O Brasil enfrenta duas grandes tragédias, tão grandes quanto o é o país. Uma, a do novo coronavírus que se espalha e cresce pelo país, deixando um rasto de destruição de vidas e de crescimento da pobreza. Outra, a de ter eleito um energúmeno que teima em transformar o país numa republiqueta de bananas, à imagem dos projetos da antiga e já defunta bananeira norte-americana “United Fruit”.
por Alfredo Prado
Os últimos dias têm sido de drama e tragédia para milhares e milhares de brasileiros atingidos pela pandemia da covid-19. Uma tragédia anunciada. O sistema de saúde pública, o SUS, está sucateado desde há muitos anos, por opção de quem sempre governou o país. A saúde pública para os pobres, os planos privados de saúde para os remediados e os hospitais privados de excelência para os muito ricos e poderosos. À falta de equipamentos, desde os de proteção do pessoal hospitalar aos ventiladores para os doentes em estado mais grave, junta-se a desorganização e a ganância do sistema capitalista. O desastre está à vista de todos e a realidade é muito mais grave que os números divulgados pelo governo federal. A subnotificação é generalizada, de norte a sul do país.
O pouco que tem sido feito para tentar combater a covid-19 com alguma eficácia deve-se à sensibilidade de alguns governadores estaduais e, naturalmente, ao esforço e coragem dos trabalhadores dos hospitais, dos médicos e enfermeiros ao pessoal das limpezas.
Com mais de 4 mil mortes, de acordo com as estatísticas oficiais, não se vislumbra por parte do governo federal qualquer medida que não seja a de tentar iludir a população com “mezinhas” milagrosas. Na verdade, o que há a esperar de um governo cujo presidente trata a doença com a displicência da ignorância e com a arrogância tão comum a alguns psicopatas? Um “Napoleão de hospício” na definição de uma amiga.
O futuro do Brasil, digo o futuro de amanhã – não aquele futuro de igualdade, de justiça social, de emprego, de saúde universal e de educação igual para todos, que desejo, esse mais demorado, mais difícil de construir -, está nas mãos dos brasileiros.
A democracia não se pode esgotar nos corredores palacianos. Constitucionalmente, o poder emana do povo. Cumpram-se, então, os procedimentos democráticos, em todos os poderes. Nas esferas da justiça, do legislativo, e do povo. Nas ruas.
O país assistiu nos últimos dias, entre assombração e indignação, em meio a plena crise causada pela pandemia, às diatribes políticas de um presidente que se comporta como a “rainha louca”, e à revolta de um seu coadjuvante que embarcou, de livre vontade, num projeto de poder que fomenta o caos. Nenhuma das promessas propaladas por Bolsonaro durante a campanha eleitoral tem qualquer possibilidade de se tornar realidade.
Os números da economia – ainda antes da chegada da pandemia – já evidenciavam uma estagnação da qual o governo dificilmente se conseguiria libertar, mesmo sem o coronavírus. Hoje, o desastre está instalado. No plano político, Bolsonaro não consegue entender-se com ninguém, nem com os seus tradicionais aliados de direita. Usando as redes sociais, acolitado pelos filhos elevados a cargos políticos graças às fragilidades democráticas do sistema político, o antigo capitão do Exército, poupado à última hora de ignominiosa expulsão das fileiras castrenses, por mau comportamento, ataca tudo e todos. Câmara dos Deputados, Senado e Supremo Tribunal Federal não são poupados.
Em plena crise sanitária, com os hospitais em ruptura, o presidente dá-se ao luxo de demitir o seu ministro da Saúde, que teimou em acompanhar as recomendações de isolamento social da Organização Mundial da Saúde. Em meio ao drama de milhões de famílias atingidas pela doença, e poucos dias depois da saída de Henrique Mandetta da Esplanada dos Ministérios, o presidente demite o diretor-geral da Polícia Federal e empurra o ministro da Justiça, Sérgio Moro, para a demissão. O papel de “salvador da pátria”, com que conquistou milhões de eleitores e a Presidência do país – surfando na onda dos graves erros cometidos por Lula e outros dirigentes petistas, a maioria deles à margem dos seus próprios militantes e simpatizantes – parece estar esgotado.
Neste cenário, os generais direitistas que embarcaram na aventura fascizante de Bolsonaro – acredito que o presidente não saiba exatamente o que foi o fascismo, embora seja um confesso admirador da ditadura militar que comandou o país durante duas décadas – deitam as mãos à cabeça sem saber bem o que fazer. Aconselhar o presidente a renunciar, como já sugeriu publicamente o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, ou manterem um presidente “zumbi” enquanto decorrer um processo de impeachment, que se adivinha muito provável?
Os crimes de “responsabilidade” cometidos por Bolsonaro já são mais que muitos. As forças democráticas dão sinais de estar a sair da letargia a que se dedicaram, durante ano e meio, desde a posse de Bolsonaro. As recentes declarações de conhecidos dirigentes políticos e de figuras públicas deixam antever o crescimento de um amplo movimento nacional, abrangendo todos os segmentos sociais, para afastar, constitucionalmente, Bolsonaro, e o seu grupo, do poder. O Brasil sofre as agruras de uma escolha equivocada. Mais uma vez, o futuro continua adiado.



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