A crise do capitalismo e o desenvolvimento desigual das nações - Blog A CRÍTICA

"Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados." (Millôr Fernandes)

Últimas

Post Top Ad

terça-feira, 25 de outubro de 2011

A crise do capitalismo e o desenvolvimento desigual das nações


Por Umberto Martins, Portal Vermelho


Mas uma característica fundamental da crise é sua diversidade. Ela se manifesta de maneira diferente nos países e impulsiona, com isto, o processo de desenvolvimento desigual das nações, que já vinha se verificando anteriormente. 

Os estragos são bem maiores nos Estados Unidos, na Europa e no Japão do que na China e nos Brics. Dentro da Europa, a crise é generalizada, mas a situação da Grécia, elo mais frágil da cadeia imperialista, não é a mesma da Alemanha.

Ascensão da China

A indústria chinesa sofreu com a contração do mercado nos Estados Unidos e na Europa, em 2008. Muitas empresas faliram e milhões de operários foram demitidos. Mas a economia reagiu aos estímulos do Estado e se recuperou rapidamente, de modo que mesmo em 2009, quando o PIB mundial caiu 0,6% (os EUA recuaram 2,6%, a zona do euro 4% e o Japão 6,3%), a China cresceu 9,2%. Em 2010, mesmo com as economias europeia e norte-americana estagnadas, o país avançou 10,3% e ainda deve crescer mais de 9% este ano. 

O crescimento desigual não é de hoje. Ao longo das últimas décadas o PIB chinês progrediu em média cerca de 10% ao ano enquanto os EUA e outras potências ocidentais cresceram entre 2 e 3%. O resultado deste desenvolvimento desigual foi uma revolução silenciosa na geografia econômica mundial, com o deslocamento da produção industrial, e por extensão do poder econômico, do Ocidente para o Oriente e dos EUA para a China. 

Refletindo o avanço da indústria, nas condições de uma “economia de mercado socialista”, o país ocupa o primeiro lugar no ranking mundial das exportações, depois de superar a Alemanha e Estados Unidos. Acumula reservas superiores a 3 trilhões de dólares, as maiores do mundo e se transforma, por consquencia, num relevante investidor externo. É o maior credor dos EUA, onde aplicou parte substancial de suas reservas. 

Para um número crescente de nações da África, Ásia e América Latina as relações comerciais e financeiras com a China já são mais relevantes que o intercâmbio com os EUA e a Europa. 

Convergência das crises

A particularidade mais notável da crise econômica em curso reside em sua convergência com o declínio da importância relativa das grandes potências e dos Estados Unidos em especial, que reflete o esgotamento da ordem econômica e política mundial remanescente dos acordos de Bretton Woods, erigida de acordo com a realidade do capitalismo após a Segunda Guerra, na época em luta com o socialismo soviético.

Ao longo das últimas décadas, em sintonia com a globalização neoliberal e a desregulamentação do sistema financeiro, moldou-se um modelo de desenvolvimento mundial sustentado no excesso de consumo dos EUA e alguns países europeus, que alimentou a reprodução do capital em âmbito internacional e também contribuiu para a prosperidade chinesa. O déficit americano passou a ser financiado pela poupança asiática numa relação que chegou a ser caracterizada equivocadamente como uma perfeita simbiose.

Mas este padrão de reprodução do capital, fundado no crescente endividamento e na hipertrofia do sistema financeiro, entrou em crise e hoje parece insustentável. Os EUA não são mais a locomotiva do globo; as economias emergentes, lideradas pela China, já respondem por mais de 50% do crescimento da economia mundial.

Objetivamente, o mundo está mudando e demanda uma nova ordem internacional, uma nova moeda ou novas moedas e novas instituições. A transformação da geografia econômica de certa forma sugere uma transição neste sentido, mas a verdade, de resto evidente, é que o globo, em crise, ainda é prisioneiro da velha ordem, da liderança capenga e instável do dólar, do arbítrio dos EUA e da Otan e de governos submissos ao capital financeiro. A transição para uma nova ordem não se completará sem luta.

Acirramento da luta de classes

Outro aspecto fundamental é que a recessão e as perturbações no processo de reprodução do capital provocam um notável acirramento da luta de classes entre capital e trabalho, verdade que se revela com força na Europa e nos países mais afetados pela crise. Isto ocorre porque a estagnação da economia tem a sua tradução para a classe trabalhadora no desemprego em massa, na redução de salários e direitos. O número de desempregados no mundo excede 200 milhões, 40 milhões nos países mais desenvolvidos. 

Além disto, a intervenção dos governos para resgatar o sistema financeiro, derramando trilhões de dólares e euros na economia, agravou os problemas, elevando os déficits públicos e detonando a crise da dívida. Frente à nova situação, programas de ajuste fiscal são impostos, especialmente às nações mais frágeis da Europa, com doses de sacrifícios extras para os trabalhadores. O FMI, refratário a reformas, cumpre a missão neocolonial de monitorar a execução dos pacotes antissociais, a exemplo do que fez no Brasil e na América Latina durante os anos 1980. 

