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sexta-feira, 31 de maio de 2024

Em crises como a do RS, é aceitável o Estado ter déficit público

Economista José Cláudio Securato avalia que, apesar de a situação fiscal do Brasil não ser das melhores, é preciso apagar a discussão sobre o déficit para recuperar a economia do Rio Grande do Sul

Chuvas provocaram mortes e muitos prejuízos materiais - Foto: Maurício Tonetto/SecomRS


 

“Apaga a discussão sobre o equilíbrio fiscal. É preciso ressaltar que em relação ao papel do Estado, em um momento como este, é aceitável ter déficit público”. A frase é do economista e administrador José Cláudio Securato a respeito do que é necessário gastar em ações humanitárias para recuperar a economia do Rio Grande do Sul, devastada por enchentes que afetaram mais de 80% dos municípios daquela unidade da federação.

 

Defensor da responsabilidade fiscal, Securato lembra que este é um dos maiores problemas atuais e que vai se agravar com a necessidade de ampliar os gastos para recuperar o estado gaúcho que depende de ajuda governamental para se reerguer. A governança do setor público para decisão em economia será, inclusive, um dos temas que ele abordará em sua palestra durante o Fórum MoOve On, considerado um dos maiores eventos corporativos do país, que terá sua edição de 2024 no dia 5 de junho, no Expo Center Norte, em São Paulo. Neste ano, o encontro tem como tema a “Trilogia da Excelência: Tecnologia, Decisões Humanas e Negócios Financeiros Sustentáveis”.
 

A tragédia que assolou o RS interrompeu o fluxo circular da renda e, em momentos como o atual, é preciso uma atuação ativa do Governo, pois não há recursos por parte da iniciativa privada. “Em uma situação como esta ocorre a ruptura da circulação do dinheiro, que acontece quando os cidadãos recebem seus salários, vão às compras gerando lucro para o comércio e renda para os empregados. Então o comércio usa o dinheiro da venda para repor estoques e alimenta a indústria e assim por diante. A economia gaúcha parou de girar”, explica. A questão é que tal ruptura deverá ter como consequência a queda do nível de riqueza do Rio Grande do Sul. E de forma drástica.
 

O economista diz que ainda é cedo para realizar cálculos precisos sobre os impactos, pois o fenômeno continua em andamento, mas ele acredita que houve perdas entre um terço e metade do PIB, que em 2023 somou R$ 650 bilhões. Desta forma, o prejuízo deve ficar entre R$ 200 bilhões e R$ 300 bilhões. “É um Estado forte, exportador e que também vende produtos para o Brasil inteiro. Por isso, o impacto vai reverberar na balança de pagamentos, pois haverá redução das exportações, em negócios por todo o Brasil e, principalmente, no próprio Estado”.

 

A solução para a hecatombe é muito cara e vai exigir grande esforço dos poderes Executivo e Legislativo e o bom-senso de que não é o momento de se prender às regras fiscais. E nesse ponto a tragédia traz ensinamentos para governo e legisladores. Se todos os governos tivessem a preocupação de manter o equilíbrio fiscal, os gastos para salvar o Rio Grande do Sul teriam impacto menor nas contas públicas, porém, como ao longo dos anos e mesmo agora, os esforços para reduzir os dispêndios estiveram aquém do necessário, um gasto gigantesco – humanitário e econômico – se juntará às dívidas já existentes.

 

Na análise de Securato, a situação econômica do Brasil se deteriorou no segundo trimestre em comparação com o primeiro por uma série de razões. No final do ano passado a expectativa era de que os cortes de juros dos Estados Unidos fossem começar no primeiro semestre desse ano, particularmente, em março. A essa expectativa agora é para agosto. “Mas pelos números de inflação que observamos nos Estados Unidos, pela taxa real de inflação, talvez não tenha redução de juros por lá neste ano”, observa. Segundo o economista, esse arcabouço é importante porque a taxa de juros americana é a taxa livre de risco do mundo. Ela sempre vai atrair mais capital e serve de parâmetro a qualquer medida de investimento.

 

No âmbito local, a questão fiscal que piorou recentemente é uma consequência nítida da abordagem do governo em flexibilizar o cumprimento da meta fiscal. “E aqui eu também coloco o Congresso dentro deste desvio de rota, pois não é só um problema do Poder Executivo. É um problema também do Poder Legislativo que hoje consome um nível de emendas gigantesco. E não podemos esquecer que o governo Lula é marcado na sua relação com o Congresso como um governo que tem liberado emendas numa proporção nunca vista”, avalia ao lembrar que, depois da eleição, em dezembro, antes de tomar posse, o governo Lula já começou com R$ 100 bilhões de emendas. “É um volume gigantesco de dinheiro. E esse processo não para”.


Em sua opinião, essa é a razão para que a liberação de verba para o Rio Grande do Sul esteja sendo tratada como se fosse um recurso extra, pois há uma quantidade de emendas diárias para o Brasil que não tem nenhuma relação com o problema. “O fiscal está desgovernado. O Haddad, que era o último defensor, perdeu a credibilidade porque anunciou diminuição da meta fiscal, o que é extremamente negativo e, obviamente, ele se refere à meta do ano que vem”. E para piorar a situação tem surgido fenômenos e notícias ruins como essa tragédia climática e a atualização de cálculos da Previdência mostrando que a reforma feita durará menos tempo do que o estimado.

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