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terça-feira, 9 de setembro de 2025

Tecnologia na educação pública: o desafio real de inovar com equidade



Por Victor Hill, fundador e Diretor Presidente da Associação Cactus


A ideia de que a tecnologia pode transformar a educação não é nova. Mas nas escolas públicas brasileiras, essa promessa ainda caminha a passos lentos diante de uma realidade desigual e, muitas vezes, negligenciada. Inovar nesse contexto exige mais do que equipamentos: exige compromisso com equidade. Afinal, de que adianta uma lousa digital se a conexão à internet é inexistente ou se os professores não têm formação para utilizá-la pedagogicamente? Dados do Censo Escolar 2023 revelam que apenas 57% das escolas públicas urbanas têm acesso à internet com velocidade adequada. Quando se trata de áreas rurais, esse número despenca. A internet ainda não é vista como infraestrutura básica, o que deveria ser tão óbvio quanto água e luz. Sem conexão, ferramentas digitais se tornam inócuas, e os estudantes continuam à margem da era digital.

Programas como o Educação Conectada, do governo federal, são passos importantes, mas ainda insuficientes. O desafio não é apenas técnico; é também estrutural e político. Parcerias com operadoras e empresas de tecnologia poderiam acelerar esse processo, oferecendo pacotes gratuitos para estudantes e professores. Mas isso exige vontade pública e articulação entre setores. E não se trata de grandes investimentos em tecnologia de ponta. A verdadeira inovação muitas vezes nasce de soluções simples. Celulares, por exemplo, já fazem parte do cotidiano de muitos estudantes e, com uso pedagógico, podem se transformar em poderosos instrumentos de aprendizado. Plataformas gratuitas como Google Classroom, Khan Academy, YouTube Edu e Canva for Education já estão disponíveis, o que falta é apoio para integrá-las de forma eficiente ao currículo escolar.

Aqui entra um ponto central: a formação dos professores. Segundo a pesquisa TIC Educação 2022, apenas 28% dos docentes da rede pública se consideram muito preparados para usar tecnologias digitais no ensino. Isso evidencia que o problema não está na falta de ferramentas, mas na falta de preparo para usá-las de maneira estratégica. Investir em capacitação continuada, com foco prático, é essencial. Cursos que abordem o uso de vídeos, podcasts, redes sociais e jogos digitais podem transformar a sala de aula em um ambiente mais engajador e conectado à realidade dos alunos.

Laboratórios criativos, mesmo com recursos limitados, também fazem a diferença. Espaços maker montados com materiais recicláveis ou kits de baixo custo estimulam o protagonismo dos estudantes, o pensamento crítico e a colaboração. Experiências como clubes de programação, oficinas de vídeo ou rádio escolar mostram que a inovação não precisa ser cara, ela precisa ser contextualizada. Além disso, escolas não devem caminhar sozinhas. Parcerias com ONGs, universidades e startups podem levar mentorias, oficinas e até equipamentos para onde o poder público não chega. Projetos de extensão e colaboração com a comunidade ajudam a traduzir a tecnologia para o contexto local, fortalecendo a conexão entre ensino e território.

O recado é claro: sem equidade, não há inovação real. Tecnologia sem acesso, sem preparo docente e sem articulação comunitária apenas reforça as desigualdades existentes. O futuro da educação pública depende de escolhas que priorizem a inclusão. Se o objetivo é preparar os jovens para um mundo mais digital e justo, é preciso garantir que todos tenham não só acesso à tecnologia, mas também condições reais de aprender com ela.


*Victor Hill é fundador e Diretor Presidente da Associação Cactus, reconhecido como um dos jovens mais influentes do Brasil pela Forbes Under 30 de 2024.

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