se superpõem à lei, algo ainda muito verificado.

Esses vícios nos colocam diante de uma realidade no trato do controle da violência em condição endêmica segundo a ONU, com uma taxa de homicídios superando os 27 por cem mil habitantes anuais, a questão da atuação policial tem despertado ultimamente, com o desaparecimento de Amarildo no Rio, a morte de um jovem em São Paulo, inúmeros debates. Um dos problemas cruciais é a "ideologia" que reina na área, o noticiário policial, este  apela para a vingança, o drama, a explicação errada, explora o sofrimento das vítimas, o lado errado para se discutir a problemática social.

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