Desafios e Perspectivas: Investimentos na Educação Básica Brasileira - Uma Conversa com Rodrigo Godoy, CEO da FDG - Blog A CRÍTICA

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segunda-feira, 18 de setembro de 2023

Desafios e Perspectivas: Investimentos na Educação Básica Brasileira - Uma Conversa com Rodrigo Godoy, CEO da FDG

Rodrigo Godoy, CEO da FDG - Foto: LinkedIn


Na última quarta-feira (13)  foi divulgado o relatório Education at a Glance 2023, da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). No Brasil, os investimentos públicos por aluno na educação básica equivalem a um terço dos gastos dos países ricos nessa etapa. Ou seja, é o terceiro pior investimento em alunos da educação básica no ranking, de quase 50 países.


Neste contexto, tivemos a oportunidade de conversar com Rodrigo Godoy, renomado CEO da FDG, uma fundação educacional dedicada a promover transformações positivas no cenário da educação. Suas perspectivas e insights oferecem uma visão aprofundada sobre os desafios enfrentados e as oportunidades latentes nesse crucial setor.


Ao longo da entrevista, Rodrigo Godoy aborda com clareza e profundidade a disparidade de investimentos em educação básica entre o Brasil e os países mais desenvolvidos, desvelando as raízes e implicações desse cenário. Ele ressalta a importância não apenas do montante investido, mas também da gestão eficaz desses recursos, sublinhando como isso pode moldar o futuro educacional do país.


Entrevista


1. Como você interpreta os dados que indicam que o Brasil investe o equivalente a um terço dos gastos dos países ricos por aluno na educação básica?


O mau direcionamento do investimento em educação é uma das causas mais impactantes no problema crônico da educação básica brasileira. No entanto, a deficiência de conhecimento sobre gestão focada em aprendizagem tem um impacto ainda mais importante em nosso mau resultado.


2. Quais são os principais impactos que essa disparidade de investimento pode ter no sistema educacional brasileiro?


O efeito disso é o mau resultado da aprendizagem nas disciplinas básicas, conforme constatam as avaliações, tanto nacionais quanto internacionais (IDEB e PISA). É a isso que me refiro quando falo do problema crônico da educação básica no Brasil.


3. Na sua opinião, quais são os fatores que contribuem para essa diferença significativa nos investimentos em educação básica entre o Brasil e os países ricos?


É preciso esclarecer que o Brasil não investe pouco em educação. Em percentual do PIB, investimos mais do que a média dos países da OCDE. Mas historicamente o Brasil privilegiou o ensino superior no direcionamento de recursos, em detrimento da educação básica. Foi uma decisão estratégica que não vem de agora. A própria concentração de recursos na União e o estabelecimento da divisão de responsabilidades das esferas municipal, estadual e federativa quanto aos níveis educacionais básico e superior levam à perpetuação desse contexto.


4. Quais os desafios mais significativos que o Brasil enfrenta ao tentar aumentar os investimentos na educação básica?


Uma vez que cabe aos municípios e estados prover educação básica às crianças e jovens, a limitação é a capacidade de investimento e custeio nessas esferas. Consta que boa parte dos municípios voltaram a operar no vermelho neste ano, especialmente os que dependem mais do fundo de participação proveniente da União. A despeito da obrigatoriedade de se direcionar 25% do orçamento municipal à educação, muitas vezes ainda assim não é o suficiente para arcar com o mínimo necessário para prover um serviço de qualidade.


5. Como a falta de investimento adequado na educação básica pode afetar a formação de cidadãos e a competitividade do país no cenário global?


O mau resultado da educação básica brasileira é justamente o baixo nível de aprendizagem, já amplamente evidenciado pelas avaliações nacionais e internacionais. O investimento por aluno inferior a outros países da OCDE, por óbvio, constitui uma das causas deste resultado indesejável.


