Entrevista com Flávia Bahia: Impactos da PEC 3/2022 na Gestão Costeira Brasileira - Blog A CRÍTICA

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quinta-feira, 6 de junho de 2024

Entrevista com Flávia Bahia: Impactos da PEC 3/2022 na Gestão Costeira Brasileira

FGV


Nesta entrevista, conversamos com Flávia Bahia, Professora da FGV Direito Rio e especialista em Tribunais Superiores, sobre a Proposta de Emenda à Constituição nº 3/2022 (PEC 3/2022). A proposta tem gerado debates acalorados, principalmente em relação à transferência de terrenos de marinha para o setor privado e suas possíveis implicações. Flávia Bahia nos oferece uma análise detalhada sobre os objetivos da PEC, os impactos esperados e as preocupações ambientais e sociais associadas.


ENTREVISTA


1. Qual o principal objetivo da PEC 3/2022 e quais os impactos esperados com sua aprovação?


O principal objetivo da PEC nº 3/2022 é o de autorizar que se passe ao domínio pleno dos estados e municípios as áreas que são afetadas ao serviço público estadual e municipal, inclusive destinadas a utilização por concessionárias e permissionárias de serviços públicos, no plano dos estados e municípios e, além disso, a autorização para a venda dos terrenos da Marinha a empresas e pessoas que já estejam ocupando aquela faixa litorânea.


2. Como a transferência dos terrenos de marinha para o setor privado impactará o acesso da população às áreas costeiras?


Sobre os impactos referentes ao acesso da população às áreas costeiras é importante destacar que a PEC 3/2022 não privativa a praia em si. Na verdade, a parte frequentada pelos banhistas continuaria pública sob domínio da União, mas, ainda que não se preveja a privatização direta das praias, acaba indiretamente a proposta possibilitando que uma empresa, que a iniciativa privada, cerque o terreno e impeça ou dificulte a passagem de banhistas na faixa de areia. Como já ocorre em alguns litorais brasileiros, em razão de grandes resorts, etc.


3. Quais os riscos e benefícios da regularização da ocupação de terrenos de marinha por particulares?


Bem, os defensores da proposta falam em benefícios fiscais, em arrecadação maior da União com relação a essa área que é ocupada pela iniciativa privada, mas está sob domínio da União. Mas creio que os principais riscos é que colocaram a proposta em debate, em que realmente a população brasileira está bastante receosa. Temos uma preocupação bastante legítima com o meio ambiente, né? Com as áreas de proteção ambiental, restinga, mangues, dunas, entradas de rios são locais que vivem sob a influência da maré e tem ligação direta com o aumento do nível do mar. E afinal de contas, nós vivemos em uma época bastante complexa, relacionada ao meio ambiente, aos efeitos climáticos. Então, há uma preocupação, creio que bastante legítima com relação ao meio ambiente, mesmo.


4. De que forma a PEC 3/2022 se relaciona com os princípios de proteção ambiental e desenvolvimento sustentável do litoral brasileiro?


Acho que a PEC está profundamente associada ao princípio da precaução. Não se sabe exatamente quais serão os efeitos práticos da proposta e há um risco ao meio ambiente, o princípio da precaução determina que a medida não seja feita quando você não tem certeza sobre o não impacto ambiental, esse princípio ele é muito forte, ele acaba retraindo a medida para que se pesquise mais pra que se debata mais. E essa falta de debate também tem impactado nas discussões a respeito do tema.


5. Como a senhora avalia o processo de discussão da PEC 3/2022 no Congresso Nacional? Houve transparência e participação social suficientes?


Acho que uma proposta de tamanha repercussão pública, até por que nós temos uma faixa litorânea bastante vasta no país, precisaria de um debate mais amplo. Foi realizada uma audiência pública no final de maio, mas não se deu a devida divulgação, publicação, para que os órgãos envolvidos pudessem participar. Além disso, no site do Senado foi aberta uma participação pública de opinião sobre a matéria e apenas 2 mil pessoas até o momento foram favoráveis à medida num universo de 155 mil ou mais brasileiros que disseram que não são favoráveis à proposta. Eu creio que nos moldes em que ela se encontra ela não vai prosperar, ela vai passar por mudanças. Não creio que haja nenhuma aprovação rápida sobre a proposta já que ela entrou na pauta do brasileiro que está cobrando, não privatizem a praia, não privatizem o acesso à praia, e tudo mais. Então, eu creio que ela não seja aprovada nos termos em que está circulando no processo legislativo brasileiro.

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