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segunda-feira, 8 de dezembro de 2014

Da Ideia do Belo em Geral

I - Chamamos ao belo ideia do belo. Este deve ser concebido como ideia e, ao mesmo tempo, como a ideia sob forma particular; quer dizer, como ideal. O belo, já o dissemos, é a ideia; não a ideia abstracta, anterior à sua manifestação, não realizada, mas a ideia concreta ou realizada, inseparável da forma, como esta o é do principio que nela aparece. Ainda menos devemos ver na ideia uma pura generalidade ou uma colecção de qualidades abstraídas dos objectos reais. A ideia é o fundo, a própria essência de toda a existência, o tipo, unidade real e viva da qual os objectos visíveis não são mais que a realização exterior. Assim, a verdadeira ideia, a ideia concreta, é a que resume a totalidade dos elementos desenvolvidos e manifestados pelo conjunto dos seres. Numa palavra, a ideia é um todo, a harmoniosa unidade deste conjunto universal que se processa eternamente na natureza e no mundo moral ou do espírito. 
Só deste modo a ideia é verdade, e verdade total. 

Tudo quanto existe, portanto, só é verdadeiro na medida em que é a ideia em estado de existência; pois a ideia é a verdadeira e absoluta realidade. Nada do que aparece como real aos sentidos e à consciência é verdadeiro por ser real, mas por corresponder à ideia, realizar a ideia. De outro modo, o real é uma pura aparência.

II - Agora, se dizemos que a beleza é a ideia, é porque beleza e verdade, num certo aspecto, são idênticas. Há, contudo, uma diferença entre o verdadeiro e o belo. 
Georg Hegel
O verdadeiro é a ideia considerada em si mesma, no seu principio geral e em si e pensada como tal. Não existe, pois, para a razão sob a sua forma exterior e sensível, mas no seu carácter geral e universal. Quando o verdadeiro aparece imediatamente ao espírito na realidade exterior e a ideia se confunde e se identifica com a sua aparência exterior, então a ideia não é somente verdadeira, mas também bela. 

Define-se, pois, o belo: a manifestação sensível da ideia (Dassinnlich Scheinen der Idee). 

No belo, a forma sensível nada é sem a ideia. Os dois elementos do belo são inseparáveis. Aqui está porque, do ponto de vista da razão lógica ou da abstracção, o belo não pode compreender-se. A razão lógica (Verstand) nunca apreende mais que um dos lados do belo: fica no finito, no exclusivo e falso. O belo, pelo contrário, é em si mesmo infinito e livre. 

III - O carácter infinito e livre reconhecia-se quer no sujeito, quer no objecto, e neste do duplo ponto de vista teórico e prático. 

1º O objecto, no seu aspecto teórico (especulativo), é livre, visto que não está equilibrado como uma simples existência particular e individual, que, como tal, tem a sua ideia subjectiva (sua íntima essência e a própria razão de ser) fora de si mesma, desenvolve-se sem regra e sem lei, dispersa-se e perde-se na multiplicidade das relações exteriores. Porém, o objecto belo deixa ver a sua própria ideia realizada na sua existência mesma e nessa unidade interior que constitui a sua vida. Por ela, o objecto (...) libertou-se de toda a dependência do que não seja ele mesmo. Perdeu o seu carácter finito e limitado para se transformar em infinito e livre. 

Por outro lado, o sujeito, o eu, em sua relação com o objecto, cessa igualmente de ser uma simples abstracção, um sujeito que percepciona e observa fenómenos sensíveis e os generaliza. Chega a ser concreto neste objecto, porque toma nele consciência da unidade da ideia e da sua realidade, da reunião concreta dos elementos que anteriormente estavam separados no eu e no seu objecto. 

2º Sob o aspecto prático, como foi demonstrado anteriormente, não existe o desejo na contemplação do belo. O sujeito retira os próprios fins perante o objecto, que considera como existindo por si mesmo, como tendo fim próprio e independente. Por isso, o objecto é livre, visto que não é um meio, mas um instrumento afecto a outra existência. Por seu turno, o sujeito (o espectador) sente-se inteiramente livre porque a distinção entre os seus fins e os meios para satisfazê-los desaparece nele, porque, para ele, a necessidade e o dever de preencher estes fins, realizando-os e objectivando-os, não o retêm na esfera do finito, e, pelo contrário, tem ante si a ideia e o fim realizado de modo perfeito. 

Eis aqui porque a contemplação do belo revela algo de liberal; permite ao objecto manter-se na sua existência livre e independente. O sujeito que contempla não sente qualquer necessidade de possui-lo ou de utilizá-lo. 

Ainda que livre e fora de todo o alcance exterior, o objecto belo contém todavia, e deve conter em si, a necessidade como relação necessária que mantém a harmonia entre os seus elementos; não aparece, porém, sob a forma da necessidade, porquanto deve dissimular-se sob a aparência de uma disposição acidental onde não penetra qualquer intenção. De outro modo, as diferentes partes perderão a propriedade de serem por si mesmas e para si mesmas. Estão ao serviço da unidade ideal, que as mantém sob a sua dependência. 

Em virtude deste carácter livre e infinito que reveste a ideia do belo, como o objecto belo e a contemplação dele, o domínio do belo escapa à esfera das relações fintas e eleva-se à região da ideia e da sua verdade. 

Georg Hegel, in ' Do Belo e Suas Formas '

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