A consequência mais nefasta da aprendizagem deficiente na educação básica é a baixa produtividade de nossa força de trabalho. É uma equação cruel: cidadãos com lacunas educacionais se transformam em força de trabalho menos produtiva, e por consequência, menos competitiva globalmente.


6. Quais seriam as estratégias mais eficazes para melhorar a gestão dos recursos destinados à educação básica no Brasil?


O que boa parte dos gestores municipais e estaduais ainda não se atentaram é para o fato de que o maior desperdício de recurso público na educação básica está justamente no retrabalho de rematricular na mesma série um aluno que deixou de aprender o suficiente no ano letivo, sendo assim reprovado ou tendo abandonado a escola no ano anterior.

Por essa razão é que se faz tão necessário o uso de um método consistente de gestão escolar, que tenha foco no aprendizado do aluno de maneira proativa, conduzindo à melhoria da taxa de aprovação e redução do abandono escolar.


7. Em sua opinião, quais políticas ou medidas o governo brasileiro poderia implementar para aumentar os investimentos na educação básica?


Seria necessário revisar duramente a estratégia educacional brasileira, promovendo o rebalanceamento dos recursos entre a educação básica e a educação superior. Isso teria um custo político praticamente inviável, pois a estrutura de custos do ensino público superior no Brasil já está estabelecida há décadas.


Diante dessa restrição, o governo federal precisa finalmente articular um pacto nacional pela educação pública alicerçado em boa gestão voltada para a aprendizagem. Esse pacto precisa da adesão maciça de estados e municípios.


Esse pacto é o que aconteceu em países de ponta em educação como a Coreia do Sul há cerca de trinta anos. Não por acaso hoje é o país que mais gera patentes no mundo, um fator fundamental para o desenvolvimento e pujança econômica.


8. Qual a importância de garantir a transparência e o controle social sobre os gastos em educação básica?


Transparência e controle é o mínimo. É uma obrigação básica dos governos em se tratando de gasto público, em todas as esferas. Felizmente vemos evolução neste aspecto em razão da politização e do engajamento crescente de parte da sociedade nos últimos dez anos. A cobrança sobre o gestor público quanto à aplicação adequada e proba está se fortalecendo, é isso é muito positivo.


9. Como o compromisso político de longo prazo pode impactar a consistência e a eficácia dos investimentos na educação?


O grande compromisso político de longo prazo de todo gestor público deveria ser com a educação, pois esse é o verdadeiro legado de desenvolvimento que ele deixa.


Mesmo embora a população em geral tenha pautas mais urgentes como geração de empregos, saúde e segurança pública - e é claro que essas demandas precisam de atendimento - o que muda de maneira sustentável uma nação é a capacidade produtiva de sua força de trabalho. Essa é intrinsecamente ligada à qualidade da educação, e nossa lacuna começa na educação básica.


10. Quais os benefícios de se investir adequadamente na educação básica para o desenvolvimento social e econômico do Brasil?


O resultado esperado de uma educação de qualidade é uma força de trabalho produtiva, e por consequência competitiva globalmente. É o que gera riqueza para uma nação.


No entanto, faço as perguntas: se por mágica dobrássemos os investimentos em educação básica no Brasil, o resultado de aprendizagem medidos pelas avaliações acompanhariam essa evolução? Será mesmo que os gestores públicos em geral conseguiriam produzir melhores resultados de aprendizagem na educação?


Faço essas perguntas porque há mais de 25 anos estamos comprometidos com melhoria de resultados de aprendizagem. Já ajudamos mais de 7 mil escolas em 12 estados brasileiros e os resultados são formidáveis, desde o Ceará, Amazonas, até nossa escola- modelo em Belo Horizonte, que está entre as 50 melhores escolas públicas do Brasil há mais de uma década. E sempre que perguntados, os gestores dessas escolas sempre acabam dizendo: o volume de recurso faz diferença, mas é a boa gestão que vira o jogo da aprendizagem na educação básica.

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