Murillo Torelli é professor de Contabilidade Financeira e Tributária no Centro de Ciências Sociais e Aplicadas (CCSA) da Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM).
No Brasil, o debate político muitas vezes se desenrola em meio a declarações controversas e polarização ideológica, e o Ministro da Fazenda, Fernando Haddad, não decepcionou nesse aspecto. Em uma entrevista recente ao programa Canal Livre, da Band, Haddad fez uma comparação surpreendente e preocupante ao equiparar os representantes dos contribuintes do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) a detentos. A afirmação de que empresários, pagadores de impostos e geradores de empregos são equivalentes a criminosos é um exemplo da visão ultrapassada e extremista em relação ao setor empresarial.
A declaração de Haddad, ao dizer que é "a mesma coisa que você pegar quatro delegados e quatro detentos para julgar um habeas corpus, sendo que o empate favorece o detento", demonstra um profundo desrespeito pelos empresários que contribuem para o crescimento econômico do país. Fazer uma analogia entre pessoas que cumprem a lei, pagam impostos e criam empregos com criminosos é, no mínimo, desonesto e prejudicial ao diálogo político construtivo.
É importante lembrar que os empresários e pagadores de impostos são a espinha dorsal da economia brasileira. São eles que geram empregos, impulsionam o crescimento econômico e contribuem significativamente para a arrecadação de impostos que sustentam o Estado. Rotulá-los como detentos é não apenas injusto, mas também prejudicial ao ambiente de negócios e ao investimento no Brasil.
A Associação dos Conselheiros Representantes dos Contribuintes no CARF (ACONCARF) rapidamente emitiu uma nota de repúdio à comparação feita pelo Ministro Haddad. A ACONCARF destacou que a fala do Ministro "se afasta da liturgia respeitosa da função que ocupa" e que ela agride os conselheiros dos Contribuintes, que desempenham um papel fundamental na sociedade brasileira, seguindo as leis e regulamentos da administração pública.
O CARF desempenha um papel crucial na resolução de disputas fiscais de forma administrativa. Trata-se de um órgão, com representantes tanto dos contribuintes quanto dos auditores fiscais. A recente alteração na lei, que restaurou o voto de qualidade, desencadeou debates sobre a melhor maneira de garantir uma decisão justa para ambas as partes envolvidas, mas não devemos politizar tal debate, ou usar o CARF como grande fonte de recursos para o governo.
Relacionado ainda ao fato, também gera preocupação ver presidente do CARF, Carlos Higino Ribeiro de Alencar, no dia 21 de setembro, afirmar ao Estadão que a previsão de arrecadação de R$ 54,7 bilhões do governo com julgamentos no órgão no próximo será obtida “com tranquilidade”.
No entanto, em vez de focar em aumentar a arrecadação por meio do CARF, o governo deveria considerar uma abordagem mais ampla. A reforma administrativa, por exemplo, é uma necessidade urgente e que poderia melhorar a eficiência do governo, reduzir gastos desnecessários e promover um ambiente mais favorável aos negócios. Em vez de demonizar os contribuintes, é hora de reconhecer o papel vital que desempenham na construção da riqueza do país e na geração de empregos. Compará-los a detentos é uma retórica ultrapassada que não faz justiça ao setor empresarial e não contribui para um debate político construtivo.
*Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião da Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM).
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