Segundo o Superior Tribunal de Justiça, obrigações assumidas por um dos parceiros em prol da economia doméstica atingem também o outro, mesmo que não tenha participado diretamente da transação
Jornal da USP - Uma recente decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reafirmou que, em casamentos sob o regime de comunhão de bens — e até em outras formas de união —, as dívidas contraídas por um dos cônjuges em benefício da família podem ser cobradas também do outro. O caso teve origem em Goiás, quando um homem emitiu cheques em 2021, não quitou a dívida e, sem ter bens em seu nome, levou o credor a pedir a inclusão da esposa no processo judicial. O Tribunal estadual havia negado a solicitação, mas o STJ reconheceu a responsabilidade solidária do casal.
O professor Eduardo Tomasevicius Filho, da Faculdade de Direito (FD) da USP, explica o que se discutiu nesse julgamento: “É que a dívida feita pelo marido foi usada para a economia doméstica, ou seja, para as despesas da casa”. Nesses casos, o Código Civil determina que ambos respondam solidariamente — o que permite ao credor cobrar a totalidade do valor de qualquer um dos dois. “Não é porque um só assinou o cheque que o outro está isento. Quando a dívida serve à família, ela é dos dois”, reforça o professor.
Casados ou em união estável, a regra é a mesma
A solidariedade vale não apenas para casamentos formais, mas também para uniões estáveis. “Hoje, muita gente vive em união estável, e a lei equipara seus efeitos aos do casamento. Não é preciso um tempo mínimo — basta provar a convivência”, explica Tomasevicius. Segundo ele, a confusão no caso julgado pelo STJ se deu porque o Código Civil ainda usa expressões antigas, como “economia doméstica”, o que gerou dúvidas sobre o alcance da regra.
A decisão vale para gastos familiares, como a compra de um carro usado por todos ou despesas da casa. “Se o bem é usado pela família, o outro cônjuge pode ser cobrado”, resume o professor. O problema, ele observa, é que a solidariedade amplia o risco: “Em casos assim, o credor pode exigir o pagamento total de qualquer um dos dois, mesmo que apenas um tenha feito a dívida”.
Como se proteger legalmente
Para evitar surpresas, o Código Civil prevê o que se chama de autorização conjugal. “Ela serve justamente para impedir que um dos parceiros contraia dívidas irresponsáveis”, explica Tomasevicius. A regra exige a assinatura de ambos, por exemplo, para dar um imóvel em garantia, prestar fiança ou aval. “É uma forma de proteger o patrimônio da família e a economia doméstica”, afirma.
O professor alerta que muitos problemas surgem porque as pessoas omitem que são casadas ou vivem em união estável. “Isso complica a vida do credor e do próprio casal”, diz. Em resumo, a decisão do STJ reforça o que já está previsto em lei: quando se trata de compromissos assumidos para o bem comum, a dívida de um é, também, a dívida do outro.



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