Sermão do Peixe Político - Blog A CRÍTICA

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sexta-feira, 18 de abril de 2025

Sermão do Peixe Político

 

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Pregado não em púlpito de igreja, mas no altar da consciência pública, neste Brasil de muitos Judas e poucos Cristos.


Meus irmãos,


«Vinde após mim, e eu vos farei pescadores de homens», disse Cristo aos apóstolos. E, ouvindo isso, os homens de boa-fé lançaram suas redes para almas. Mas os políticos de má-fé, sobretudo aqueles vestidos de autoridade municipal, entenderam outra coisa: "fazei-vos distribuidores de peixes, e ganhareis votos entre os pobres."

E assim, irmãos, chegamos mais uma vez à Semana Santa. Semana de dor, de silêncio, de paixão. Mas também semana em que o peixe se multiplica não por milagre de Cristo, mas por interesse de César. Veem-se, por todo este vasto Brasil, prefeitos vestidos não de púrpura, mas de marketing, entregando pacotes de tilápia como se fossem a salvação do povo — quando, na verdade, são apenas a isca.

Oh, peixe abençoado, símbolo dos primeiros cristãos! Tu foste sinal de fé no tempo das catacumbas, alimento de humildes na ceia do jejum, milagre nas mãos do Salvador. Mas agora, que te tornaste moeda de troca nas mãos dos que se dizem servidores do povo, não sei se és mais símbolo de piedade ou de propaganda.

Dizei-me, irmãos: é caridade ou é campanha? É compaixão ou conveniência?

O prefeito que não provê escolas decentes, nem postos de saúde com remédios, nem estradas sem buracos, mas na Semana Santa aparece com caminhões de peixe e fotógrafo a tiracolo — esse não é discípulo de Cristo, é discípulo de Pilatos. Lava as mãos do ano inteiro com a água da demagogia, oferecendo ao povo o peixe que ele mesmo famélico pescou com o anzol do descaso.

E o povo, coitado, que muitas vezes é mais cordeiro do que cidadão, aceita o peixe e esquece a cruz que carrega todos os outros dias do ano.

Mas eu vos digo: quem dá o peixe no tempo da Paixão, para esconder os pecados da má gestão, não é cristão, é fariseu. Não lava os pés dos pobres, mas pisa sobre eles com as sandálias da astúcia eleitoral.

Cristo multiplicou os peixes para saciar a fome do corpo e da alma. Já os políticos multiplicam os peixes para saciar a fome de poder. Cristo curava os leprosos. Esses apenas colam adesivos.

Ai de vós, prefeitos do Brasil, que distribuís peixe na Semana Santa e promessas o ano inteiro! Melhor seria que, em vez de peixe, désseis dignidade; em vez de cesta, désseis justiça; em vez de discursos, désseis verdade!

Pois vos digo: mais vale um peixe pescado com o suor de um povo livre do que mil tilápias jogadas por mãos cínicas à multidão domesticada.

Convertei-vos, ó políticos, antes que vosso mandato seja vosso juízo! Lembrai-vos de que não é o povo quem vos julgará por fim, mas o Deus dos humildes e dos pequenos. E Ele não se deixa enganar por caridade que cheira a marketing.

Em nome do Pai, que vê o íntimo dos corações; do Filho, que entregou-se sem segundas intenções; e do Espírito Santo, que sopra onde quer, até sobre os palanques — se for preciso.

Amém.

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