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domingo, 11 de maio de 2014

A perigosa nova Guerra Fria

Por Alejandro Nadal em Sin Permisso

A crise na Ucrânia é o testemunho de que os Estados Unidos nunca abandonou sua mentalidade da Guerra Fria. A tentativa de isolar e "conter" a Rússia é a melhor expressão dessa visão de mundo. A Ucrânia sempre foi o pivô para fechar o círculo. Por isso, procurou obter a adesão da Ucrânia na União Europeia (UE) como passo  preliminar para sua incorporação na Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN). Sempre foi do conhecimento da diplomacia ocidental que para a Rússia isto turo era inaceitável e seria interpretado como uma forma de agressão.

Em meados dos anos noventa, a administração Clinton promoveu a expansão da OTAN, uma aliança militar projetada para conter a União Soviética. A OTAN acabou por incorporar as repúblicas bálticas e vários países da Europa do Leste. Moscou viu reduzido drasticamente seu cinturão de proteção e a fronteira com a OTAN chegou perigosamente perto do centro geográfico da Rússia.

Mas a adesão da Ucrânia na UE se viu dificultada por vários fatores. Assim, quando o governo eleito (e corrupto) de Kiev foi removido por um golpe de Estado em fevereiro, Washington foi rápido em reconhecer e apoiar o novo regime. Por estas razões, Moscou acredita que o governo de Kiev é um fantoche dos EUA e da OTAN. Afinal, também na Rússia habitam sombras fantasmas da Guerra Fria.

A economia da Ucrânia já vem a 20 anos em um processo de desintegração. As privatizações selvagens após o colapso da União Soviética levou a governos dirigidos por saqueadores e bandidos. Em meio à crise global, a Ucrânia tem estado a ponto de colapso econômico por meses e tem chegado perto a uma situação de moratória ou default em termos financeiros. A moeda ucraniana, a hryvnia, sofreu uma desvalorização de mais de 40 por cento em relação ao dólar dos EUA este ano. Portanto, a agência de classificação Fitch rebaixou a posição dos títulos do governo ucraniano e reduziu-os à categoria de "lixo". Mesmo a ajuda oferecida pelo Fundo Monetário Internacional, o que confirma um pacote de 17 bilhões de dólares serão insuficientes para tirar o gancho para a economia ucraniana.

Em 22 de fevereiro foi deposto o presidente Yanukovich, conhecido por sua mediocridade e corrupção. Em se lugar, surgiu outro chefe de um grupo de políticos corruptos e muito rápido foi retratada como uma possível candidata à presidência a Sra. Timoshenko, uma personagem com uma história de corrupção que rivaliza com a da maioria dos ladrões políticos. Washington e seus aliados europeus foram rápidos para apoiar e reconhecer o novo regime, mas o povo ucraniano só ver uma transição de um grupo para outro de cleptomaníacos. A Rússia sentiu que tinha sido cruzada a última linha de defesa.

Hoje, o risco de uma guerra civil no estilo da ex-Jugoslávia é alta. Na atual conjuntura parece que ninguém tem a força para impor suas posições: nem o governo ilegítimo em Kiev pode assegurar o controle no leste da Ucrânia, nem os grupos pró-russos têm o suficiente para continuar com força a secessão pura e simples. O eixo Washington-Londres e seus amigos na OTAN não têm a capacidade para conseguir o que sempre quis, forçar a retirada da Rússia do Mar Negro através da integração da Ucrânia na OTAN. E Moscou, ainda com mais flexibilidade e forças no terreno, tampouco pode garantir uma transição pacífica para uma melhor integração do leste da Ucrânia com a Rússia. Neste complexo contexto uma guerra civil pode facilmente explodir. Daí às hostilidades formais entre as forças armadas é apenas um passo.

Washington tenta salvar a face com um esquema de sanções econômicas sobre a Rússia (e diretamente sobre personagens próximos a Putin). Estas sanções não vão mudar o curso dos acontecimentos, mas pode afetar negativamente a maltratada economia europeia e japonesa.

Alemanha e Japão estão sob fogo cruzado. Nas últimas décadas têm vindo a reforçar os seus laços económicos com a Rússia, mas agora a América pressiona-os a adotar o esquema de sanções econômicas. As grandes corporações alemãs com a BASF, Siemens, BMW e Deutsche Bank na cabeça, têm vindo a construir uma plataforma para a produção e o comércio com a Rússia e não estão dispostos a ver que evaporam os esforços devido à crise na Ucrânia. Por sua vez, o Japão já tem uma forte dependência de recursos naturais russos, mas tem manter um  delicado número de equilíbrio na corda bamba para não alienar-se de Washington.

Apesar dos riscos que as sanções representam para a economia global  Washington segue com sua teimosa estratégia de contenção no estilo da Guerra Fria contra a Rússia. A eclosão da guerra civil na Ucrânia poderia forçar a intervenção russa e esse cenário é bem visto por Washington, pois permite-lhe justificar seus gastos com armas e sua retórica imperial.

Alejandro Nadal é membro do Conselho Editorial da SINPERMISO

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