Em tempos nos quais a moralidade pública parece exilada do foro das consciências, e os sofismas da demagogia se insinuam nas entranhas da República como vermes da razão, é dever de quem escreve com responsabilidade cívica depor o verbo em defesa da verdade e do direito.
Que não se iludam os que hoje pretendem inscrever o nome de Jair Bolsonaro nos fastos da democracia, como se mártir fosse de uma causa que jamais professou. A posteridade, se justa for, não há de esquecer que este mesmo homem, ora acautelado em prisão domiciliar por decisão da mais alta corte do país, ganhou notoriedade na década de 1990 não como tribuno da liberdade, mas como apologista da força bruta; não como defensor do Estado de Direito, mas como panegirista do arbítrio e da tortura; não como patriota, mas como reincidente em afrontar os fundamentos basilares da República.
E o que dizer de seu rebento, o deputado Eduardo Bolsonaro, que, no estertor do escândalo, teve o desplante de tachar o Ministro Alexandre de Moraes — magistrado, jurista e servidor público de ilibada trajetória — de violador de direitos humanos? Que irônico destino esse, que faz os apóstolos do autoritarismo invocarem, em seu próprio socorro, os mesmos princípios que tantas vezes ultrajaram!
Mas aqui reside a grandeza da democracia constitucional: quanto mais severa — e justa — for a resposta do Estado de Direito contra os que o conspiraram, mais democrática se torna a nação. Porque não há democracia verdadeira que se deixe corromper pelo culto da impunidade. A liberdade não consiste em permitir que seus algozes atentem impunemente contra ela; consiste, antes, em dotar a República dos meios legais para preservar-se.
Alexandre de Moraes, com a pena firme e a compostura dos que sabem que o Direito não se curva ao clamor das massas nem à chantagem dos fardos ideológicos, logrou ensinar ao país — e aos próprios conspiradores — o verdadeiro sentido de justiça. Foi, por assim dizer, o Cicerón do nosso tempo, que, sem espadas nem tanques, sem forças armadas sob seu comando nem cofres sob sua tutela, resguardou a Constituição com a austera solenidade dos que fazem do Direito o verdadeiro sangue da República.
Por isso mesmo é que o Judiciário não pode ser eleito. O voto, quando desacompanhado da norma estável, degenera em tirania. Não há liberdade onde a paixão coletiva substitui a letra fria e prudente da lei. Os demagogos manipulam a vontade popular; o juiz, este deve ater-se ao que é, e não ao que convém.
Tenho escrito e reiterado — inclusive nas páginas de minha obra A Constituição Dialética da Democracia — que a estabilidade institucional repousa, não sobre o clamor das urnas, mas sobre a serenidade das leis. Pois o povo, que é soberano, também é volúvel. E é exatamente por isso que os limites do poder devem estar depositados nas mãos de quem não disputa aplausos, mas interpreta princípios.
Ao fim, Bolsonaro e seus filhos aprenderam, ainda que tarde, que os direitos humanos não são artifícios de ocasião, mas o cimento da civilização. E se agora os invocam, que o façam. Mas não se enganem: não é pelo seu brado que eles se tornam verdadeiros. É pelo Estado de Direito — esse mesmo que Alexandre de Moraes soube honrar — que tais direitos existem.


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