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quinta-feira, 5 de dezembro de 2013

Os responsáveis das crises europeias estão no Norte, não no Sul

A persistência da crise financeira e econômica europeia deve-se mais ao comportamento dos governos dos países centrais e nórdicos da Europa do que ao dos países periféricos. Dentro das coordenadas de poder na Eurozona, é impossível os países periféricos, como Espanha, saírem da crise.
Os países do Sul da Europa (Grécia, Portugal e Espanha) estão numa situação desesperada, como refletem as suas elevadas taxas de desemprego. E as previsões para que isso melhore não são animadoras. Segundo a Comissão Europeia, o desemprego continuará muito alto durante a próxima década, o que quer dizer que se queimarão várias gerações.
Acontece igualmente quando vemos, em vez do nível de desemprego, o nível salarial. Os salários foram baixando cada vez mais – como parte do que se chama a desvalorização interna – a fim de embaratecer as exportações que, dizem-nos, nos tirarão do buraco, coisa que é obviamente falsa. Na realidade, tal como está estruturada a Zona Euro, é impossível que os países do Sul possam competir com os países do Norte. Vejamos os dados.
Comecemos pela Alemanha. A economia deste país baseia-se numa enorme desvalorização interna (conseguida à custa de, aproximadamente, uma quarta parte da sua força laboral se encontrar em condições de grande precariedade) a fim de conseguir estimular a economia à base de exportações. Isso determina um superavit anual na sua balança por conta corrente (current-account surplus) de nada menos que 125.500 milhões de euros ao ano (média anual, desde que se estabeleceu o euro, em 1999).
É o segundo país em superavit depois da China (algo mais do que 162.000 milhões por ano). Como bem escreve Kemal Dervis no seu artigo “Northern Europe’s Drag on the World Economy” (do qual extraio a maioria dos dados deste artigo), é surpreendente que, enquanto a China está sob uma enorme pressão para que reduza tal superavit, a Alemanha fique tranquila, sem que sofra ameaças de sanções como as que sofre a China.
Nestas circunstâncias, é muito difícil que estes países possam sair da crise à base de exportações, ganhando em competitividade à Alemanha, pois os poderes destes países querem ganhar em competitividade mediante a baixa de salários (que está deprimindo cada vez mais a procura interna).
Mas a situação é, contudo, pior. Não é só a Alemanha que tem um superavit anual na sua balança por conta corrente, mas todos os países do Norte (Suécia, Dinamarca, Noruega e Suíça, que não têm o euro, mas definem o valor da sua moeda em relação ao euro), bem como a Áustria e a Holanda dentro da Zona Euro.
Isso implica que o superavit desta Europa do Norte (cuja moeda, direta ou indiretamente, é o euro) é nada menos do que uns 406.000 milhões de euros (este ano, o da China será de 111.000 milhões), o que é um valor enorme e explica, entre outras razões, a enorme força do euro, a qual prejudica enormemente os países do Sul, pois dificulta as suas exportações.
Perante este panorama tão sombrio só há duas soluções. Ou sair do euro (uma possibilidade que se deveria considerar), ou fazer com que a procura interna dos países do Norte cresça à base do aumento dos salários dos trabalhadores do Norte. Nunca se tinha visto, de maneira tão clara, os interesses dos trabalhadores do Sul e do Norte coincidirem tanto. Mas o facto de esta alternativa não estar a ser considerada deve-se ao grande domínio que o capital financeiro (que beneficia do euro forte) e o industrial (que se centra nas exportações) têm em todos aqueles países e na estrutura de governo do euro.
Daí que a aliança das classes trabalhadoras, a nível europeu, representaria uma grande ameaça aos interesses destes poderes, o que explica o seu apoio a teses racistas e chauvinistas (leia-se, a imprensa alemã e nórdica), que tentam evitar esta aliança, apresentando os trabalhadores alemães, por exemplo, como sujeitos de interesses opostos aos operários espanhóis, gregos e portugueses. Assim, claro!

Tradução: António José André - ESQUERDA.NET

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