Parceria público-privada para inglês ver - Blog A CRÍTICA
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terça-feira, 15 de abril de 2025

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Parceria público-privada para inglês ver

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Ao que tudo indica, os ares tropicais de Caicó têm inspirado engenhosidades contratuais dignas da fina astúcia oitocentista. Desde 2022, a Prefeitura firmou com notável constância uma parceria com empresas privadas para a realização dos festejos de Sant’Ana — a santa, aliás, talvez não soubesse que também se faz milagre com a lei 14.133/2021 nas mãos certas.


O modelo é de uma beleza lógica encantadora: a empresa contratada recebe a honrosa missão de explorar o espaço público da Ilha de Santana, arrecadar patrocínios e montar a estrutura do evento. Em troca, entrega à população acesso gratuito aos espaços comuns da festa — os outros, bem, são VIP.


No papel, soa como uma dessas parcerias público-privadas que enfeitam relatórios de governos progressistas: a empresa entra com o capital, o know-how e o risco; o poder público, com a caneta. A cereja do bolo, porém, escapa por entre as linhas contratuais: o principal patrocinador do evento é... a própria Prefeitura. Sim, leitor. A gestão municipal patrocina, banca, sustenta — ainda que indiretamente — o show.


Seria esse um novo gênero de contrato? Uma concessão pública que se autoconcede a si mesma o papel de mecenas? Não sejamos severos. Talvez seja apenas o caso de uma administração zelosa que, não querendo gastar diretamente, transfere os recursos públicos por vias privadas, com a elegância de quem não quer ser notado.


E para que não reste dúvida, o valor do contrato com a empresa organizadora da Festa de Santana 2025 é modesto — apenas R$ 1.495.000,00. Afinal, tradição não tem preço; tem empenho.


Aliás, por falar em empenho, o contrato exige que a empresa monte palco, camarotes, banheiros químicos, contrate "artistas" (de "nível" nacional, regional e local, tudo no mesmo dia e só vem lixo da moda), providencie som e iluminação “de grande porte” — e, por gentileza, que traga sua própria tomada. A energia não está inclusa no pacote celestial.


O povo, é claro, é convidado de honra. Desde que permaneça nos espaços comuns e não ultrapasse os limites da Área VIP ou do Front Stage, aquelas porções exclusivas do paraíso onde se ouve melhor e se paga mais.


No fim, a chamada "parceria" revela-se como o que realmente é: uma transação adornada de palavras bonitas, cuja função maior talvez seja a de apaziguar consciências e distrair olhares mais atentos. Como diria um certo conselheiro, "ao vencedor, as batatas"; ao contribuinte, o camarote gratuito — de longe.


E assim seguimos, entre tendas e trios elétricos, com contratos que se dizem modernos, mas que guardam o velho espírito do "para inglês ver". Porque, afinal, em Caicó, até a Festa de Santana parece obedecer ao espírito dos bons contos: os fatos são reais, mas a moral da história, essa precisa ser interpretada com olhos de quem lê entre as cláusulas.


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