José Tadeu Arantes | Agência FAPESP – A pobreza e a extrema pobreza alcançaram em 2020, na América Latina, níveis nunca observados, com agravamento da desigualdade. O Brasil continua sendo um dos países com maior desigualdade social de renda, ocupando a segunda pior posição dentre os países que compõem o G20. Essas informações foram apresentadas por Ronaldo Aloise Pilli, vice-presidente do Conselho Superior da FAPESP, durante a abertura da 13ª Conferência FAPESP 60 Anos, que tratou do tema “Pobreza e Desigualdade”.
Pilli encerrou sua fala com as perguntas: "Será possível reduzir essa desigualdade em prazo razoável? Como?"
Para refletir sobre o assunto, o evento reuniu dois grandes especialistas: Martin Ravallion, que ocupa a Cátedra Edmond D. Villani de Economia na Georgetown University, nos Estados Unidos, e, entre outras atribuições, foi diretor do departamento de pesquisa do Banco Mundial; e Marcelo Medeiros, atualmente professor visitante na Columbia University, anteriormente vinculado ao Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e ao Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD). A moderação foi de Marta Arretche, membro da Coordenação Adjunta de Ciências Humanas e Sociais da FAPESP.
Ravallion enfocou o tema da pobreza e da desigualdade na China, lembrando que o espetacular crescimento econômico desencadeado pelas reformas promovidas por Deng Xiaoping em 1979 levou a uma expressiva redução da pobreza, mas também aumentou fortemente as desigualdades no país.
Com base no estudo Fleshing out the olive? On income polarization in China, que produziu no final de 2021, em parceria com Shaohua Chen, Ravallion tratou da polarização da renda causada pelo modelo chinês. E da política posta em prática pelo atual presidente Xi Jinping para reduzir os extremos da pirâmide social e fortalecer o centro.
Segundo o pesquisador, um forte fator de desigualdade e polarização é o hiato entre a zona urbana e a zona rural. E, dentro da zona urbana, entre as cidades costeiras e as cidades do interior. “Todos os três períodos em que a desigualdade declinou, desde 1980, coincidem com reformas significativas na zona rural”, disse. Essas reformas incentivaram a produção individual, reduziram impostos e protegeram os preços de produtos agrícolas como o arroz e trigo.
Na sequência, Medeiros fechou o foco sobre o Brasil, enfatizando que a redução da pobreza não diminui necessariamente a desigualdade. “Para pensar em pobreza, olhe para a base da pirâmide. Para pensar em desigualdade, olhe para o topo”, afirmou.
O pesquisador lembrou que a extrema desigualdade da sociedade brasileira é fruto de um grande conjunto de fatores. E não pode ser corrigida por meio de um conjunto pequeno de medidas. Por isso, enfatizou Medeiros, “não deve haver política de redução da desigualdade. Mas toda política deve levar a desigualdade em consideração. Toda política tem efeito sobre a desigualdade”.
Isso demanda toda uma nova maneira de pensar. E até mesmo um outro vocabulário. “Devemos parar de falar em crescimento agregado. E pensar que quem cresce não é o país como um todo. Em uma sociedade de propriedade privada, quem cresce são indivíduos. É possível ter um crescimento só dos mais ricos, e a economia crescer bastante, e um crescimento só dos mais pobres, também com crescimento econômico. Mas são crescimentos completamente diferentes, que envolvem políticas completamente diferentes”, argumentou Medeiros.
O pesquisador ressaltou que não há uma política certa. Cada uma é um investimento. E, no desenho de uma política, o tempo de implementação, os custos, os benefícios e os riscos devem ser considerados. Também os detalhes importam, e muito. “Pequenas diferenças de desenho podem levar a grandes diferenças de resultados”, disse. E exemplificou: “No caso brasileiro, é fácil entender que um programa como o Auxílio Brasil, que é o sucessor e tem um desenho parecido com o do Bolsa Família, está levando a resultados bastante diferentes”.
A 13ª Conferência FAPESP 60 Anos pode ser assistida na íntegra em: www.youtube.com/watch?v=WK70Pfe5dyU.
Este texto foi originalmente publicado por Agência FAPESP de acordo com a licença Creative Commons CC-BY-NC-ND. Leia o original aqui.
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