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sábado, 12 de março de 2016

Balança mas não cai?

Ministério Público de S. Paulo pede a prisão do ex-presidente Lula da Silva, mas o pedido é tão desastrado que atrai críticas até do principal partido da oposição, o PSDB. Este fim de semana, ocorre nova manifestação pelo afastamento de Dilma Rousseff. Presidente garante que não renuncia e convida Lula para ministro do seu governo. 

Por Luis Leiria.

Até agora, Lula recusou entrar no governo, mas não esconde a pretensão de se candidatar em 2018
Até agora, Lula recusou entrar no governo, mas não esconde a pretensão de se candidatar em 2018
O pedido de prisão preventiva de Lula da Silva, apresentado a uma juíza criminal por três promotores do Ministério Público de S. Paulo, ganhou celebridade instantânea por dois motivos. O primeiro, pela dramaticidade da medida, inédita em relação a um ex-presidente. Acusado de ocultar património ao negar ser o proprietário de um apartamento na praia do Guarujá, Lula, alegam os promotores, deve ser preso preventivamente porque pode prejudicar a investigação, destruindo provas, e representar um perigo para a manutenção da ordem pública, insuflando a população contra o judiciário e tendo fácil acesso a meios de fuga. O segundo, pela falta de fundamentação concreta e pelos erros grosseiros do texto de 13 páginas, que procura mostrar erudição mas confunde Hegel com Engels e cita Nietzsche atribuindo-lhe a ideia de que “todos os seres humanos estão no mesmo plano".
Resultado: as redes sociais foram inundadas de posts humorísticos acerca da passagem do texto em que os promotores afirmam que as condutas de Lula “certamente deixariam Marx e Hegel envergonhados”, quando evidentemente queriam dizer Engels e não Hegel. De tal forma que o assunto “Marx e Hegel” entrou na lista dos trending topics do Twiter no Brasil. “É muito irónico que o Lula seja ofendido de burro por não ter ensino superior e o pedido de prisão para ele tenha um erro tipo Marx e Hegel” – este é apenas um exemplo das centenas de comentários twitados.
Até o líder do PSDB, o principal partido da oposição, no Senado, Cássio Cunha Lima, criticou os promotores, afirmando não haver fundamentos para autorizar a prisão preventiva de Lula
A juíza Maria Priscilla Veiga Oliveira, do Tribunal criminal de S. Paulo, ainda não decidiu se aceita ou não o pedido de prisão, mas avisou que a decisão "demandará algum tempo". Só que ainda antes do veredito, o requerimento dos três promotores está a conseguir o que parecia impossível: a quase unanimidade a condená-lo. Até o líder do PSDB, o principal partido da oposição, no Senado, Cássio Cunha Lima, o criticou, afirmando não haver fundamentos para autorizar a prisão preventiva de Lula.
“Não faz o menor sentido, a prisão preventiva em caso de perigo à ordem pública é usada quando a liberdade da pessoa gera algum tipo de risco difuso para a sociedade. Discordar das decisões judiciárias, dar coletiva de imprensa e pedir apoio da militância é liberdade de expressão, um direito constitucional. Ele não pode discordar do Ministério Público?”, argumentou o jurista Thiago Bottino ao El País Brasil.
O jornal Folha de S. Paulo, que não nutre qualquer simpatia pelo ex-presidente, resumiu em editorial: “[os promotores] obtiveram um quase absoluto consenso. Foi tamanha a inépcia de suas pretensões que, do governo à oposição, de defensores intransigentes do impeachment a convictos militantes petistas, não houve quem não criticasse a iniciativa”.
A ação do Ministério Público paulista está a ser vista como uma tentativa precipitada dos promotores Cassio Conserino, José Carlos Blat e Fernando Henrique Araújo ganharem protagonismo em tempos de judicialização da política, quando os magistrados se exibem com as vestes de justiceiros. Os promotores paulistas estariam antecipando-se ao juiz Sérgio Moro, de Curitiba, que dirige a Operação Lava Jato, e que também investiga o apartamento do Guarujá. Mas o tiro saiu pela culatra e os três promotores já estão a ser chamados de “os três patetas”.
O facto, porém, de as investigações sobre corrupção no Brasil se concentrarem agora sobre o ex-presidente Lula da Silva teve o efeito de regar com gasolina o incêndio da crise política brasileira, acirrando os ânimos e dando novo impulso ao movimento que pede o afastamento (impeachment) da presidente Dilma Rousseff.
Impeachment volta à ribalta
O movimento pelo afastamento da presidente Dilma Rousseff estava, até há pouco, claramente enfraquecido. Por um lado, os últimos protestos, em agosto, tiveram uma participação abaixo do esperado, e muito inferior aos de 15 de março do ano passado. Por outro, o principal aliado dos defensores do impeachment, o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, perdeu qualquer autoridade moral para levar adiante no Parlamento o processo legal de afastamento da presidente, por estar ele próprio envolvido até o pescoço na corrupção investigada pela Lava Jato.
