- Por estreita margem, o Comitê de Política Monetária (Copom) decidiu reduzir a taxa Selic em 0,25% em sua última reunião. A forte divergência nas votações dos membros do Banco Central gerou grande atenção no mercado, pois sinaliza uma possível mudança na postura do Copom em relação à política monetária.
- O cenário externo, com juros mais altos nos EUA por um período prolongado, intensificou a aversão ao risco, representando um desafio adicional para países emergentes como o Brasil, que já lutam contra a inflação. No entanto, a situação fiscal fragilizada do Brasil coloca o país em uma posição ainda mais desafiadora em comparação com seus pares.
- Sob essas condições, o Real deve se depreciar, o que, por sua vez, intensifica as pressões inflacionárias. É importante ressaltar que, apesar dessa conjuntura, não significa que o ritmo de crescimento dos preços ultrapassará o intervalo da meta estabelecida, mas sim que a probabilidade de alcançar o centro da meta se torna cada vez menor.
A Hedgepoint Global Markets aborda, em novo relatório, a redução da taxa Selic em 25 bps, na última reunião do Copom, trazendo os juros básicos da economia brasileira para 10,50%.
Essa decisão, em contraste com a reunião anterior, não foi unânime entre os membros, sinalizando ao mercado que o comitê está gradualmente adotando uma postura mais acomodatícia em relação à política monetária e à meta de inflação de 3%.
“No comunicado oficial da última reunião, o banco central expressou preocupação com o ambiente externo, onde a persistente inflação nos Estados Unidos torna incerto o momento em que haverá uma flexibilização da política monetária do país. Essa incerteza aumenta a aversão ao risco, o que impõe um desafio adicional para as autoridades monetárias de países emergentes”, diz Victor Arduin, analista de Macroeconomia e Energia da Hedgepoint.
Ainda, no cenário nacional, o banco central ressaltou a importância da execução das metas fiscais para ancorar as expectativas de inflação.
“Nesse sentido, vamos abordar alguns fatores que estão por trás da decisão do banco central. Em seguida, analisaremos como os riscos podem influenciar a trajetória da inflação daqui para frente”, destaca.
Mudança na meta fiscal traz incertezas
De acordo com o analista, “uma das razões pelas quais observamos uma mudança no ritmo de corte da taxa Selic reside na revisão das metas fiscais, que passaram de um superávit para zero e 0,25% do PIB em 2025 e 2026, respectivamente. Essa alteração reforçou a desconfiança dos agentes do mercado quanto à consolidação fiscal e à estabilidade da dívida pública”.
Analisando as contas públicas, o resultado de março, embora negativo, superou as expectativas positivamente. O setor público consolidado brasileiro apresentou um superávit primário de R$ 1,177 bilhão, contrariando a projeção de déficit de R$ 1,55 bilhão.
“Destaca-se a performance positiva de estados e municípios, que registraram superávit primário de R$ 3,418 bilhões, enquanto o governo central e as empresas estatais apresentaram déficits de R$ 1,898 bilhão e R$ 343 milhões, respectivamente”, observa.
“Em consequência, a dívida pública do país continua crescendo, passando de 60,9% do PIB para 61,1% em termos líquidos e de 75,5% para 75,7% em termos brutos. O cenário externo desfavorável, que pressiona o câmbio de países emergentes, soma-se à fragilidade fiscal do Brasil, impactando negativamente o Real. Como resultado, a moeda brasileira desvalorizou-se mais do que seus pares, passando de R$ 4,90 no início do ano para aproximadamente R$ 5,14 no primeiro fechamento pós-Copom”, ressalta.
No externo, cresce aversão ao risco
Outrora se discutia a possibilidade de corte na taxa de juros nos EUA no início de 2024. Mas agora, o cenário é bem diferente, com uma mudança radical de perspectiva. Participantes do mercado especulam a necessidade de um novo aumento nos juros para conter a inflação.
“O momento é um dos mais desafiadores para o Fed. Contrair ainda mais os juros restritivos pode levar a economia para a recessão, enquanto não agir pode resultar em uma perda de ancoragem de expectativas, resultando em inflação mais alta por mais tempo”, pondera.
“Por conta da curva de juros nos Estados Unidos mais elevada, cada novo corte da Selic aumenta o spread entre os juros nominais dos dois países, resultando em menor atratividade dos títulos do Tesouro brasileiro e consequente apreciação do dólar”, aponta.
Com o câmbio depreciado no país, as importações ficam mais caras, o que leva ao aumento da pressão sob à inflação. Ainda, os alimentos estão absorvendo uma parcela maior da renda das famílias em detrimento de outros bens e serviços, o que pode afetar o desempenho da economia.
Medidas contra a inflação no front monetário serão afrouxadas?
O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) registrou um aumento de 0,38% em abril, frente 0,16% registrado em março. Porém, no acumulado anual, continua em queda, passando de 3,93% no mês anterior para 3,69% em abril. Com esse resultado, a variação dos preços permanece abaixo do teto da meta, de 4,5%.
“No entanto, alcançar o centro da meta de inflação se torna cada vez mais desafiador com a deterioração dos fundamentos fiscais. Além disso, em um ambiente externo adverso, o Real pode sofrer depreciação cambial, resultando em inflação mais elevada”, acredita.
Nesse sentido, o que acontece fora do Brasil não está sob controle do país. Para seguir o processo desinflacionário e garantir o controle dos preços, o governo precisa demonstrar um maior esforço fiscal ou utilizar uma política monetária mais restritiva.
“A recente divisão no Banco Central (Bacen) quanto à magnitude do corte da taxa de juros indica que haverá menos espaço para conter a inflação por meio da política monetária, o que pode levar a um aumento da inflação no futuro, mesmo que dentro da faixa de tolerância”, conclui.
Em Resumo
Em abril, um conjunto de dados desfavoráveis sobre a inflação americana gerou a expectativa de que os juros nos Estados Unidos permanecerão elevados por mais tempo. Isso intensificou a aversão ao risco no mercado, impactando negativamente ativos voláteis, incluindo investimentos em países emergentes.
Nesse cenário, o Brasil enfrenta maiores desafios inflacionários, pois o diferencial de juros entre Brasil e Estados Unidos se torna um fator para a depreciação do Real. Isso explica parcialmente a menor magnitude do corte da taxa Selic. No entanto, a divergência nas votações do Banco Central (Bacen) indica uma mudança gradual na abordagem das autoridades monetárias em relação à inflação no país.
Será interessante analisar na ata da reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) os argumentos dos diretores que defenderam um corte maior de 0,50%.
Uma das possíveis explicações dessa divisão é a possível desaceleração da economia brasileira.
A divulgação do PIB do primeiro trimestre de 2024 (1T2024) está prevista para o início de junho. A expectativa é de que o resultado seja afetado negativamente por uma possível queda no PIB agrícola das principais culturas agrícolas no período de janeiro a março.
Caso essa projeção se confirme, somada a uma revisão baixista para o trimestre anterior, o Brasil poderá entrar em recessão técnica, caracterizada por dois trimestres consecutivos de retração na atividade econômica.
Acesse o relatório completo clicando aqui.
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