Maurício Costa Romão
A deterioração das contas públicas governamentais encetou um mecanismo circular da dívida que precisa ser interrompido sob pena de o país não conseguir pôr fim à recessão.
A
causação circular começa com o déficit nominal crescente, que aumenta a relação
dívida/PIB, indicador básico de solvência fiscal de uma economia.
A
trajetória ascendente do déficit pressiona o aumento do dólar. As importações
ficam mais caras e a inflação aumenta. Os juros sobem para conter a inflação,
mas isso faz crescer o serviço da dívida. Com as receitas estagnadas ou caindo,
o déficit nominal aumenta mais ainda e o círculo vicioso continua...
O
mecanismo é, às vezes, descontinuado por fatores ocasionais, mas as causas não
resolvidas que deram ensejo à grave situação da economia, contudo, operam no
sentido de reinstalar o processo circular.
O receituário convencional para
desmontar essa armadilha dá-se mediante ajustes e reformas que corrijam o
desequilíbrio fiscal, criando condições para a retomada de crescimento
sustentável.
Avesso a essa agenda, o PT passou a defender
recentemente o uso das reservas internacionais do país para investimento interno
(vide documento “O futuro está na
retomada das mudanças”).
Considerando o estoque recente, as reservas
somariam US$ 360,0 bilhões, cerca de 20% do PIB. Alguns analistas argumentam
que esse nível de reservas é mais do que suficiente para proteger o país de
movimentações bruscas no fluxo de capitais e que um estoque adequado gravitaria
no entorno de 10% a 15% do PIB.
Não
há consenso entre especialistas sobre o nível ótimo de reservas dos países. Admita-se,
contudo, que se faça uso departe delas,deixando o estoque em cerca de 15% do
PIB.
O
governo utilizaria, então, US$ 90,0 bilhões das reservas, o que requereria
transformá-los em R$ 360,0 bilhões para investimento interno (supondo uma taxa
de câmbio de R$ 4,0 / US$ 1,0).
Um
parêntesis: essa operação esbarra em impedimentos legais. Quem tem os dólares é
o Banco Central (BC) e quem vai gastar os reais em investimentos é o
Tesouro. Esses reais não estavam previstos no orçamento. Jogá-los na economia equivale
a gerar um crédito suplementar de R$ 360,0 bilhões sem passar pelo Congresso
Nacional. Ou seja, uma pedalada semelhante a que foi realizada pelo governo no
passado recente.
Mas,
injetados os R$ 360,0 bilhões na economia o BC entra em ação, enxugando o
aumento de liquidez no sistema mediante a venda de títulos da dívida pública,
remunerados pela Selic a 14,25% ao ano. Esta operação, é óbvio, aumenta a
dívida pública.
Outro
parêntesis. Há um custo elevado de manutenção das reservas, já que estas rendem
menos de 1% ao ano lá fora e o BC paga 14,25% ao ano para esterilizar os reais
internamente. O “seguro” pelo conforto de liquidez custa caro, de fato.
Como
fica a posição patrimonial do país após o uso de parte das reservas? O estoque
total diminui e a dívida pública resta acrescida. Quer dizer: o país reduziu as reservas, que é o seu ativo, e aumentou a dívida pública, que é
seu passivo!
E
os gastos de investimento? Bem, certamente terão importância positiva na
economia, se dispendidos propriamente, mas ao preço de reduzir o colchão
protetor do país, as reservas, e de turbinar a dívida pública,
impulsionando o movimento circular descrito acima.
A rationale
econômica diz que a retomada do investimento se dá com reequilíbrio de contas
públicas, que depende, urbi et orbi,
de ajuste fiscal e reformas estruturais. Fora daí, é exercício de autoengano.
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Maurício Costa Romão, é Ph.D. em
economia pela Universidade de Illinois, nos Estados Unidos.
O crescimento da economia através dos investimentos diminui a relação da dívida/PIB. Com isso, o círculo vicioso de recessão que gera aumento da relação dívida/PIB que teria como "remédio" mais recessão é rompido. Foi o que fez o Brasil crescer na Era Lula.
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