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segunda-feira, 18 de julho de 2016

Voto de arquibancada

Luiz Rodrigues

A adrenalina, também conhecida como epinefrina, é um hormônio secretado por uma molécula das glândulas supra-renais.

A adrenalina é muito importante para a manutenção da vida. Em condições normais, sua presença no sangue é muito pequena. Porém, nos momentos de excitação (medo, euforia) ou estresse emocional, uma grande quantidade de adrenalina é secretada para atuar sobre determinadas partes do corpo (nervos, músculos, pernas, braços), com o objetivo de prepará-lo para um esforço físico (correr, pular e movimentos que exigem reflexos de forma rápida).¹


O discurso eleitoral apela inexoravelmente para a adrenalina, no sentido, conforme se deduz da definição acima, para uma tomada de decisão, por parte do eleitor, eufórica, onde não se exige longa reflexão. Discursar para causar euforia no público eleitoral é praxe comum aos políticos, eles sabem o que o público quer ouvir; o filósofo reacionário Joseph de Maistre desdenhava das eleições dizendo que nelas triunfavam os políticos que dizem o que o povo quer ouvir e não os que dizem o que ele (povo) precisa ouvir.

As repúblicas europeias com o engrandecimento econômico, aumento da renda e universalização dos chamados direitos sociais conseguiram formar o chamado mundo desenvolvido, principalmente no pós-Segunda Guerra; embora hoje estejam às voltas com o populismo. 

Nas Repúblicas sulamericanas o voto chamado democrático sofrera distorções gravosas; populismos demagógicos, manipulações, fraudes. O Brasil tem uma literatura sociológica remetendo à má qualidade do nosso voto; o próprio imperador D. Pedro II dizia que eleições no Brasil é sempre um problema, no seu reinado sempre venciam o partido que estivesse no poder, exigindo do monarca uso do seu poder pessoal. Eleições a bico de pena, currais eleitorais, votos de defuntos, são marcas de nossas eleições. Diz José Murilo de Carvalho em seu livro Cidadania no Brasil: o longo caminho que havia no império a situação de o eleitor ir votar e na sessão eleitoral ter que provar que era ele mesmo, outro tentava votar no seu lugar.

O discurso do político caricato brasileiro não tem nenhum sentido mas explora o que entusiasma as massas desamparadas do ensino; Odorico em O Bem Amado explorava a necessidade do cemitério na cidade:

Quem ama sua terra deseja nela descansar. Aqui, nesta cidade infeliz,
ninguém pode realizar esse sonho, ninguém pode dormir o sono eterno no
seio da terra em que nasceu. Isto está direito, minha gente?
(O Bem Amado)

Mais adiante no romance Odorico se volta para os desvalidos tentando ser o defensor deste grupo de pessoas, sempre de forma a pegar pelos sentimentos, o que é ruim por dois lados: o político que necessita do status quo e o cidadão viciado em adulações:


ODORICO
(Já passando a um tom de discurso:) Vejam este pobre homem: viveu
quase oitenta anos neste lugar. Aqui nasceu, trabalhou, teve filhos, aqui terminou
seus dias. Nunca se afastou daqui. Agora, em estado de defuntice
compulsória, é obrigado a emigrar; pegam seu corpo e vão sepultar em terra
estranha, no meio de gente estranha. Poderá ele dormir tranquilamente o
sono eterno? Poderá sua alma alcançar a paz?


O judiciário e, claro, todo o esforço dos intelectuais desde o Século XIX, vão tentar corrigir as distorções pela lei e pela amplitude da informação; Getúlio cria a justiça eleitoral com o Tribunal Superior Eleitoral, peculiaridade nossa mas atendendo a uma necessidade; mas ao longo de décadas o judiciário vai saindo dos laços das trocas de favores e entra em cena o Ministério Público independente, rendendo agora a Operação Lava Jato, conduzida por jovens procuradores, o que não é à toa.

Afora tudo isso, melhores eleições depende de melhores cidadãos, os candidatos dificilmente fugirão de mecanismos de convencimento a partir do uso trabalhado de marketing; a adrenalina é a arma número um dos que disputam votos. No Brasil essa adrenalina ainda é explorada via espetáculos bizarros: músicas de campanha ridículos, autoelogios grosseiros, queimas de fogos, trios-elétricos com "animadores de torcida"; enfim...







¹Disponível em: http://www.todabiologia.com/dicionario/adrenalina.htm

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