Projeto de Lei 827/20 proíbe o despejo ou a desocupação de imóveis até o fim de 2021, além de estipular que as ordens de despejo ou liminares proferidas antes do período de calamidade pública decretado no ano passado não poderão ser efetivadas neste ano
Não poder contar com um teto para abrigar a família é um pesadelo real durante o momento atual de crise econômica e sanitária no Brasil. Segundo levantamento da organização Campanha Despejo Zero, mais de 84 mil famílias estão ameaçadas de remoção durante a pandemia. O número de brasileiros em situação de extrema pobreza chegou a 14 milhões e alcançou a maior marca desde dezembro de 2014, de acordo com dados do Cadastro Único em outubro de 2020. Esses são alguns dos cenários que embasam um projeto de lei aprovado pelo Congresso Nacional que aguarda sanção presidencial.
“Moro nesse lugar há dois anos, era para o proprietário aumentar o aluguel, mas ele viu toda a minha dificuldade”, diz. Após a sanção do PL aprovado, caso Monica não tenha condições de pagar o aluguel e demonstre a mudança da situação financeira e a incapacidade do pagamento, ela não poderá receber uma ordem de despejo. Essa proibição será aplicada a contratos cujo valor mensal de aluguel seja de até R$ 600 para imóveis residenciais e de até R$ 1,2 mil para imóveis não residenciais.
Direito em si e intermediário
Para o sociólogo Raphael Sebba, projetos como esse, neste momento, levantam reflexões sobre o lar durante uma pandemia. “A moradia representa um direito em si, todo mundo tem direito a ter um lar, tem um local para estar. Mas a moradia é também um direito intermediário. É difícil você pensar uma pessoa ter acesso integral ao direito à saúde se ela não tem uma casa onde ela possa desenvolver suas atividades cotidianas, se higienizar, estar protegida do frio, estar protegida do calor”, ressalta.
“Com as consequências econômicas da paralisação das atividades e dos efeitos da pandemia, muita gente viu seu poder aquisitivo ser reduzido, não teve condições de continuar pagando o aluguel e passou a morar de forma ‘improvisada’. Nesse cenário, radicalizar esse processo de fragilidade do direito à moradia, aprofundar o déficit habitacional a partir da ação do poder público, é um contrassenso. Porque você aprofunda o quadro problemático do ponto de vista social e também do ponto de vista sanitário, lembrando que a condição de ter uma moradia é indispensável para você poder até estar em isolamento, ao menos parcialmente”, avalia.
Para o especialista, qualquer despejo só deveria acontecer com a garantia do direcionamento adequado das famílias que estão sendo despejadas, pois, mesmo sem uma pandemia, o direito à moradia é constitucional. “Deixar as pessoas sem casa já é de uma crueldade, de uma brutalidade sem tamanho, mas, neste contexto sanitário, beira a empurrar as pessoas para uma situação de mortalidade, literalmente. Então, é muito importante que o PL seja, de fato, sancionado e que passe a ser implementado o quanto antes”.
Detalhes do texto
O Projeto de Lei 827/20 foi concluído na Câmara dos Deputados em julho, após votação de emenda do Senado Federal que exclui os imóveis rurais da proibição. Apesar do parecer contrário do relator, o deputado Camilo Capiberibe (PSB-AP), a emenda foi aprovada. A proposta contra o despejo ou a desocupação de imóveis é de autoria dos deputados André Janones (Avante-MG), Natália Bonavides (PT-RN) e Professora Rosa Neide (PT-MT).
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