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Raquel Bartholo*
O direito à não discriminação no trabalho é direito fundamental de todas trabalhadoras e trabalhadores. Na legislação nacional, a Lei 9.029/1995 veda a adoção de qualquer prática discriminatória e limitativa para efeito de acesso ou permanência no emprego, por motivo de sexo, origem, raça, cor, idade ou qualquer outro critério de discriminação negativa. A Consolidação das Leis do Trabalho, igualmente, veda recusar emprego, promoção ou motivar a dispensa do trabalho por esses motivos.
E um caso recente, julgado pela 3ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho, ilustra bem a aplicação deste direito para os trabalhadores brasileiros. O TST reconheceu a nulidade da dispensa de um eletricitário da Companhia Estadual de Distribuição de Energia Elétrica (CEEE-D), que adotou critério considerado discriminatório na sua política de desligamento de empregados. De acordo com os magistrados, a demissão, fundamentada na elegibilidade para a aposentadoria, se baseou de maneira indireta na idade do empregado, o que configura ato ilícito de caráter discriminatório.
No caso, o empregado ingressou na Justiça e afirmou que, em 2015, a imprensa noticiou que a empresa passaria por “mudanças drásticas”, que incluía a dispensa de um grupo de 186 pessoas que estariam em condições de se aposentar pelas regras do INSS. As dispensas foram formalizadas em março de 2016. Ele sustentou a ilegalidade da sua demissão porque esse critério seria “indisfarçável discriminação pela idade”. Pleiteou a reparação por danos morais e o pagamento em dobro da remuneração devida de todo o período desde a data da sua demissão.
Já a empresa sustentou que a política de dispensa levou em consideração o menor impacto social da medida, uma vez que apenas foram desligados empregados que já tinham direito adquirido à aposentadoria e, portanto, já teriam garantida uma fonte de renda permanente. No Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS) a empresa teve seu argumento aceito. Isso porque os magistrados entenderam que o critério de dispensar apenas empregados aposentados ou com direito adquirido à aposentadoria era razoável e não constituía ato discriminatório em razão da idade. Segundo o colegiado, a empresa teria comprovado que outros empregados da mesma faixa etária do eletricitário, que não estavam aptos a se aposentar, permaneceram em atividade, o que afastaria o alegado aspecto discriminatório da dispensa.
Entretanto, a Corte Superior do Trabalho acolheu o recurso do trabalhador, por entender que o critério de dispensa constituiu discriminação em razão da idade. O TST, então, restabeleceu a sentença da 2ª Vara do Trabalho de Bagé (RS) para condenar a empresa ao pagamento de reparação por dano moral e indenização em dobro da remuneração devida até a data da sentença.
O direito à não discriminação é previsto como direito fundamental pelo art. 5º da Constituição Federal a todas as pessoas, mas também regula o texto constitucional especificamente o direito dos trabalhadores e trabalhadoras quando os protege contra a despedida arbitrária (art. 7º, I da CF), proíbe diferença salarial por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil (art. 7º, XXX da CF) e veda a discriminação no tocante a salário e critérios de admissão do trabalhador portador de deficiência (art. 7º, XXXI da CF).
Tais garantias também estão previstas nos Tratados e Convenções Internacionais ratificados pelo Brasil, a exemplo das Convenção 111 e 168 da OIT, que também visam a garantia de ambientes de trabalho justos e livres de discriminação.
As garantias previstas nas diversas normas, nacionais e internacionais, devem sempre ser interpretadas sistematicamente, atentando-se às discriminações estruturais que também regulam as relações sociais, de forma a prevenir e combater condutas discriminatórias tal qual a analisada pelo TST, que reconheceu a ilegalidade da adoção do critério da aposentadoria como forma de mascarar o objetivo patronal de demitir os empregados mais velhos.
*Raquel Bartholo é advogada do escritório Mauro Menezes & Advogados
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