No primeiro trimestre do ano a média da renda domiciliar do trabalho bateu novo recorde negativo, ficando em RS1.405,73
Após cinco trimestres consecutivos de crescimento, a média da renda domiciliar per capita do trabalho dos 40% mais pobres no conjunto das metrópoles brasileiras caiu no 1º trimestre de 2022, chegando a R$240,79 per capita. Entre o último trimestre anterior à pandemia (1º trimestre de 2020) e o 3º trimestre de 2020, a renda do estrato mais pobres de nossas metrópoles sofreu uma brusca queda de 31,9%, chegando ao menor valor da série histórica: R$183,61. Desde então, o que vínhamos assistindo ao longo dos últimos cinco trimestres era a um lento processo de recuperação, fazendo a renda média daquela parcela da população alcançar o valor de R$245,55 no último trimestre de 2021 – uma cifra ainda 8,9% menor do que aquela encontrada no período anterior à pandemia. Entre o final de 2021 e o início de 2022, no entanto, aquela trajetória de recuperação foi interrompida, e a renda dos mais pobres caiu 4,7%, sendo reduzida para o valor de R$240,79 no primeiro trimestre de 2022.
As informações estão na oitava edição do “Boletim – Desigualdade nas Metrópoles”, produzido em parceria pela PUCRS (Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul), o Observatório das Metrópoles e a Rede de Observatórios da Dívida Social na América Latina (RedODSAL). Os dados são provenientes da PNAD Contínua trimestral, do IBGE, e dizem respeito à renda domiciliar per capita do trabalho, incluindo o setor informal. O recorte utilizado é o das 22 principais áreas metropolitanas do país, de acordo com as definições do IBGE. Todos os dados estão deflacionados para o primeiro trimestre de 2022, de acordo com o IPCA.
A média geral de rendimentos para todos os estratos também seguiu comportamento de queda, alcançando no 1º trimestre de 2022, pelo segundo trimestre consecutivo, o pior nível de toda a série histórica iniciada em 2012, com o valor de R$ 1.405,73 - no quarto trimestre de 2021 essa média era de R$1414,07. Quando comparamos com a situação no último trimestre antes da pandemia (1º trimestre de 2020), momento em que a renda média nas metrópoles era de R$1575,51, a redução foi de 10,7%. Desde o início da pandemia, já são oito trimestres de renda média, atingindo os menores valores de toda a série histórica nas metrópoles brasileiras.
De acordo com Andre Salata, professor da Escola de Humanidades da PUCRS e um dos coordenadores do estudo, a inflação verificada ao longo dos últimos meses é um dos principais fatores que explicam essa situação: “quando fazemos os mesmos cálculos desconsiderando a inflação, o que verificamos é inclusive um aumento de 1,98% da renda média geral e, também, da renda média dos mais pobres no último trimestre (em 0,58%). Ou seja, em um cenário hipotético de inflação zerada, o poder de compra da população como um todo, incluindo os mais pobres, estaria aumentando.”. Salata também destaca a debilidade da recuperação do mercado de trabalho como um fator relevante: “depois de alguns trimestres seguidos de queda na taxa de desocupação, ela ficou praticamente estável em 15,4% entre o final de 2021 e o início de 2022. Além disso, a retomada da economia tem se dado, em grande medida, com base em empregos de baixa qualidade e remuneração”, explica.
Uma grave consequência do quadro pintado por aquelas cifras é que no 1º trimestre de 2022, após cinco trimestres de queda, voltou a aumentar o percentual de moradores do conjunto das metrópoles que viviam em domicílios cuja renda média per capita do trabalho era de até ¼ do salário-mínimo, chegando a 25,2%. Em termos absolutos, no 1º trimestre de 2022 o número de moradores com rendimento de até ¼ do salário-mínimo correspondia a 21,1 milhões de pessoas.
E o mesmo crescimento foi registrado também para a taxa de crianças de até 5 anos de idade que viviam em lares com rendimentos do trabalho inferiores a ¼ do salário-mínimo per capita nas metrópoles brasileiras. Essa taxa alcançou 29,2% da população de crianças, patamar próximo ao registrado no auge da pandemia: 32,2%. Em termos absolutos, no 1º trimestre de 2022 havia 1,8 milhões de crianças nessa situação, o que é um número maior que o da população total de Regiões Metropolitanas como Natal, João Pessoa, Maceió ou Florianópolis, entre outras.
De acordo com Marcelo Ribeiro, também coordenador do Boletim Desigualdade nas Metrópoles e professor do IPPUR/UFRJ, “o aumento da proporção de famílias com rendimento per capita do trabalho de até ¼ do salário-mínimo explicita o drama social existente nas metrópoles brasileiras, tendo em vista que a renda do trabalho se constitui com a principal fonte de rendimento familiar, indício muito forte da elevação da situação de pobreza. Essa situação de pobreza, ao atingir quase 30% das crianças de até 5 anos de idade, compromete o desenvolvido humano e cognitivo da nova geração de cidadãos na nossa sociedade”.
O Boletim também apresenta os resultados da desigualdade de renda mensurada pelo coeficiente de Gini. No 1º trimestre de 2022, o coeficiente de Gini do conjunto das metrópoles brasileiras foi de 0,595, comportamento de redução desde o 4º trimestre de 2020. De acordo também com Marcelo Ribeiro, “essa redução do Gini, que expressa diminuição das desigualdades de renda em toda a população, se deu pela redução dos rendimentos de todos os estratos de rendimento, sendo que os estratos de maior renda (os 10% do topo da distribuição), reduziu proporcionalmente mais do que os estratos de menor renda (os 40% da base da distribuição). Uma redução das desigualdades onde todos perdem não pode ser comemorada como aumento da equidade social”.
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