Entre 2012 e 2018 o nordeste viveu o mais longo período de estiagem registrado, foi um teste de resistência, mas a história foi feita: pela primeira vez desde o século XVI, quando o padre Fernão Cardim descreveu os primeiros registros dos problemas oriundos da estiagem que causariam o padrão de miséria que se seguiria nos séculos, fome, saques e retirantes, não tivemos nenhuma morte humana neste período. Vivemos a história e nem ligamos, nenhum jornal reportou e a televisão somente registrou a morte do gado.
O maior expoente do nordeste semiárido é o sanfoneiro Luiz Gonzaga, o Rei do Baião, cantor da Asa Branca, maior manifesto em defesa da região na história, o hino do Nordeste, a força da letra e da melodia que irradiaram para os quatro cantos da nação que havia um pedaço esquecido do Brasil. Quando Luiz gravou Vozes da Seca, outro clássico gonzagueano em denúncia aos problemas oriundos da da impropriedade dos modos de produção, um deputado subiu à tribuna da Câmara dos Deputados no Rio de Janeiro e disse que ali estava o discurso mais importante em denúncia dos problemas das secas no Nordeste.
O Brasil nunca quis saber do Nordeste, país imenso, de terras férteis e águas abundantes, pra que se preocupar com uma área tão seca e pouco propícia à agricultura? Ademais o Brasil sempre relegou às populações do interior às margens do próprio Estado, país caranguejo que rasteja nas praias, Luiz Gonzaga era o nordeste que andava.
O grande registro musical da seca 2012-18 é a música Chuva de Honestidade de Flávio Leandro, uma letra histórica e é a continuação da Asa Branca. Se já não se morre mais ninguém de fome por causa da seca no século XXI falta resolver os problemas da produtividade e do abastecimento. Não temos mais a migração massiva, mas ainda existe alguma migração por emprego.
Quando o ronco feroz do carro pipaCobre a força do aboio do vaqueiroQuando o gado berrando no terreiroSe despede da vida do peãoQuando verde eu procuro pelo chãoNão encontro mais nem mandacaruDá tristeza ter que viver no SulPra morrer de saudades do sertãoEu sei que a chuva é pouca e que o chão é quenteMas tem mão boba enganando a genteSecando o verde da irrigaçãoNão, eu não quero enchentes de caridadeSó quero chuva de honestidadeMolhando as terras do meu sertãoEu pensei que tivesse resolvidaEssa forma de vida tão medonhaMas ainda me matam de vergonhaOs currais, coronéis e suas cercasEu pensei nunca mais sofrer da secaNo Nordeste do século vinte e umOnde até o voo troncho de um anumFez progressos e teve evoluçãoEu sei que a chuva é pouca e que o chão é quenteMas tem mão boba enganando a genteSecando o verde da irrigaçãoNão, eu não quero enchentes de caridadeSó quero chuva de honestidadeMolhando as terras do meu sertãoIsrael é mais seco que o NordesteNo entanto se investe de farturaDando força total à agriculturaFaz brotar folha verde no desertoDá pra ver que o desmando aqui é certoSobra voto, mas, falta competênciaPra tirar das cacimbas da ciênciaÁgua doce que regue a plantaçãoEu sei que a chuva é pouca e que o chão é quenteMas tem mão boba enganando a genteSecando o verde da irrigaçãoNão, eu não quero enchentes de caridadeSó quero chuva de honestidadeMolhando as terras do meu sertãoEu sei que a chuva é pouca e que o chão é quenteMas tem mão boba enganando a genteSecando o verde da irrigaçãoNão, eu não quero enchentes de caridadeSó quero chuva de honestidadeMolhando as terras do meu sertão
A música chama a atenção para o uso de práticas oriundas da ciência para que se possa produzir adaptadamente às condições climáticas da região. Não se combate a seca, se produz nas condições de seca. Registre-se ainda a qualidade da música e da letra, num momento em que a música da região vive sufocada pelo lixo das chamadas "bandas de forró" (lambada).
Chuva de Honestidade se relaciona com Vozes da Seca. Em vozes Luiz Gonzaga diz que: "Mas doutor, uma esmola a um homem que é são/Ou lhe mata de vergonha ou vicia o cidadão. Em Chuva de Honestidade Flávio Leandro proclama: "Não, eu não quero enchentes de caridade/Só quero chuva de honestidade/Molhando as terras do meu sertão".



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