A crise, em vez de arrefecer, ganha novo fôlego com as medidas que reduzem o nível de emprego e o poder de compra dos salários, deprimindo o consumo e empurrando as economias para uma espécie de círculo vicioso no qual as políticas econômicas, que deviam contornar a crise, reproduzem mais recessão. Para superar o drama, conforme recomendou a presidente brasileira Dilma Rousseff, seria necessário estimular o consumo e os investimentos produtivos, ao contrário da receita imposta pelo FMI, ditada pelos interesses dos banqueiros.

A burguesia europeia, embriagada de neoliberalismo, aproveita o ambiente de crise para desmantelar o chamado Estado de Bem Estar Social e aumentar o grau de exploração da força de trabalho, de forma a se apropriar de uma parte maior do excedente econômica (trabalho excedente) e enfrentar a concorrência asiática, cuja competitividade é também lastreada em outros padrões salariais. É uma ofensiva capitalista radical, que está acirrando a luta de classes e despertando uma notável revolta na classe trabalhadora.

Protecionismo e guerra comercial

Ao lado da instabilidade monetária e financeira, a contração dos mercados acirrou a concorrência entre as grandes empresas que dominam o comércio internacional, bem como as contradições entre as nações, desembocando no crescimento do protecionismo e em guerras cambiais e comerciais. 

É conveniente lembrar Lênin, que aponta a tendência do imperialismo em crise para o reacionarismo em toda linha. A exacerbação da intolerância, voltada principalmente contra trabalhadores imigrantes, o fortalecimento da extrema direita nos Estados Unidos e na Europa, são sinais preocupantes da manifestação desta tendência política, ao lado da intensificação da agressividade militar do imperialismo e dos conflitos políticos no Oriente Médio.

Os acontecimentos sugerem que não se deve esperar uma saída positiva para a crise do imperialismo, do ponto de vista da civilização humana, nos marcos do capitalismo. 

Os interesses do capital financeiro já não conduzem ao desenvolvimento e entraram em franca contradição com as demandas sociais. Como em outras ocasiões da história, o sistema caminha para a barbárie. Uma solução progressista só virá pelas mãos do povo.

Desafio das forças revolucionárias

A reação dos povos europeus, com protagonismo crescente da classe trabalhadora e de suas organizações, é de revolta, resistência e luta. Eleva-se a dezenas o número de greves gerais realizadas na Grécia e em outros países do continente. Manifestações de protesto pipocam em todo o mundo, inclusive no centro do império americano. 

O desafio das forças progressistas e revolucionárias é pavimentar nas batalhas em defesa dos direitos sociais, dos salários, das aposentadorias e do emprego, o caminho da luta maior contra o imperialismo e o capitalismo, entrelaçando a peleja por uma nova ordem internacional, efetivamente democrática, solidária e multilateral, com o objetivo estratégico e revolucionário de construir uma sociedade socialista. 

O imperialismo, como disse Lênin, é o capitalismo dos nossos dias. Por isto, a luta contra o imperialismo não terá maior consequência se não contemplar o objetivo de liquidar o modo de produção capitalista, que está na raiz do imperialismo, e promover o socialismo.

A par de seus objetivos gerais, a desigualdade das realidades nacionais confere características e particularidades à luta em cada país. A América Latina vive um novo cenário político, com um grande número de países governados por forças políticas progressistas, que buscam uma alternativa ao neoliberalismo. 

São experiências diferenciadas, em que o objetivo mais avançado é o do socialismo bolivariano, proclamado pela Venezuela. Mas há em comum o objetivo de buscar uma maior integração econômica e política das nações latino-americanas e procurar um modelo de desenvolvimento alternativo ao projeto dos EUA, sinalizado na rejeição da Alca e na criação da Unasul, da Celac (Comunidade dos Estados Latinoamericanos e Caribenhos) e da Alba (Aliança Bolivariana para os povos da Nossa América), entre outros fatos. São acontecimentos que confrontam objetivamente a hegemonia dos EUA e apontam na direção de uma nova ordem mundial. 

Cabe registrar que, diferentemente do que ocorre na Europa, os governantes latino-americanos não estão adotando receitas recessivas ditadas pelo FMI para descarregar o ônus da crise sobre a classe trabalhadora. Os indicadores revelam uma relativa valorização do trabalho e redução das desigualdades sociais em grande número de países da região. 

Os comunistas apoiam a integração regional, compreendendo o seu caráter objetivamente antiimperialista, e lutam, no Brasil, para que o processo de mudanças avance no sentido de novos projetos de desenvolvimento, antineoliberais e antiimperialistas, ancorados nos movimentos sociais, nos quais a classe trabalhadora deve ter papel proeminente e que abram caminho para o socialismo. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Post Bottom Ad

Pages