Judas: Traidor ou Mais Fiel dos Discípulos? - Blog A CRÍTICA

"Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados." (Millôr Fernandes)

Últimas

Post Top Ad

sábado, 30 de março de 2024

Judas: Traidor ou Mais Fiel dos Discípulos?



Em Judas não tendo "traído" Jesus não existiria o cristianismo e, mesmo sendo a doutrina de Cristo a do perdão, para subsistir, a religião inspirada no galileu teve que criar a figura de um "traidor" atestando que a humanidade é muito mais movida pelo ódio e pelo julgamento do que por qualquer outro sentimento.


A traição de Judas é uma das simbologias mais marcantes da doutrina cristã, mas é uma das colunas mais frágeis de religião estabelecida pelos ensinamentos do homem de Nazaré. Como entregar à morte um homem que sabia que iria morrer e que tinha que morrer para que houvesse a redenção da humanidade? Por esta ótica o ato de judas foi fundamental para o estabelecimento da Igreja de Cristo, seria Judas o mais fiel dos discípulos?


O escritor israelense Amos Oz, morto em 2018, desafiou a tradicional narrativa cristã sobre Judas Iscariotes em seu livro "Judas", sugerindo que Judas não foi um traidor, mas sim um devoto discípulo que tentou promover Jesus como um líder entre os oprimidos e intelectuais da época. Contrariando a visão convencional da Igreja Católica, Oz argumenta que Judas não traiu Jesus por 30 moedas de prata, mas sim tentou orquestrar um plano para que Jesus se revelasse como o Messias em Jerusalém, vencendo a morte. Esta interpretação desafia as crenças cristãs tradicionais, levantando questões sobre a fundação da igreja cristã e suas consequências históricas, incluindo a perseguição aos judeus.


Oz sugere que se os judeus da época tivessem aceitado Jesus e sua mensagem de purificação do judaísmo, talvez a subsequente perseguição aos judeus, culminando no Holocausto, não tivesse ocorrido. Ele argumenta que Jesus não buscava fundar uma nova igreja, mas sim reformar o judaísmo, desafiando as estruturas de poder do Templo e do governo romano. Essa interpretação não apenas questiona os fundamentos do cristianismo, mas também tem implicações para o conflito entre Israel e Palestina, sugerindo uma reflexão sobre a história e as crenças das duas maiores religiões monoteístas. O livro de Oz não apenas oferece uma visão provocativa e original sobre um tema antigo, mas também convida os leitores a reconsiderarem suas próprias crenças e entendimentos sobre religião e história.


O questionamento da traição de Judas também aparece num livro do filósofo esloveno Slavoj  Zizek. O livro "El títere y el enano" de Slavoj Zizek argumenta que o cristianismo, em sua essência, contém uma perversão fundamental. Essa perversão reside na tensão entre a lei universal e a graça divina:


  • Lei universal: impõe um código moral que condena o prazer e exige obediência.
  • Graça divina: oferece redenção do pecado através do sacrifício de Cristo, permitindo um prazer "proibido" pela lei.


Para Zizek, a perversão não está na transgressão individual, mas na estrutura do cristianismo:


  • A figura do "anão" (São Paulo) representa a lei que castra o prazer.
  • A figura do "títere" (Cristo) representa a graça que permite o prazer através do sacrifício.


Ao oferecer redenção, o cristianismo cria uma "demanda infinita" de prazer que nunca pode ser satisfeita. Essa demanda, segundo Zizek, é a força motriz da perversão no cristianismo.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Post Bottom Ad

Pages