"Influenciadores" — um estudo ao rés-do-chão - Blog A CRÍTICA

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sexta-feira, 15 de agosto de 2025

"Influenciadores" — um estudo ao rés-do-chão



Todos aspiram, de um modo ou de outro, a ser influentes. É doença antiga, que remonta aos tempos em que a pólis grega reunia seus oradores na praça, e o romano se acotovelava nas escadarias do Fórum. Os políticos, por acumularem o remédio e o veneno do poder, recebem de bom grado o ódio popular — e, ouso dizer, este ódio não nasce só do que eles fazem, mas do que nós, em silêncio, gostaríamos de fazer no lugar deles.


Vieram depois as celebridades — primeiro do teatro, depois do cinema, por fim da televisão — que emprestavam à influência um certo verniz artístico. Os intelectuais, esses pobres-diabos de biblioteca, aceitavam a sina inversa: gastar a vida diante de livros para receber, na melhor das hipóteses, um pálido reconhecimento póstumo. Enquanto vivos, saboreavam a glória de passar fome; mortos, eram servidos no banquete da posteridade.


Mas a internet, esse vasto palco onde cada um é ator e plateia de si mesmo, trouxe uma revolução das mais curiosas: a influência deixou de escorrer de cima para baixo — dos cimos da política, da arte ou do pensamento — para borbulhar, sem cerimônia, do rés-do-chão. Agora, para se tornar “influenciador”, basta, se for senhora, possuir um talhe avantajado de busto; se cavalheiro, uma feiura rara, dessas que fariam o esculpido Quasímodo sentir inveja. Depois, é só temperar a figura com trivialidades verbais, preferindo-se aquelas que promovem um certo jogo eletrônico de felinos e apostas, a que chamam, com ternura, “tigrinho”.


Já pensou, leitor amigo, na estranheza deste título? Influenciador! E sem jamais ter aberto um livro, nem por descuido. Que influência é essa que se exerce sem se ter, antes, bebido um gole que fosse da água limpa da inteligência? Influência de quê? Talvez de nada — ou de tudo aquilo que, sendo nada, se disfarça bem de alguma coisa.


E assim caminha o mundo: os antigos matavam-se pelo poder da espada ou da palavra; hoje, basta o poder do engajamento. A tragédia é que, ao contrário da biblioteca, a tela não guarda memória. O que se diz pela manhã já é esquecido à tarde, mas enquanto dura, é influência — má ou péssima, mas influência.


E aqui me calo, não por falta de assunto, mas por medo de, sem querer, acabar influenciando.

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