Elton Duarte Batalha é professor na Faculdade de Direito (FDir) da Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM). Advogado e Doutor em Direito.
O assassinato do candidato à Presidência do Equador, Fernando Villavicencio, no dia 9 de agosto deste ano, evidenciou a violência que tem marcado a política na América Latina nos últimos tempos. Embora esta região do mundo seja marcada por ausência de segurança na vida cotidiana, há algo de diferente que a ocorrência trágica mencionada, quando analisada detidamente, deixa claro: a influência do crime organizado na vida política da região.
Como fartamente demonstrado à época do assassinato de Villavicencio, o território equatoriano tem sido tomado por aumento expressivo dos índices de criminalidade, os quais guardam vínculo íntimo com o aumento da atuação de cartéis de drogas no país. Dada sua localização entre dois grandes produtores de cocaína (Peru e Colômbia) e a ausência de forte estrutura estatal de combate ao crime organizado (pois tal atuação inexistia até então), o território equatoriano mostrou-se convidativo para servir como ponto de escoamento da cocaína produzida em países vizinhos. Tais elementos, somados à típica corrupção endêmica de autoridades das nações latino-americanas, contribuíram para a degradação do convívio social e do ambiente político nacional, culminando na execução, à luz do dia, de um candidato à Presidência conhecido pela atuação contra ilegalidades no país e que prometia tornar mais rígido o combate aos crimes.
A existência de eleições neste momento no Equador, aliás, é reflexo da instabilidade política da região: Guillermo Lasso, atual Presidente e acusado de corrupção, utilizou o instrumento jurídico conhecido como ´morte cruzada’, para dissolver a Assembleia e, concomitante, abreviar seu mandato, para impedir o processo de impeachment que tomava corpo. Deste modo, o próximo mandatário apenas cumprirá o restante do mandato, até maio de 2025, recebendo as credenciais para governar a partir do fim de novembro deste ano. O segundo turno ocorrerá em 15 de outubro entre o empresário Daniel Noboa e Luisa González, candidata apoiada pelo ex-Presidente Rafael Correa, condenado a oito anos de prisão por corrupção e que vive atualmente na Bélgica, a fim de evitar o cumprimento da pena.
O panorama existente no Equador não é estranho ao Brasil. Situações de violência política ocorridas nos últimos anos contra agentes que representam tanto a esquerda quanto a direita no espectro político são de notório conhecimento público, bem como a ampla presença do crime organizado na vida social brasileira. Diante disso, o eventual interesse de facções criminosas pelas regiões próximas aos portos, como o litoral paulista, por exemplo, parece ser uma situação factível, com impacto potencial na vida política nacional. Considerado o fato de que o território brasileiro é via de passagem para a cocaína produzida na América do Sul com destino à Europa, é real o risco de que cidades com localização estratégica na costa nacional sofram a mesma degradação ocorrida em regiões semelhantes do Equador. Além disso, assim como os cartéis mexicanos passaram a influenciar o crime organizado no Equador, algo semelhante não poderia ocorrer em território brasileiro (mesmo que fosse menos por influência e mais por associação aos grupos nacionais)? São pontos que o tempo esclarecerá.
As eleições regionais no Brasil estão próximas, ocorrendo já em 2024, e o alarme já foi tocado na América Latina quanto à vinculação entre política e crime organizado. Espera-se que as autoridades nacionais, atentas à situação dos países mencionados, previna eventuais tragédias como a ocorrida no território equatoriano. A existência de um ambiente verdadeiramente democrático depende de um campo político e social marcado pelo debate sério e livre de intimidação. Qualquer violência, real ou potencial, apta a impedir tal discussão tornaria a democracia mero simulacro de si mesma.
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