A Safadeza das Emendas - Blog A CRÍTICA

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segunda-feira, 14 de julho de 2025

A Safadeza das Emendas



Não é de hoje que a música dança conforme a verba, e que o artista, mais do que cantar, se põe a bajular. Mas em tempos modernos, quando até o silêncio parece barulhento e a honra se mede em cifras, é preciso dizer com alguma pena e certo sarcasmo: que bonito está o nosso palco político!


Conta-se que a ilustríssima Prefeita de Aracaju — mulher de grandes afazeres e pequena parcimônia — prometeu, com aquele zelo que só os olhos voltados ao voto sabem ter, destinar respeitável emenda parlamentar para trazer à sua cidade o senhor Wesley Safadão. Não confunda o leitor o nome com um juízo de valor; o apelido é arte do próprio, que o ostenta com orgulho e talvez até com certo sentido de missão.


Mas a história, que nunca se cansa de repetir seus farsantes, nos leva também a Maceió. Lá, o mesmo Safadão, em momento de elevado civismo (ou baixa conveniência), subiu ao palco para brindar o público com sua voz — e, de quebra, com loas ao prefeito João Henrique Caldas, a quem tratou como “governador”, talvez por lapso geográfico ou excesso de entusiasmo. Foi um ato de gratidão ou propaganda eleitoral antecipada? Fica ao leitor o exercício da dúvida.


Já em Mossoró, quem deu o ar de sua graça foi outro trovador do mesmo compasso: Xand Avião. Também ele, com voz desafinada e discurso mais ainda, não perdeu a chance de enaltecer o gestor local, senhor Allyson Bezerra, durante festança paga com o erário. O Ministério Público, por sua vez, que não sabe cantar nem dançar, abriu investigação. Há sempre quem queira estragar a festa.


Mas não se culpe apenas os cantores — esses modernos bardos do poder. A culpa, como sempre, é coletiva. A tal “lambada cearense”, que ora se disfarça de forró, ora se pinta de eletrônico, traz desde o berço uma inclinação para o palanque. Seu ritmo é político, sua cadência é eleitoral. De microfone em punho, seus intérpretes distribuem alôs como quem distribui cargos, transformando a praça pública em extensão do gabinete.


Chamam isso de "cultura", e talvez o seja — mas cultura de uma época em que tudo se vende, até o que deveria ser gratuito: a arte, o afeto, o bom senso. Entre o som e o suborno, o que vemos é o casamento profano entre a música e a máquina pública, selado sob aplausos, fogos e votos.


Ah, Brasil! País onde o jabá virou método de governo, e a emenda — em vez de consertar — apenas rasga de novo a moral pública.


Termino, leitor, não com um ponto final, mas com uma pausa dramática. Porque neste teatro, o espetáculo continua. E os artistas, bem pagos, jamais desafinam — ao menos diante dos prefeitos.



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