Para avançar e fortalecer as soluções que conciliam desenvolvimento econômico, redução das desigualdades e a conservação das florestas e da sociobiodiversidade, o Instituto Brasileiro de Mineração (IBRAM), especialistas e diferentes setores da economia estarão reunidos entre o dia 30 de agosto e 1 de setembro de 2023, em Belém (PA), para a Conferência Internacional Amazônia e Novas Economias. Lideranças internacionais de renome já estão confirmadas, como o presidente Lula, o ex-primeiro-ministro britânico Tony Blair e o ex-secretário geral da ONU Ban Ki Moon.
Entre os curadores do encontro está a Humana, agência especializada em desenvolvimento territorial e sustentabilidade. Bruno Gomes e Carol Ayres, sócios fundadores e diretores da Humana, estão à frente da idealização dos conteúdos técnicos dos 27 paineis do evento, que terá mais de 200 palestrantes. “Os temas abrangem o desenvolvimento sustentável da Amazônia e os novos arranjos econômicos sustentáveis que estão crescendo na região, como a bioeconomia e a economia circular. Estarão presentes no encontro uma diversidade de atores que fazem hoje esse novo momento da Amazônia”, explica Bruno Gomes.
Para além dos três dias de debate, deve haver uma continuidade desse processo para se pensar em caminhos e soluções concretas, olhando o papel da região numa agenda nacional de desenvolvimento e também internacional, incluindo o enfrentamento ao aquecimento global”, complementa Carol Ayres.
Abaixo você confere a entrevista concedida à Crítica por Bruno Gomes, sociólogo e mestre em geopolítica pela Université de Paris 8, sócio fundador da Humana, agência especializada em desenvolvimento territorial e sustentabilidade sobre as expectativas para o evento.
Entrevista
1. A Conferência Internacional Amazônia e Novas Economias visa encontrar soluções que equilibrem o desenvolvimento econômico, a redução das desigualdades e a conservação ambiental. Como vocês veem o papel das diferentes partes interessadas, como empresas, governo e sociedade civil, nesse processo?
Quando se busca um desenvolvimento econômico sustentável é importante que cada setor da sociedade cumpra com o seu papel, tanto mais num ambiente complexo, cheio de desafios e de grandes oportunidades como é a Amazônia. Da mesma forma que o desenvolvimento sustentável inclui questões sociais e ambientais, além das puramente econômicas, quando se trata das partes interessadas é preciso envolver o poder público e a sociedade. Uma atividade econômica necessita de uma política econômica, uma série de normas e regulamentações além de incentivos e medidas governamentais para que possa se desenvolver. A sociedade também precisa estar envolvida na escolha dos rumos que uma região, um município, ou um território pode tomar do ponto de vista econômico, estar ciente e pactuar os prós e contras de uma atividade, de um empreendimento, de uma cadeia. O sucesso está na integração do econômico, do social e do ambiental, por um lado, e na construção e pactuação de agendas comuns, compartilhadas entre os diversos setores da sociedade.
2. O encontro em Belém traz líderes de renome, como o presidente Lula, Tony Blair e Ban Ki Moon. Qual é a importância de reunir líderes internacionais para discutir os desafios da Amazônia e das novas economias?
O desenvolvimento sustentável da região é, antes de mais nada, um assunto dos amazônidas e dos brasileiros. É de nossa responsabilidade buscar caminhos e projetos que dialoguem com essa nova visão, sistêmica e integrada, de desenvolvimento sustentável, para a região. Entretanto, a Amazônia é, como se sabe, uma região importante para o equilíbrio ecológico de todo o mundo. Logo, é natural que se busque apoio e contribuições internacionais e que o mundo participe na busca pelas melhores soluções. Por um lado, proteger o meio ambiente e, por outro, gerar o desenvolvimento necessário para o bem-estar e melhoria nas condições de vida das populações amazônicas. A presença de lideranças internacionais permite que aproveitemos outros conhecimentos e experiências, além daqueles que nós produzimos aqui. Também posiciona a Amazônia diante do mundo, num papel que será definido pelas brasileiras e pelos brasileiros, mas que está inserido nas grandes agendas internacionais. O Ban Ki Moon, por exemplo, foi o secretário geral da ONU no momento de lançamento da agenda dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) e a Amazônia, por sua vez, é crucial para o cumprimento de muitas das metas ali colocadas.
3. Como a abordagem da Humana, agência especializada em desenvolvimento territorial e sustentabilidade, pode contribuir para a promoção de soluções que considerem o desenvolvimento socioeconômico e a conservação das florestas na Amazônia?
Com nossa abordagem territorial sempre consideramos o conjunto de elementos e dimensões do desenvolvimento, em cada território em que atuamos. Realizamos levantamentos e diagnósticos para uma caracterização desses territórios do ponto de vista econômico, social, ambiental, cultural e político. Com esse mapeamento profundo em mãos, conduzimos uma análise e leitura da realidade, não somente por especialistas, mas também pelos cidadãos, cidadãs e comunidades do território. Partindo dessa leitura da realidade compartilhada e de uma problematização do desenvolvimento local, principalmente em seus aspectos econômicos e sociais, e desenvolvemos uma série de ações para promover um desenvolvimento econômico ambientalmente responsável e socialmente inclusivo. Identificamos as potencialidades locais para que o município ou o território possa se desenvolver, sem abraçar monoculturas ou vocações únicas mas, pelo contrário, promovendo diversidade de setores e atividades econômicas, com maior capacidade de inclusão produtiva e sobretudo com maior estabilidade e menor vulnerabilidade a efeitos econômicos externos. No contexto amazônico esse trabalho se traduz por uma atenção ainda maior aos aspectos ambientais, às grandes contradições sociais e às especificidades culturais, considerando os processos históricos da região e a presença de comunidades tradicionais, indígenas, quilombolas e ribeirinhos.