Mas uma reportagem publicada na revista Isto É em 3 de março dando conta da existência de um depoimento do senador Delcídio do Amaral, ex-líder do governo no Senado, que envolveria tanto Dilma Rousseff quanto Lula da Silva no escândalo do “Petrolão”, veio reacender o ânimo dos defensores do impeachment. No dia seguinte, houve o episódio do interrogatório forçado de Lula, e agora o pedido de prisão do ex-presidente. Mesmo sendo certo que ambas as iniciativas foram desastradas e não tiveram o efeito pretendido, é igualmente verdade que reacenderam tensões e provavelmente deram um impulso às manifestações pelo impeachment de Dilma que já estavam marcadas para este domingo dia 13 de março.
Da dimensão das mobilizações pró-impeachment deste domingo pode depender em grande parte o futuro do governo de Dilma Rousseff
Da dimensão destas mobilizações, convocadas por movimentos cívicos de direita e também pelo PSDB, que fez anúncios na televisão a apelar à participação, dependerá em grande parte a possibilidade de Dilma Rousseff se manter na Presidência.
Outro acontecimento decisivo neste fim de semana é a convenção nacional do PMDB, partido do vice-presidente Michel Temer e principal aliado do PT no governo. O PMDB está dividido entre os que defendem a manutenção do compromisso com o governo (o partido tem sete ministérios) e os que pugnam pelo rompimento. Se o PMDB rompesse com o governo, este ficaria literalmente suspenso no ar, sem base parlamentar maioritária de qualquer tipo, nem na Câmara dos Deputados, nem no Senado. Mas o PMDB é o partido que procura sempre ficar por cima e, por isso, à cautela, e aguardando os próximos acontecimentos, fez um acordo interno entre as suas alas para adiar a decisão em relação ao governo por um prazo de pelo menos 30 dias.
Desorientação no PT
Do lado dos apoiantes do governo, parece reinar a desorientação. Desde que começou o mandato, Dilma Rousseff vem aplicando uma tática conciliadora com os partidos adversários, que consistiu em aplicar as principais bandeiras não do seu próprio programa, mas sim do programa dos adversários que perderam as eleições. Foi o caso do ajuste fiscal – medidas de cortes orçamentais e de benefícios sociais e de aumentos de impostos – levado a cabo pelo então ministro da Fazenda (Finanças) Joaquim Levy, um gestor que a presidente foi buscar à banca. Foi o caso da recentemente aprovada lei antiterrorista, que é acusada de servir para reprimir os movimentos sociais, e também das medidas que enfraquecem ainda mais a Petrobrás e entregam às multinacionais boa parte da exploração petrolífera do Pré-Sal. Todas estas medidas levaram à erosão da base social do governo, mas não foram suficientes para apaziguar a oposição.
Nos últimos dias, a presidente foi forçada a afirmar que não se demite e não se resigna com a situação, e terá convidado Lula a entrar no governo como ministro, no Ministério que ele quisesse. A entrada de Lula no governo permitir-lhe-ia escapar do assédio da Lava Jato, já que lhe daria o chamado foro privilegiado, que faria que ele só pudesse ser julgado pelo Supremo Tribunal. Por outro lado, a vinculação direta de Lula com o governo que atingiu o grau de popularidade mais baixo de sempre e no momento em que o país está mergulhado numa profunda recessão (-3,8% no ano passado) poderia comprometer seriamente as aspirações eleitorais do ex-presidente para as eleições de 2018, onde aparece bem colocado nas sondagens. Até agora, Lula recusou o convite.
Por lado, o PT decidiu cancelar uma manifestação de apoio a Dilma e a Lula convocada para o mesmo domingo para S. Paulo, devido ao risco de ocorrerem confrontos. Os defensores do governo de Dilma, agrupados na Frente Brasil Popular, estão a chamar manifestações nas capitais de estado, contra o golpe e em defesa da democracia, na sexta 18 de março. Na última vez que houve uma disputa nas ruas, a direita pró-impeachment mobilizou muito mais gente que os defensores do governo.
Outra manifestação, com objetivos mais abrangentes, é chamada pela Frente Povo Sem Medo para o dia 31 de março, em Brasília. Levanta bandeiras concretas como contra a anunciada Reforma da Previdência, a privatização da Petrobrás, a Lei Anti-terrorismo e a criminalização dos movimentos sociais, contra o ajuste fiscal e os cortes nos investimentos sociais, em defesa do emprego e dos direitos dos trabalhadores, pela saída de Eduardo Cunha da presidência da Câmara dos Deputados e contra o impeachment de Dilma Rousseff.

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