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quarta-feira, 13 de novembro de 2019

Vácuo de poder traz risco de guerra civil à Bolívia

Bolívia tenta sair do vácuo de poder e evitar cenário de guerra civil

A Bolívia oscila entre a incerteza e a violência. A incerteza é resultado da desintegração do poder político após a renúncia de Evo Morales. A violência entre grupos armados que saqueiam e incendeiam casas e comércios, pode também levar a enfrentamentos generalizados de facções a favor e contra o agora ex-presidente indígena.


Márcio Resende, correspondente da RFI na América Latina

Para evitar o risco de uma guerra civil, a Bolívia tenta a partir desta terça-feira (12) sair do maior problema que a renúncia deixou: um país sem governo e um perigoso vácuo de poder. Evo Morales deixou a Bolívia na segunda-feira (11) e seguiu para o México, onde recebeu asilo político.

Submersa numa acefalia política, a Bolívia tenta a partir de hoje reconstruir um mínimo de estrutura política, depois da renúncia de Evo Morales e de toda a linha sucessória na Câmara de Deputados e no Senado.
A segunda vice-presidente do Senado, Jeanine Añez, convocou para esta terça-feira (12) os legisladores a uma sessão com o objetivo de aprovar a carta de renúncia de Evo Morales, formar um governo interino e marcar novas eleições. Para isso, será preciso também nomear novos juízes para o Tribunal Supremo Eleitoral que conduzirá o processo.
A questão é que para tudo isso serão necessários os votos do Movimento ao Socialismo (MAS), o partido de Evo Morales que controla 2/3 do Congresso. Quanto poder Evo Morales exerce ainda sobre essa maioria de legisladores?
"Entre os parlamentares que apoiavam Evo Morales, há quem quer cooperar para uma transição ordenada e quem não quer ceder porque quer a volta de Evo Morales", explicou à RFI o analista político Iván Arias.
"A expectativa é conseguir hoje um encaminhamento da situação. Precisam ter muito cuidado para não cometerem nenhum erro e evitar, assim, que digam que houve um golpe de Estado", observa Arias.
Todo o processo eleitoral precisa ser rápido porque o mandato dos atuais parlamentares termina em 22 de janeiro. "Se tudo correr bem, em 15 dias, poderia haver um acordo para constituir um Tribunal Eleitoral que convoque eleições, que poderiam ocorrer no dia 21 de dezembro. Se houvesse segundo turno, seria dia 5 ou 10 de janeiro. Esses prazos são possíveis, mas o jogo está no limite", conta Arias.
Esse vácuo de poder é o elemento mais perigoso deste processo. A ausência de governo pode aumentar a tensão social nas ruas entre grupos violentos que se enfrentam. "O mais importante é nomear hoje a presidência provisória. Estamos num vácuo de poder. A sociedade está evitando que o país ecloda, mas há forças alimentadas por partidários de Evo Morales que querem o contrário. As cidades estão em situação de prontidão porque esses grupos ameaçam atacar", descreve Iván Arias.
Golpe de Estado ou desgaste de credibilidade?
Na Bolívia, uma maioria de analistas não vê golpe de Estado. Eles veem a renúncia como consequência de maciças manifestações populares de uma sociedade que se cansou das violações à Constituição, do abuso de poder e da falta de liberdade. Os que veem Golpe, dentro da Bolívia, são os militantes de Evo Morales.
Fora da Bolívia, depende de que lado se está na política. Os governos que estão à esquerda denunciam golpe; os que estão à direita, analisam a renúncia como uma reação da sociedade contra Evo Morales que forçou um quarto mandato, seja de forma inconstitucional ou pela fraude. "Aqui não houve golpe. Vivíamos uma pseudo-democracia porque Evo controlava tudo. Eu vejo um povo cansado que expressou o seu descontentamento, democraticamente, contra um partido que decidiu não sair mais do poder", afirma Iván Arias.
Evo Morales não aceitou o resultado de um plebiscito, que ele mesmo convocou, em fevereiro de 2016. A população disse 'não' a um quarto mandato. Apesar de derrotado, o presidente recorreu ao Tribunal Superior Eleitoral. Em 2017, o Tribunal acatou o pedido, citando o artigo da Declaração Universal dos Direitos Humanos no qual toda pessoa "tem o direito de participar num governo do seu país". A partir dessa decisão, Morales conviveu com manifestações constantes que explodiram quando, em 20 de outubro passado, as evidências de fraude dominaram o resultado das eleições.
Quando o presidente já tinha perdido o controle das manifestações, a credibilidade entre os subordinados e a chance de anular as eleições de forma pacífica, o comandante do Exército e o comandante da Polícia "sugeriram" a sua renúncia. Esse pedido é o argumento que usam os que defendem a tese de um Golpe. Já os que afirmam não ter havido golpe olham para todo o processo que começou há quase quatro anos com o plebiscito.
"Foi a mobilização cidadã; não um golpe de Estado", garante o analista Carlos Toranzo à RFI. "Para aprovar a Constituição de 2009, Morales prometeu não participar das eleições seguintes. Mentiu. No referendo de 2016, disse que, se perdesse por um voto, respeitaria a decisão do povo. Mentiu. Desde as eleições de outubro passado, diante de tamanha fraude, milhões de jovens se manifestaram de forma pacífica", aponta Toranzo.
Guerra civil
A maior preocupação com um vácuo de poder é o risco de uma guerra civil, que os analistas alertam existir. "Temos o país em convulsão. As cidades estão cercadas. Grupos armados partidários de Morales estão assaltando e incendiando casas. É uma situação de horror e de caos", relata Arias.
O risco é de uma guerra de guerrilhas que supere a capacidade de ação da Polícia e das Forças Armadas. "Se não houver ordem e se não elegermos um presidente logo, tudo pode acontecer e podemos chegar a uma guerra civil", alerta Arias.
Camponeses contra cidadãos urbanos. Índios contra brancos. Povo contra povo. Existe um processo de insurreição popular. Facções a favor e contra Evo Morales. E os dois lados estão armados.

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