Por Daniel Nascimento (*)
Ao menos na teoria, já podemos dizer que o programa Juros Por Educação é uma das iniciativas mais inteligentes do Estado brasileiro nos últimos anos porque alia duas frentes que normalmente caminham em paralelo, mas raramente se encontram de forma tão direta: a economia e a educação. Ao transformar a renegociação das dívidas dos estados com a União em oportunidade de investimento em educação profissional e tecnológica (EPT), o governo cria um mecanismo que converte passivos em ativos sociais, preparando o país para colher frutos rápidos e sustentáveis.
O programa nasce dentro do Programa de Pleno Pagamento de Dívidas dos Estados (Propag), instituído pela Lei Complementar nº 212/2025. Nele, os estados e o Distrito Federal podem renegociar seus débitos, escolher uma das taxas de juros previstas e destinar a contrapartida da redução desses encargos para a expansão da EPT. Uma parte desse montante vai para o Fundo de Equalização Federativa, garantindo redistribuição equilibrada e permitindo que mesmo os entes com menor endividamento possam investir na área.
Essa engenharia financeira tem um propósito claro: garantir que os recursos sejam direcionados para a abertura de novas matrículas em cursos técnicos, a melhoria da infraestrutura e a aquisição de equipamentos, sistemas e materiais permanentes. Enquanto as metas anuais de expansão não forem cumpridas, ao menos 60% dos recursos precisam obrigatoriamente ser aplicados na EPT. Isso assegura que a prioridade esteja sempre no que mais importa: a formação de jovens para o trabalho e para a cidadania.
Os resultados, diferentemente de outras políticas de longo prazo, tendem a ser sentidos em poucos anos. A educação profissional técnica tem reconhecida capacidade de inserção rápida no mercado de trabalho, aumentando a empregabilidade e a renda dos estudantes e movimentando as economias locais por meio desta emancipação social. As vagas criadas nos cursos técnicos não são apenas números em uma estatística, mas possibilidades concretas de transformação social e econômica.
Além disso, o monitoramento via Sistec (Sistema Nacional de Informações da Educação Profissional e Tecnológica) garante transparência e acompanhamento rigoroso das metas pactuadas. As matrículas contempladas abrangem desde o ensino médio integrado e concomitante até a modalidade subsequente e a EJA integrada, alcançando diferentes perfis de estudantes, inclusive adultos.
O Juros por Educação se soma a outras políticas estratégicas, como a expansão do ensino médio em tempo integral e a Política Nacional de Ensino Médio, consolidando um ecossistema de transformação que responde às necessidades das juventudes e às demandas do mundo do trabalho em constante mudança.
Um dos aspectos mais relevantes do programa é sua robusta base legal. A Lei Complementar nº 212/2025 não apenas criou o Propag, mas também estabeleceu o vínculo direto entre renegociação da dívida e investimento em educação. Isso garante previsibilidade e segurança jurídica, fatores essenciais para que estados planejem suas ações de forma consistente, sem risco de descontinuidade a cada ciclo político.
O Decreto nº 12.433/2025, por sua vez, detalha a operacionalização da lei, definindo prazos, regras de adesão e critérios de aplicação dos recursos. Ele também introduz o Fundo de Equalização Federativa, peça-chave para assegurar justiça distributiva: estados com menor endividamento, que poderiam receber menos benefícios diretos, passam a contar com uma compensação que lhes permite igualmente investir na EPT. Essa lógica fortalece o princípio federativo e garante que todos avancem juntos.
Ao atrelar metas anuais de expansão de matrículas ao Plano Nacional de Educação (PNE - metas 10 e 11), a legislação estabelece uma conexão direta entre o financiamento e as políticas educacionais de longo prazo. Isso impede que os recursos sejam dispersos em ações pontuais e reforça o caráter estratégico da EPT como prioridade nacional. O efeito combinado da lei e do decreto é transformar um mecanismo de ajuste fiscal em uma verdadeira política de Estado e não de governo.
Enxergo o Juros Por Educação como uma medida de equilíbrio entre responsabilidade fiscal e investimento social. Mais do que um programa de financiamento, é uma demonstração de que gestão econômica pode, e deve, caminhar de mãos dadas com a democratização da educação. Isso, é claro, quando bem executado, e o passado recente exige que sejamos vigilantes. Pois se de fato garantir a união desses dois campos, o país planta hoje as sementes de um futuro mais produtivo, inclusivo e competitivo.
(*) Daniel Nascimento é advogado e coordenador de cursos técnicos da Fundação de Apoio à Tecnologia



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