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sexta-feira, 9 de novembro de 2012

Argentinos promovem panelaço contra governo de Kirchner


Apelidado de 8N, o evento foi motivado por um amplo leque de queixas contra a gestão; em tese, ato não contou com apoio partidário


Luciana Taddeo do Opera Mundi



Após meses de organização, muita expectativa, debates televisivos e polêmica nas redes sociais, cerca de um milhão de pessoas participaram de um panelaço contra o governo argentino, na noite desta quinta-feira (08/11), em várias cidades do país. Segundo a prefeitura portenha – liderada pelo oposicionista Mauricio Macri -, o evento reuniu cerca 700 mil pessoas somente na capital.

Apelidado de 8N, devido à data de realização, o evento foi motivado por um amplo leque de queixas contra a gestão de Cristina Kirchner. No fim da tarde, os presentes se concentraram em diversos pontos da cidade e marcharam em colunas em direção ao Obelisco, monumento localizado na Avenida 9 de Julio, onde viraram uma multidão. Posteriormente, o protestos se deslocou para a Praça de Maio.

Uma grande bandeira com a palavra “paz” se destacava entre os milhares de manifestantes. Um longo cartaz vertical estampava um acróstico com o nome da presidente argentina, no qual cada letra representava uma insatisfação com o governo. Alguns diziam viver sob ditadura. Outros pediam o fim da “divisão” do país, em alusão à polarização política. Panfletos distribuídos durante o protesto mostravam uma “Cruella de Vil”, personagem maldosa da história dos 101 Dálmatas, com a cara de Cristina Kirchner.

Não se viam bandeiras partidárias e poucos políticos foram vistos, apesar das tentativas de alguns dirigentes, durante a última semana, de capitalizar a repercussão do protesto que estava por vir. Um deles foi o prefeito de Buenos Aires, que no dia anterior, convocou: “Vamos ao #8N com uma só bandeira, a da Argentina”. Seu partido, o PRO (Proposta Republicana), também distribuiu panfletos – sem identificação - em várias esquinas portenhas. 

Durante o panelaço, Macri disse ao canal de notícias TN, do Grupo Clarín, que sentia “orgulho” e “emoção” pelo que viu. “Há uma energia que quer ser conduzida, gente que merece um futuro melhor”, garantiu. Na última semana, organizações ligadas ao macrismo foram acusadas por dirigentes kirchneristas de financiamento do protesto no marco de um projeto destituinte da ultra-direita e dos grandes meios de comunicação.

Alguns cartazes zombavam das especulações. Uma criança carregada pelo pai levava um cartaz no qual exibia: “Minha avó é golpista, assiste TN”, em relação ao canal de notícias do grupo Clarín. Uma mulher estendia com as duas mãos uma cartolina na qual atestava: “Sou golpista, golpeio panelas”. Outro dos que se destacavam na multidão, expressava: “Nem esquerda, nem direita, somos argentinos”.

Embora algumas declarações transmitissem rejeição a rumos progressistas do governo – “Não queremos ser a Venezuela”, “Eu trabalho para sustentar vagabundos” – outros pediam a expulsão da Monsanto, evidenciando que o panelaço também não teve adesão somente de um setor furioso com o incremento dos controles à compra de dólares, disparador dos primeiros panelaços durante o segundo mandato de Cristina Kirchner. 

“Queremos um socialismo de verdade e não populismo, para que possamos ter um país com melhores políticas sociais, igualdade e inclusão em longo prazo”, afirmou ao Opera Mundi Alfonso Curet, um economista portenho de 30 anos que usava uma máscara do “V de Vingança”, popularizada em movimentos dos “Indignados”, “Occupy Wall Street”, além do coletivo “Anonymous”.

Nas pausas entre poses para fotos, Curet explicou que não é anti-kirchnerista, mas que participou de todos os panelaços anteriores. “Não é somente um protesto contra o governo atual. Muita gente que votou nela protesta porque sente que a situação econômica não é a mesma. Não é meu caso, tenho uma boa situação econômica, mas quero um modelo econômico de geração de emprego e inclusão verdadeira”, garantiu.

A reflexão do economista destoa da motivação que levava Beatriz Chiramberro a amassar sua panela. Aos 50 anos, essa instrutora de pilates é adepta da famosa consigna “qué se vayan todos” (“que todos vão embora”), tão entoada em 2001, levando à renúncia do então presidente Fernando de la Rúa. Para ela, “muita gente errou” ao reeleger Cristina há um ano, pois “acreditaram no discurso dela ou votaram por pena, porque ela ficou viúva”.

“Queremos que todos saiam do poder. Para mim isso tudo vai terminar em uma revolta civil, porque o governo é muito soberbo, não é como De La Rúa que foi tirado rápido”, opinou. Quando questionada sobre um opositor que pudesse ser um bom governante Chiramberro afirma que “não há”, ao que conclui: “Vai ter que ter um governo de transição até que surja um novo líder, porque assim não podemos continuar, basta”.

Apesar da convicção da instrutora, os pedidos de que Cristina renunciasse à liderança do Poder Executivo do país - cargo para o qual foi reeleita com 54% dos votos em primeiro turno – desta vez foram menos frequentes que nos panelaços anteriores, quando os manifestantes atribuíam, em uníssono, o ofício de meretriz à mãe da presidente. Para a dona de casa Beatriz Cabral, que prefere omitir sua idade, a proposta do protesto é que o governo escute as reivindicações.

Acompanhada de muitos membros da família, inclusive com a neta, Cabral diz que se dirigiu à Praça de Maio devido ao aumento da insegurança na capital argentina. “Cristina, suplicamos: sem mais mortes”, escreveu em um cartaz, que exibia para os fotógrafos. “Às vezes as pessoas pensam somente em si mesmas, mas sinto dor por todas as mortes injustas, por todos os pais que perderam seus filhos. Todos os dias há jovens mortos. Tenho muito temor e é isso o que me traz aqui”, explicou.

“Estamos cansados de suportar autoritarismo e que nos estejam dominando sempre. Perón foi um ditador e a reeleição indefinida nunca é boa para os povos”, afirmou a bibliotecária bonaerense Marga Bertolin, de 61 anos, em relação à suposta pretensão do Executivo de reformar a Constituição do país para permitir que Cristina Kirchner possa ser reeleita para um terceiro mandato presidencial. Apesar de o governo não ter anunciado nenhuma projeto de reforma com este fim, a possibilidade, chamada de “re-re” (re-re-eleição) – alardeada pela imprensa, rejeitada pela oposição e apoiada por membros do kirchnerismo – foi uma das principais reclamações dos manifestantes.

Entre as demais queixas manifestadas pela multidão, também estavam a inflação, as restrições a importações que provocam falta de insumos no mercado interno, a remota descriminalização das drogas e a improvável legalização do aborto no país, a suposta falta de liberdade de imprensa e de expressão, críticas à aprovação do casamento entre homossexuais, escândalos de corrupção nos altos extratos do governo e enriquecimento ilícito de governantes, e, claro, a restrição à compra de dólares.

Apoiadores de Cristina Kirchner responderam, nas últimas semanas, à massiva convocatória ao panelaço, criando um grupo chamado “8N, Yo no Voy”, no Facebook. A página conta com cerca de 47 mil membros, que mandaram fotos e justificaram sua ausência no evento. Entre os milhares de argumentos, estavam: “Por que somos democráticos e agradecidos”, “Como pais, apoiamos este projeto, com mais igualdade e participação para todos”, “Acho que esta política transforma a realidade e consegue inclusão” e “Defendemos o voto do povo

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