4. Vocês podem compartilhar exemplos concretos de projetos nos quais a Humana tenha trabalhado para fomentar parcerias público-privadas visando o desenvolvimento socioeconômico de municípios brasileiros?
Podemos citar os projetos de AGENDA DE DESENVOLVIMENTO LOCAL - ADL - que realizamos em 4 munícipios (2 no Pará e 2 em Minas Gerais) voltados para desenvolvimento econômico. Nos 4 municípios atuamos com as empresas à frente de um grande empreendimento local e com as prefeituras municipais. Nesses projetos, após realizar o diagnóstico mencionado acima, identificando as grandes potencialidades locais, iniciamos a construção participativa de uma agenda de desenvolvimento local, que nada mais é do que um planejamento econômico de médio prazo para o município, promovendo cadeias e setores e atuando de forma a não deixar ninguém para trás no processo de desenvolvimento. Com essas agendas em mãos, foi possível melhor coordenar e integrar os investimentos públicos e privados, direcionando recursos e priorizando áreas. Além desses planos, foram trabalhadas as capacidades institucionais, tanto do setor público quanto do setor privado, assim como do setor associativo. Por fim, foram desenhados os mecanismos e arranjos necessários para os financiamentos dessas agendas constituindo assim mecanismos financeiros próprios para concretizar essa agenda direcionada ao desenvolvimento.
5. Considerando o contexto de mudança climática, como os territórios podem desempenhar um papel mais proeminente na governança e no enfrentamento de desafios climáticos?
Há uma série de medidas possíveis para que, no nível local, se desenvolvam ações ligadas ao combate às mudanças climáticas. Em primeiro lugar, uma política de avaliação, fiscalização e controle quanto aos impactos ambientais de atividades de qualquer natureza, mas também políticas de incentivo quanto à conservação de áreas e da vegetação nativa, cuidado com os cursos d’água e educação ambiental. Também é possível avançar no desenvolvimento da chamada economia circular, buscando o reaproveitamento daquilo que foi produzido, uma eventual reciclagem ou, em última instância, o descarte adequado. As políticas de resíduos sólidos, o saneamento básico e as escolhas em termos de mobilidade nas cidades, são desafios locais. É importante destacar que atuação local no enfrentamento aos desafios climáticos depende, mais uma vez, de uma boa articulação entre setor público, privado e sociedade.
6. Qual é a importância de promover estratégias participativas de governança territorial para lidar com os desafios atuais? Como essas estratégias podem envolver e empoderar a sociedade local?
Diante dos desafios que temos pela frente, é urgente que haja uma governança territorial compartilhada, que envolve o setor público, privado e a própria sociedade. A complexidade dos problemas que temos pela frente exige soluções que não dependem da boa vontade de um único setor, mas sim de uma atuação conjunta e com engajamento e envolvimento da sociedade civil. Somente uma governança territorial participativa pode dar conta e promover um desenvolvimento, de fato, sustentável. Logo, o poder público e, em certos casos, os atores do setor produtivo, com seus respectivos protagonismos, devem buscar a sociedade no processo de implementação de políticas e empreendimentos. Contrariamente ao que por vezes se pensa, o envolvimento da sociedade nas ações públicas ou privadas que vão transformar o território não constituem um obstáculo ou um atraso, pelo contrário, no médio e no longo prazo este engajamento é garantidor de uma melhor e mais tranquila execução dos trabalhos.
7. Em um contexto onde os interesses econômicos muitas vezes parecem divergentes dos objetivos de conservação ambiental, como é possível encontrar um equilíbrio entre esses dois aspectos?
Hoje em dia não é mais possível que haja tal divergência. Pelo contrário, há cada vez mais, na sociedade, a consciência de que não é possível um desenvolvimento econômico sustentável de longo prazo sem que haja respeito ao meio ambiente. Muitos setores da economia são impactados, não somente pelas condições climáticas, mas também por outros desequilíbrios ambientais, por exemplo o setor agrícola e o turismo, diretamente. Isso também afeta outros mercados que dependem do comércio exterior, dado que muitos países estão levantando barreiras diante dos países e atividade que prejudicam o meio ambiente
8. Quais são as principais expectativas e resultados que vocês esperam da Conferência Internacional Amazônia e Novas Economias?
A Conferência deve contar com 27 painéis e mais de 200 palestrantes. Serão muitos debates e uma grande riqueza de informações, ideias e novas perspectivas sobre o desenvolvimento da região. Uma vez terminada a Conferência, o IBRAM - Instituto Brasileiro de Mineração e realizador do evento, irá promover um pós-evento com a intenção de compartilhar os resultados de forma sistematizada, e também dar continuidades às conexões e pistas de trabalho que surgiram durante o encontro.
9. Como indivíduos e organizações interessados podem se envolver ou contribuir para o diálogo sobre desenvolvimento sustentável na Amazônia e além?
Hoje existem inúmeras iniciativas que vem reunindo profissionais, organizações, empresas e os mais diversos atores, para pensar o desenvolvimento da Amazônia de forma coletiva. Além dos grandes eventos que vêm sendo organizados na região e que sempre serão lugares de engajamento nessas agendas, há redes e grupos de trabalho com propostas específicas para os desafios do desenvolvimento amazônico. Um exemplo é a iniciativa Uma Concertação pela Amazônia da qual a Humana é membro e coordenadora do GT sobre mineração.
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