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terça-feira, 4 de dezembro de 2018

Dois mil anos de história econômica em um gráfico

Artigo de José Eustáquio Diniz Alves

Nada no universo perdura para sempre, tudo se transforma continuamente
e todos os fatos são impermanentes”
Buda (563-483 a.C.)

dois mil anos de história econômica em um gráfico

[EcoDebate] Muita coisa aconteceu no mundo nos últimos 2000 mil anos e parece até impossível resumir as principais tendências econômicas de uma forma simples e transparente. Contudo, o gráfico acima resume a história econômica dos dois últimos milênios (Desjardins, 2017), servindo como uma visualização das principais alterações acontecidas no período.
O gráfico mostra a participação das “dez principais” economias do mundo, com o PIB medido em poder de paridade de compra (PPP), do ano 1 ao ano de 2017, com base em cálculos de Angus Maddison e atualizados por Desjardins (2017). Nota-se que, no primeiro milênio da era Cristã, a China e a Índia (a Índia incluía os territórios dos atuais Paquistão e Bangladesh) representavam cerca de 70% do PIB global. Os antigos impérios grego, turco, egípcio e persa (Irã) representavam cerca de 10% do PIB global. O antigo império Romano (Itália) chegou a representar 10% do PIB global. E os grandes países da Europa mais a Rússia chegaram também perto de 10% (as Américas e a Oceania praticamente não contavam nesta época).
Entre o ano 1000 e o ano 1500 a Chíndia (China mais Índia) perdeu um pouco de espaço, mas continuou hegemônica; os antigos impérios grego, turco, egípcio e persa reduziram mais ainda a participação no PIB global e houve um crescimento dos países europeus, especialmente a França. Estas tendências continuaram até cerca de 1800.
No século XIX, houve um grande redução da Índia (que passou a ser dominada pelo Reino Unido) e também da China (que sofreu com a “guerra do ópio” e o ataque ocidental). Os países europeus avançaram, mas o grande destaque foi a subida dos Estados Unidos.
Na primeira metade do século XX, os Estados Unidos se consolidaram como a grande potência global e atingiram quase 40% do PIB mundial. O outro destaque foi a Rússia (URSS) que passou a polarizar o mundo, dando início à “Guerra Fria” e ao conflito Leste versus Oeste.
O quadro voltou a mudar muito na segunda metade do século XX. Os EUA continuaram a potência dominante mas iniciaram um período de declínio relativo na participação do PIB global. Entre 1950 e 1990 o destaque foi o crescimento do Japão que se tornou a segunda potência mundial depois do fim da URSS.
Nos anos 2000, o grande destaque tem sido o ressurgimento da China e também da Índia. Os EUA e os países da Europa iniciaram um período de declínio relativo e o resto do mundo passou a ter peso crescente.
O gráfico abaixo, com dados de 2017, mostra que a China assumiu a vanguarda do PIB mundial, representando 18,3% da economia global. Os EUA vêm em segundo lugar com 15,3% do PIB global. A Índia vem em terceiro com 7,5% do PIB global. Em seguida aparecem Japão (com 4,3%), Alemanha (3,3%), Rússia (3,1%), Reino Unido (2,3%), França (2,2%), Itália (1,8%) e Espanha (1,4%). No conjunto, todos estes países representam quase 60% do PIB global. A novidade do século XXI é o crescimento do resto do mundo (incluindo o chamado “Terceiro Mundo”) que já estava com 40,4% do PIB global em 2017.

participação dos países no PIB mundial

Em 2011, escrevi um artigo no site Aparte do IE/UFRJ, perguntando: “Por tudo isto, será que a ocidentalização da economia mundial pode ser pensada como um fenômeno restrito aos séculos XIX e XX? A China e a Índia vão voltar a ser as duas grandes economias da comunidade internacional? O mundo está em um processo de desocidentalização? O Oriente do Norte vai ser a nova base de uma Orientalização do globo? O Consenso de Beijing vai vencer o Consenso de Washington? Será que a chamada excepcionalidade americana é um fenômeno que vai ficar restrito ao século XX?”
De lá para cá, o processo de Orientalização do mundo só se consolidou, especialmente depois que a China lançou o projeto “One Belt, one Road” (OBOR) que visa a interligação da Eurásia, por terra e por mar. Os países do Leste estão consolidando uma aliança estratégica entre China, Índia e Rússia (RIC, ou triângulo estratégico) que vai abarcar partes da Europa e da África.
Com o isolacionismo e o bairrismo implantados por Donald Trump nos Estados Unidos e o caos provocado pelo Partido Conservador no Reino Unido, que gerou o Brexit, as duas potências de língua inglesa que dominaram o mundo nos séculos XIX (século inglês) e XX (século americano) devem contribuir para a perda da hegemonia ocidental.
A grande questão é que os últimos 2000 anos foram marcados também por muitas guerras, o que está correlacionado com as mudanças de hegemonia entre as potências econômicas em transição. Um conflito entre a potência emergente e a potência descendente não é improvável.
O escritor Graham T. Allison aponta para a possibilidade de uma guerra entre os EUA e a China. A razão é a “Armadilha de Tucídides”, que se refere a um padrão que se repete quando há transição de poder econômico entre as partes preponderantes. Nos últimos séculos, essas condições de mudanças de hegemonia ocorreram dezesseis vezes, sendo que, em doze delas, estourou uma guerra. Para o autor, as condições estão dadas para gerar um conflito bélico entre os EUA e a China.
O ano de 2018 tem sido marcado por diversos conflitos e por uma total falta de consenso na governança global. A guerra comercial entre os EUA e a China tende a se agravar e se extrapolar para outras áreas. O fracasso das reuniões em comemoração dos cem anos do fim da Primeira Guerra Mundial (11/11/2018) e da Cúpula da APEC (17 e 18 de novembro de 2018) são indícios que o mundo passa por um momento de redefinição, conflitos e indefinição.
A Cúpula do G20 ocorrida nos dias 30 de novembro e 01 de dezembro de 2018 mostra que este importante fórum que ajudou na saída da recessão de 2008/2009 está sendo esvaziado e que a governança global (a ordem liberal implantada depois da histórica reunião de Breton Woods, em 1944) está cada vez mais ameaçada. O comunicado final divulgado pelo presidente Maurício Macri, não condenou o protecionismo comercial e nem incluiu a palavra multilateralismo. Os principais problemas foram empurrados para a Organização Mundial de Comércio e para as negociações bilaterais (como no caso da disputa EUA versus China).
O G20 não está se mostrando à altura dos desafios globais e terá dificuldade para lidar com a desaceleração da economia mundial e com o agravamento das questões sociais. Uma crise econômica internacional pode provocar muito sofrimento e os seus desdobramentos podem não ser muito agradáveis para a maioria da população mundial.

José Eustáquio Diniz Alves, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em demografia e professor titular do mestrado e doutorado em População, Território e Estatísticas Públicas da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE; Apresenta seus pontos de vista em caráter pessoal. E-mail: jed_alves@yahoo.com.br

Referência:
JEFF DESJARDINS. 2,000 Years of Economic History in One Chart, September 8, 2017


in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 03/12/2018

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