Conflitos no campo crescem em número e intensidade onde o capital avança - Blog A CRÍTICA

"Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados." (Millôr Fernandes)

Últimas

Post Top Ad

quinta-feira, 1 de maio de 2014

Conflitos no campo crescem em número e intensidade onde o capital avança



AUTOR: Marcela Belchior
Adital

No último ano, estatísticas sobre diversos setores das lutas populares se agravaram. Por outro lado, 2013 é considerado um ano importante para as mobilizações populares, alterando a agenda de debates e chamando a população brasileira à discussão. A informação é do Relatório Anual da Comissão Pastoral da Terra (CPT), que aponta que os conflitos e a violência no campo atingem, indiscriminadamente, famílias inteiras, homens, mulheres, idosos, jovens e crianças.

O estudo mostra que, diferentemente do restante do Brasil, na Amazônia o número de famílias despejadas em 2013 cresceu 76%. "Como em anos anteriores, os conflitos ganham em número e intensidade nas áreas para onde o capital avança”, destaca a CPT. "Barragens para usinas hidrelétricas, mineração, grilagem de terras, extração de madeira e monoculturas (pecuária, soja, dendê, eucalipto) avançam sobre terras indígenas, quilombolas e de outras comunidades camponesas. A Amazônia continua sendo considerada colônia, fonte de recursos naturais a serem explorados pelo resto do Brasil e do mundo”, explica a publicação.

Com relação à escravidão no campo e na cidade, as estatísticas indicam que 2013 foi o primeiro ano em que o número de resgates no trabalho escravo urbano foi maior do que no rural. A novidade, afirma a CPT, estaria relacionada a uma atenção crescente das equipes de fiscalização com as condições dos trabalhadores de setores econômicos tipicamente urbanos, como a construção civil e a indústria têxtil.

Dos 2.242 trabalhadores resgatados no ano passado no Brasil, 1.153 foram libertados em atividades não rurais, o que representa 51% do total de pessoas retiradas dessas condições. Ainda assim, é no campo que se concentra o maior número de casos de trabalho escravo, com 141 ocorrências (70% do total). "O que se pode destacar é que boa parte dos trabalhadores resgatados no meio urbano foi aliciada no campo”, enfatiza a CPT. Os casos estão ligados à mineração, desmatamento, reflorestamento, carvão vegetal, extrativismo vegetal, cana-de-açúcar e outras lavouras, além da pecuária.

No que diz respeito à violência contra as mulheres, segundo o documento, em 2013, os dados registrados pela CPT indicam que três das 34 pessoas assassinadas são mulheres; uma delas figura entre as 15 pessoas que sofreram tentativa de assassinato; e 40 outras estão registradas entre as 241 pessoas ameaçadas de morte.

Com relação ao número de conflitos e violência contra povos indígenas e comunidades tradicionais, houve um pequeno recuo de 2012 para 2013. Foram registrados 1.266 conflitos no ano passado, quando, em 2012, foram 1.364, referentes a conflitos por terra, trabalhistas e outros. O número de conflitos pela água apresentou crescimento de 32%. Já quanto ao número de violências contra a pessoa, o registro de assassinatos apresentou pequeno declínio de 36 para 34 casos.

No quadro de violências, houve 829 vítimas de assassinatos, ameaças de morte, prisões, intimidações, tentativas de assassinato e outras (238 delas são indígenas). Os estados que lideram o ranking da violência contra índios são Mato Grosso do Sul e Bahia. Por outro lado, no último ano, as ações indígenas se multiplicaram em todas as regiões brasileiras. Foram 156 manifestações, envolvendo 35.208 indígenas. Houve também 61 retomadas de antigos territórios.

Segundo Antônio Canuto, secretário da Coordenação Nacional da CPT, em entrevista à Adital, a Reforma Agrária não está na pauta do governo e o diálogo com as lutas populares é complicado. Ele explica: "O governo do PT [Partidos dos Trabalhadores] fez várias ações afirmativas, como o Bolsa Família. Setores dos movimentos sociais ficaram satisfeitos e esmoreceram, ficaram fragilizados. Mas essas ações não respondem a necessidades fundamentais, como a reforma agrária, e os movimentos não batem de frente, porque o PT ainda é considerado aliado”.

Como se construiu o relatório

A violência em torno dos conflitos no campo começou a ser registrada no final da década de 1970. Os dados são obtidos por meio de agentes das Regionais da CPT, declarações, cartas assinadas, boletins de ocorrência, relatos repassados pelos movimentos sociais, igrejas, sindicatos e outras organizações e entidades ligadas às lutas das trabalhadoras e trabalhadores. Além disso, são recolhidas informações de revistas, jornais, boletins e publicações diversas de instituições, partidos e órgãos governamentais.

"O que esse relatório registra é apenas uma parte da realidade, os conflitos e a violência que de alguma forma chegam ao nosso conhecimento. Muitíssimos mais casos acontecem nessa imensidão do Brasil e que só são conhecidos por quem sofre a violência ou pelas famílias e comunidades envolvidas em algum conflito”, conclui a coordenação nacional da CPT.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Post Bottom Ad

Pages