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quarta-feira, 23 de julho de 2014

Israel: Rumo ao fascismo

Num cenário de racismo lato e assumido, de uma nova legislação discriminatória contra a minoria palestina de Israel, e de um discurso político belicista formatado pela ideologia do choque das civilizações, o estado hebreu está a afundar-se no fascismo. Artigo de Michel Warschawski.

Durante os últimos 45 anos tenho participado em numerosas manifestações, desde pequenas concentrações de alguns irredutíveis a manifestações de massas que reuniam mais de 100.000 pessoas; manifestações tranquilas, inclusive festivas, e manifestações durante as quais éramos atacados por grupos de direitas, ou inclusive pelas pessoas que passavam. Deram-me golpes, e devolvi-os, e aconteceu-me, sobretudo quando tinha responsabilidades, ficar nervoso. Mas não me recordo de ter tido medo.
Mobilizado – na realidade, detido na prisão militar por ter-me negado a unir-me à minha unidade que devia ir para o Líbano - não participei, em 1983, na manifestação durante a qual foi assassinado Emile Grunzweig. Pelo contrário, fui responsável pelo serviço de ordem da manifestação que, um mês mais tarde, atravessava Jerusalém para assinalar esse assassinato. Nela conhecemos a hostilidade e a brutalidade das pessoas com que nos cruzávamos, mas ali também não tive medo, consciente de que essa hostilidade de uma parte da população que passava não superaria uma verdadeira linha vermelha, que, no entanto, tinha sido cruzada um mês antes.
Desta vez tive medo.
Há alguns dias, eram umas centenas aqueles, como eu, se manifestavam no centro da cidade de Jerusalém contra a agressão a Gaza, convocados pelos “Combatentes pela Paz”. A cerca de trinta metros, e separadas por um impressionante cordão policial, algumas dezenas de fascistas arrotam o seu ódio, bem como slogans racistas. Nós somos várias centenas e eles só algumas dezenas e, no entanto, fazem-me medo: no momento da dispersão, ainda protegidos pela polícia, volto a casa colado às paredes para não ser identificado como um desses esquerdistas que odeiam.
De volta a casa, tento identificar esse medo que nos preocupa, pois estou longe de ser o único que o sente. Dou-me conta de que Israel em 2014 não é já só um estado colonial que ocupa e reprime os palestinos, senão também um estado fascista, com um inimigo interior contra o qual existe ódio.
A violência colonial passou a um grau superior, como demonstrou o assassinato de Muhammad Abu Khdeir, queimado vivo por três colonos; a esta barbárie acrescenta-se o ódio contra esses israelitas que, precisamente, se negam a odiar o "outro". Se, durante gerações, o sentimento de um “nós” israelitas transcendia os debates políticos e - salvo algumas raras exceções, como os assassinatos de Emile Grunzweig ou depois Yitshak Rabin - impediam que as divergências degenerassem em violência criminosa, temos entrado num período novo, um novo Israel.
Isto não é produto de um dia, e da mesma forma que o assassinato do primeiro ministro em 1995 foi precedido de uma campanha de ódio e de deslegitimação dirigida em particular por Benjamin Netanyahu, a violência atual é o resultado de uma fascização do discurso político e dos atos que engendra: são já inumeráveis as concentrações de pacifistas e anticolonialistas israelitas atacadas pelos capangas de direita.
Os militantes têm cada vez mais medo e hesitam expressar-se ou manifestar-se, e o que é o fascismo senão semear o terror para desarmar aqueles que considera ilegítimos?
Num cenário de racismo lato e assumido, de uma nova legislação discriminatória contra a minoria palestiniana de Israel, e de um discurso político belicista formatado pela ideologia do choque das civilizações, o estado hebreu está a afundar-se no fascismo.
20/07/2014
*Michel Warschawski (Estrasburgo, 1949) é jornalista e militante pacifista da extrema esquerda israelita, bem como cofundador e presidente do Centro de Informação Alternativa (http://www.alternativenews.org) de Jerusalém.
Artigo reproduzido pelo Viento Sur.

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