Pesquisa desenvolvida na UFPB estuda soluções para reverter a degradação e a pobreza na Caatinga
Foto: Divulgação/Codevasf |
Helda Suene/Ascom Fapesq - As terras subúmidas secas do Agreste brasileiro estão se tornando “sertão”. É o
que mostra um estudo inédito publicado pelo pesquisador Humberto Barbosa,
fundador do Laboratório de
Análise e Processamento de
Imagens de Satélites (Lapis).
A pesquisa mostra resultados
impactantes, que podem trazer uma reviravolta à formulação de políticas para a região e à própria metodologia
para delimitação do Semiárido brasileiro. O artigo reclassifica o mapa das terras secas
no Brasil, ou seja, o percentual de áreas consideradas subúmidas secas (agreste), semiáridas ou áridas.
De acordo com o estudo
do Lapis, uma área total de
725 mil km2 do território brasileiro passou da condição de
subúmida seca/úmida para
semiárido, em apenas três
décadas (1990-2022). Isso significa que 55% da região se
tornou semiárida e passou a
enfrentar, em condições normais, estiagem com duração
de cinco a seis meses.
Segundo Humberto Barbosa, responsável pelo estudo, “o desenvolvimento do
clima árido ocorre em diferentes áreas da região semiárida brasileira, particularmente na parte central da
região, nordeste e sudoeste.
Abrange áreas da Bahia, de
Pernambuco, do Piauí e da
Paraíba. Isso confirma um
aumento exponencial da seca
extrema na região”, conclui.
Dentro desse contexto de
desertificação do solo, uma
pesquisa desenvolvida na
Universidade Federal da Paraíba (UFPB) avalia a hipótese de que paisagens agrícolas
que mantêm cobertura natural e áreas agrícolas bem manejadas têm maior eficiência
produtiva, garantem os serviços ecossistêmicos essenciais e podem ser o caminho
para reverter uma trajetória
de degradação e pobreza na
Caatinga.
De acordo com o pesquisador Helder Araujo, professor
dos programas de pós-graduação em Biodiversidade,
Ciências Biológicas e Agronomia (UFPB), a capacidade
produtiva em uma paisagem
agrícola está associada a limites biofísicos que permitem a
provisão de serviços ecossistêmicos, os quais estão sob
ameaça devido ao uso inadequado da terra. “Mudanças drásticas na estrutura da
vegetação causadas por limites ecológicos excedidos,
seja por alterações ambientais
ou antrópicas, afetam serviços ecossistêmicos essenciais
para o desenvolvimento sustentável global. A conciliação
da produção agrícola com os
serviços ecossistêmicos, dos
quais o próprio setor depende, é um dos pilares para a
agricultura moderna e sustentável”.
Para testar possibilidades de reverter essa trajetória, este projeto está avaliando o atual sistema de uso da
terra em uma das áreas mais
secas da Caatinga, os Cariris
Velhos, bem como apoiando o
estabelecimento de Paisagens
Agrícolas Sustentáveis como
caminhos alternativos para
o desenvolvimento regional
sustentável. A hipótese científica que norteia o projeto é que paisagens com 40% a 60%
de cobertura natural e demais
áreas manejadas com técnicas
que conservam umidade no
solo, diversificam e rotacionam culturas, favorecem simultaneamente a produção
agrícola e o ecossistema.
“Para isso, estamos avaliando serviços ecossistêmicos relacionados à exportação de sedimentos,
decomposição de matéria orgânica no solo, ciclagem de
nutrientes, herbivoria e defesa contra herbívoros, polinização, sequestro e estoque de carbono e produção
agropecuária, tanto em cultivos experimentais como dos
próprios agricultores”, adiantou Helder. As atividades em
campo estão sendo realizadas nos municípios de Cabaceiras, São João do Cariri e
São José dos Cordeiros.
O projeto desenvolvido
na UFPB teve início em 2022
e vai até 2025 com a participação direta de 12 docentes,
técnicos e vários estudantes, de graduação a doutorado, que já atuam em pesquisas integradas com foco
em “Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos”. As diferentes experiências abrigam
pesquisas e ações em ciências agrárias, ecologia teórica
e aplicada, manejo e conservação de solos, geoprocessamento e sensoriamento remoto, ecologia de paisagens,
planejamento regional e desenvolvimento sustentável.
A maioria da equipe
é vinculada à Universidade Federal da Paraíba, mas
também existem parceiros
consolidados e colaborações interinstitucionais com a Universidade Estadual da
Paraíba, a University of Miami (EUA) e Universidad Nacional Autónoma de México. A pesquisa coordenada
por Helder conta com apoio
do Governo da Paraíba, por
meio da Secretaria de Estado
da Ciência, Tecnologia, Inovação e Ensino Superior (Secties) através do edital Universal executado pela Fundação
de Apoio à Pesquisa da Paraíba (Fapesq), com investimento no valor de aproximadamente R$ 230 mil, sendo R$
165 mil do CNPq e R$ 64 mil
da Fapesq.
Além das contribuições
para apoiar políticas públicas e o desenvolvimento regional citadas anteriormente,
esse projeto também contribuirá com a formação de recursos humanos da graduação ao doutorado; a produção
de conhecimento científico
através de publicações em revistas de alto impacto internacional; a divulgação dos resultados para discussão em
congressos, simpósios, bem
como para a sociedade em
geral através do site www.
nexuscaatinga.com.br, redes
sociais e reportagens.
Resultados de uma dissertação de mestrado obtidos
com análises que abrangem
17.815 propriedades rurais
no Cariri paraibano apontam que a situação atual de
uso e cobertura da terra é responsável por: 1) perda média de solo de 8,74 toneladas
por hectare por ano (ha/ano),
através de erosão; 2) estoque
médio de carbono de 68,72 toneladas ha/ano; 3) produção
agropecuária média de 0,38
toneladas ha/ano. Ainda, os
maiores valores de perda de
solo e menores valores de estoque de carbono e produção
agropecuária por hectare são
encontrados nas pequenas
propriedades (com menos de
15 hectares), as quais correspondem à maioria das propriedades na região.
“Avaliamos um cenário
para entender o que aconteceria se todas as propriedades
seguissem o Código Florestal Brasileiro e mantivessem
ou restaurassem 20% de suas
áreas, mas, infelizmente, as
tendências dos efeitos da degradação e baixa produtividade continuariam. De forma contrária, essa tendência
é revertida se 50% das áreas
das propriedades, nos locais
menos propícios para agricultura, forem restaurados e
os demais 50% forem ocupados por práticas que envolvam diversidade e rotação de
culturas adequadas à região
semiárida, junto com a práticas de interação lavoura e
pecuária”, enfatizou Helder.
As estimativas nesse cenário promovem uma redução
da perda de solo de 388% (em
média), um aumento de 158%
de estoque de carbono e um
aumento da produtividade
agropecuária em 416%, com
impactos positivos maiores
nas pequenas propriedades.
Ainda, resultados já publicados pela equipe demonstram que paisagens similares a esse último cenário são
mais produtivas e resilientes em períodos extremos de
estiagem, confirmando-as
como estratégicas frente às
mudanças climáticas.
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