Thomas Piketty sobre a zona euro: “Criámos um monstro” - Blog A CRÍTICA

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quinta-feira, 12 de março de 2015

Thomas Piketty sobre a zona euro: “Criámos um monstro”

Em entrevista à Spiegel, o economista francês defendeu que “a forma como a Europa se comportou na crise foi nada menos que desastrosa". Piketty afirmou ainda que o Pacto de Estabilidade é uma “verdadeira catástrofe” e acusou França e Alemanha de “amnésia histórica”.


Foto de Sue Gardner.
Questionado sobre quais as probabilidades de a União Europeia e Atenas chegarem a um acordo sobre o caminho a adotar por forma a enfrentar a crise, Piketty frisou que “a forma como a Europa se comportou na crise foi nada menos que desastrosa”.
“Há cinco anos, os Estados Unidos e a Europa tinham aproximadamente a mesma taxa de desemprego e nível de dívida pública. Mas agora, cinco anos depois, a história é diferente: O desemprego explodiu aqui na Europa, ao mesmo tempo que tem vindo a diminuir nos Estados Unidos. A nossa produção econômica permanece abaixo do nível de 2007. Diminuiu em até 10 por cento em Espanha e Itália, e em 25 por cento na Grécia”, lembrou Piketty durante a entrevista à revista alemã Der Spiegel.
Os europeus, “pobremente organizados” como são, usaram os seus “instrumentos políticos impenetráveis para transformar a crise financeira, que começou nos Estados Unidos, numa crise da dívida”, avançou o economista francês, sublinhando que “isto transformou-se tragicamente numa crise de confiança por toda a Europa”.
“Ao criar a zona euro, criamos um monstro”
“Podemos ter uma moeda comum para 19 países, mas cada um desses países tem um sistema fiscal diferente, e a política fiscal nunca foi harmonizada na Europa. Não pode funcionar. Ao criar a zona euro, criamos um monstro”, defendeu Thomas Piketty.
O economista acrescentou ainda que “antes de existir uma moeda comum, os países podiam simplesmente desvalorizar as suas moedas para se tornarem mais competitivos”, sendo que, “como um membro da zona euro, a Grécia foi impedida de usar esse conceito estabelecido e eficaz”.
“Tornou-se claro que os países não podem reduzir os seus déficits, a menos que a economia cresça”, defendeu.
França e Alemanha padecem de “amnésia histórica”
Lembrando que nem a Alemanha nem a França, que estavam “profundamente endividadas em 1945, reembolsaram essas dívidas na totalidade”, e que são “precisamente estes dois países que estão agora a dizer aos europeus do Sul que têm que pagar as suas dívidas”, Piketty acusou Berlim e Paris de uma “amnésia histórica” que traz “consequências terríveis”.
Questionado sobre se “os outros devem agora pagar as décadas de má gestão por parte dos governos de Atenas”, o autor de 'O Capital no século XXI' repudiou “um modelo europeu de punição coletiva entre gerações”, salientando que “é esse egoísmo motivado por nacionalismo” que, neste momento, o “desconcerta mais do que qualquer outra coisa”.
O Pacto de Estabilidade é uma “verdadeira catástrofe”
Para Piketty, “definir regras de défice fixas para o futuro” não funciona.
“Não se podem resolver os problemas da dívida com regras automáticas que são sempre aplicadas da mesma forma, independentemente das diferenças nas condições económicas”, avançou, defendendo que a solução passa por “investir mais dinheiro na formação dos nossos jovens, e na inovação e investigação”.
O economista francês propôs também uma união fiscal e a harmonização dos orçamentos, reefrindo que é necessário criar “um fundo de amortização da dívida comum para a zona do euro, como o proposto pelo Conselho Alemão de Especialistas em Economia, por exemplo”.
“Cada país ficaria responsável por reembolsar a sua parte da dívida total. Por outras palavras, os alemães não teriam de pagar dívidas antigas dos italianos, e vice-versa. Mas haveria uma taxa de juros comum para os eurobonds, que seriam utilizados para refinanciar a dívida”, adiantou.
Segundo Piketty, “precisamos de uma comunitarização das dívidas”, que tem de ser “democraticamente legitimada”.
Para esse efeito, o economista propõe “um parlamento europeu para a zona euro, que seria composto por membros dos parlamentos nacionais”, estando cada país representado neste parlamento proporcionalmente à dimensão da sua população.
Piketty considera que esta medida não deverá partir do governo francês, que tem “medo dos mercados e da democracia”.
“Repreender constantemente os gregos ou portugueses preguiçosos é irresponsável”
Referindo que a vitória eleitoral do Syriza pode “servir como uma espécie de terapia de choque para quem está no poder”, para que os governantes se apercebam de que “o que têm feito não está a funcionar, e que têm de ter uma abordagem diferente”, o economista alertou para o perigo de o poder político estabelecido continuar a alimentar nacionalistas como os da Frente Nacional francesa.
“Repreender constantemente os gregos ou portugueses preguiçosos é irresponsável”, rematou.

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