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quarta-feira, 17 de janeiro de 2024

Por um limite máximo da taxa de juros no Brasil: condição essencial de seu desenvolvimento

Marcello Casal Jr/Agência Brasil/Arquivo


*Por Miguel Bruno

 

O projeto de Lei Complementar (PLP) 104/2022 é de vital importância e segue em tramitação à espera de ser aprovado com a máxima urgência, pois definirá o teto de cobrança das taxas de juros no Brasil. Segundo o próprio Banco Central do Brasil, 76 países já praticam algum limite máximo. Na França, por exemplo, o limite é de 4,9% ao ano. Caso alguma instituição financeira cobre um valor acima desse teto, haverá punições legais que podem levar à prisão por crime de usura. Aqui no país, mais de 60 milhões de famílias estão inadimplentes, o que levou o atual governo a criar o Desenrola Brasil, programa que possibilita a renegociação de dívidas e visa a estimular o consumo como uma das bases para o crescimento da economia.

 

Os juros elevados tornam o ambiente macroeconômico inadequado ao desenvolvimento social e econômico, pois encarece o crédito tanto para consumo quanto para o investimento produtivo, pois este não se confunde com aplicações financeiras. Nesse contexto, destacam-se as taxas de juros reais cobradas pelos bancos no rotativo dos cartões de crédito, pois são exorbitantes e levam às famílias, especialmente, as de baixa renda, ao superendividamento e, consequentemente, à inadimplência. Diante da crescente cobrança de juros compostos, isto é, juros que incidem sobre juros que já incidiram sobre o montante emprestado, o usuário de cartão de crédito pode realizar o pagamento mínimo, parcelar sua fatura ou até ficar inadimplente tendo que assumir encargos extremamente elevados face à capacidade de pagamento. Nessas três situações, o saldo devedor crescerá exponencialmente tornando a dívida impossível de ser quitada.
 

Um empresário só terá estímulo para destinar o dinheiro que dispõe à compra de máquinas e equipamentos que possam operar na indústria ou demais setores produtivos, aumentando a produção e a contratação de mais trabalhadores, se a taxa de lucro esperada for maior do que a taxa de juros que poderá ganhar (caso aplique em ativos financeiros) ou que terá que pagar (caso tenha que financiar o investimento produtivo).
 

Mas, se houver perspectiva de redução do PIB ou crescimento econômico lento e instável, algo frequente em economias de altas taxas de juros reais, os empresários e os consumidores que possuem mais recursos optam por colocar a maior parte do dinheiro no mercado bancário-financeiro, ao invés de investirem em empresas ou novos negócios.
 

O desenvolvimento social e econômico pressupõe que os setores da economia cresçam de maneira harmônica e compatível uns com os outros. A indústria de transformação é considerada a principal, pois os produtos são os de maior intensidade tecnológica e complexidade econômica. Destaca-se na produção de celulares, televisores, automóveis, eletrodomésticos, computadores, e necessita, para tanto, força de trabalho qualificada nos processos produtivos.
 

O Brasil está perdendo a indústria de transformação num ritmo muito acelerado. Como destacou o economista Ha Joon Chang, estudioso do desenvolvimento e professor em Cambridge na Inglaterra, o país é um dos casos de desindustrialização mais rápidos na história contemporânea. E esse processo tem entre as principais causas, as taxas reais de juros em níveis exorbitantes, que tornam o investimento na indústria demasiadamente arriscado e pouco rentável face aos ganhos financeiros e rentistas de curto prazo que são muito maiores, com alta liquidez e risco de crédito desprezível, sobretudo quando se referem aos juros da dívida pública interna brasileira.
 

Para o Brasil voltar a crescer de maneira sustentada, com maior competitividade internacional, geração de postos de trabalho de melhor qualidade e alcançar efetivamente o status de país desenvolvido, é preciso recuperar a base produtiva industrial de maior intensidade tecnológica e complexidade econômica. Sem ela, os ganhos de produtividade da economia brasileira permanecerão muito inferiores aos dos países já desenvolvidos e em desenvolvimento como a China atual. Não há dúvidas de que o limite na taxa de juros aumentará a geração de emprego, possibilitará que as pessoas tenham condições financeiras de pagar as despesas, investir em formação educacional e profissional e ter maior qualidade de vida.


 

*Miguel Bruno é professor de Ciências Econômicas da Faculdade Presbiteriana Mackenzie Rio.

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