Proteínas recombinantes BMP-7 e PDGF-BB foram utilizadas pela primeira vez como terapia contra a osteoporose em modelos animais, que tiveram fortalecimento da estrutura óssea deficiente
Doença afeta cerca de 200 milhões de pessoas no mundo, com maior prevalência em mulheres após a menopausa e idosos – Ilustração: storyset / Freepik
Uma equipe de pesquisadores do Instituto de Química (IQ) da USP, da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP) e de outras instituições testou, pela primeira vez, a eficácia de um tratamento combinado de duas proteínas recombinantes contra a osteoporose em um modelo animal. O tratamento com as proteínas BMP-7 e PDGF-BB foi feito em ratas que tiveram os ovários retirados e desenvolveram obesidade e osteoporose. Os resultados do estudo demonstraram aumentos significativos no volume e densidade ósseos das ratas, o que indica uma reversão parcial no quadro da osteoporose. A descoberta pode ser a chave para novas opções terapêuticas contra a degeneração óssea – o que ainda precisará ser comprovado em estudos clínicos futuros.
A osteoporose é uma doença que afeta aproximadamente 200 milhões de pessoas no mundo, com maior prevalência em mulheres após a menopausa e idosos. É caracterizada pela perda de massa e degeneração do tecido ósseo, o que pode levar a um maior risco de fraturas e, consequentemente, maior morbidade e mortalidade nesta população. Por conta disso, a exploração de novas opções de tratamento é necessária para garantir maior qualidade de vida e longevidade aos indivíduos acometidos pela condição.
Hoje, as terapias disponíveis no mercado são divididas em duas categorias: medicamentos antirreabsorção óssea e drogas anabólicas, que estimulam a formação de ossos. Em um tecido ósseo saudável, há um equilíbrio entre os processos de destruição e reconstrução óssea, que garantem a absorção de compostos importantes para o organismo, como o cálcio, e também a substituição de estruturas velhas por outras mais novas. Nas pessoas com osteoporose, no entanto, o desequilíbrio entre estas duas atividades faz com que mais tecido seja degradado – ou reabsorvido – e as células não consigam repor esta massa óssea na mesma proporção.
Neste contexto, as drogas antirreabsorção agem no sentido de evitar que o tecido seja naturalmente destruído – o que não resolve o problema da reposição, no entanto. Já as terapias que estimulam a formação dos ossos, por sua vez, são efetivamente capazes de reverter o quadro de osteoporose. Os medicamentos já comercializados deste tipo, porém, costumam provocar muitos efeitos adversos nos pacientes – sendo os mais importantes o aumento do risco de doenças cardiovasculares, problemas gastrointestinais e reduções do volume ósseo após a descontinuação do seu uso.
O tratamento com BMP-7 e PDGF-BB, que também atuam na formação de massa óssea, mostrou-se uma potencial alternativa às drogas comerciais atuais.
Proteínas combinadas
A BMP-7 e o PDGF-BB pertencem a uma classe de moléculas chamada de Peptide Growth Factors (do inglês Fatores Peptídicos de Crescimento), que desempenham papéis importantes no desenvolvimento de embriões e na regeneração e formação dos ossos. A família das BMPs (Bone Morphogenetic Proteins) é responsável pela regulação e equilíbrio no tecido ósseo, além do reparo de cartilagens, desenvolvimento embrionário, proliferação e diferenciação celular, entre outras funções conhecidas. No caso específico da BMP-7, sabe-se que ela induz a diferenciação de células-tronco em linhagens celulares que dão origem aos ossos (osteócitos). Já a família de PDGFs (Platelet-Derived Growth Factors) exerce uma função de sinalização química nos tecidos, com importante papel na sua cicatrização. O PDGF-BB, em particular, desempenha um papel crucial no reparo da pele e de outros tecidos moles, além de fraturas ósseas, pois regula quais células e moléculas devem ser recrutadas para restaurar o tecido danificado.
Devido a essas propriedades conhecidas e bem-descritas na literatura, as duas proteínas foram escolhidas para o estudo publicado na revista científica Biomolecules. Segundo Mari Cleide Sogayar, professora sênior do IQ e autora correspondente do artigo, “essas proteínas atuam ao nível de seus receptores, que ficam na membrana das células. Assim, quando elas se ligam ao seu receptor, isso desencadeia uma cascata de sinalização até o núcleo, onde irá ocorrer a transcrição gênica”. Em outras palavras, essa cascata representa uma sequência de reações bioquímicas que indicam para a célula o que ela deve fazer; neste caso, produzir novos ossos.
Após a escolha e síntese dessas duas proteínas recombinantes, chamadas genericamente de biofármacos, os pesquisadores induziram artificialmente a osteoporose em ratas, através da remoção de seus ovários. Em seguida, foram desenhados diferentes protocolos de administração das proteínas. O ensaio contou com a aplicação conjunta e individual das duas moléculas em diferentes doses e intervalos de tempo. Ao final, descobriu-se que o tratamento conjunto de BMP-7 e PDGF-BB aumentou efetivamente o volume e a densidade óssea neste modelo animal.
Pesquisa em biofármacos
O laboratório da professora Mari Cleide Sogayar, sediado atualmente na FMUSP, é um dos poucos no Brasil que se dedica à produção e pesquisa em biofármacos – isto é, proteínas recombinantes sintetizadas artificialmente em culturas de células, com propriedades biológicas e aplicações terapêuticas. Segundo ela, essa área ainda é pouco explorada no País, mas também muito importante no contexto nacional. “Aqui, nós produzimos moléculas para tratamento da hemofilia, hormônios utilizados em reprodução assistida e até biofármacos para controle da diabetes”, diz.
O grupo faz pesquisa com eles, mas também parcerias com empresas para o desenvolvimento de produtos comerciais e obtenção de patentes, visando à medicina regenerativa. Para os pesquisadores, os biofármacos representam uma revolução em termos de ciência e saúde, e merecem maior atenção por parte da população e também das autoridades nacionais.
O artigo Recombinant Human Peptide Growth Factors, Bone Morphogenetic Protein-7 (rhBMP7), and Platelet-Derived Growth Factor-BB (rhPDGF-BB) for Osteoporosis Treatment in an Oophorectomized Rat Model está disponível neste link.
Mais informações: mcsogayar@gmail.com; mcsoga@iq.usp.br, com Mari Cleide Sogayar.
*Por Bruna Larotonda, da Assessoria de Comunicação do IQ. Adaptado para o Jornal da USP
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