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quinta-feira, 25 de abril de 2024

O assombroso poder das big techs na economia e na política dos países



Por Paulo Feldmann, professor da Faculdade de Economia, Administração, Contabilidade e Atuária (FEA) da USP - Jornal da USP


No começo de abril uma das maiores empresas de tecnologia do mundo, o Twitter, hoje denominado X, de propriedade do bilionário Elon Musk, ousou dizer que a Justiça Brasileira não cumpre as próprias leis do país.


Essa situação inusitada tem muito a ver com o poder desmesurado que as empresas de tecnologia, também chamadas de big tech, possuem no mundo de hoje. As principais delas, como Microsoft, Google, Twitter (hoje X), Amazon, Ali Baba, Meta (dona do Facebook, do Instagram e do WhatsApp), e Apple, tem um valor de mercado hoje próximo a US$ 10 trilhões, muito maior que o PIB de toda América Latina.


Segundo a professora Diane Coyle da Universidade de Cambridge, hoje há um amplo consenso de que os mercados digitais não estão mais funcionando segundo o interesse da sociedade, mas sim pelos interesses das próprias big techs. Cada uma destas megaempresas cresceu nos últimos anos de forma avassaladora, mas invariavelmente aniquilando seus competidores. Veja- se o caso do Google que detém praticamente o monopólio dos mecanismos de busca. Nem o poderoso Departamento de Justiça dos Estados Unidos conseguiu arranhar esse monopólio.


Os problemas acima são muito graves, mas não são os piores: hoje muitas big techs usam as enormes bases de dados que possuem de seus clientes para extrair informações em proveito próprio e vender mais produtos e serviços dentro de uma lógica de dominação total do mercado. Ou seja, essas empresas tomam decisões que afetam toda a sociedade sem consultar ninguém e sem estarem submetidas a qualquer tipo de governança. Para a professora de Harvard Shoshana Zuboff, o que estamos assistindo deveria passar a ser chamado de “Capitalismo de Vigilância”, ou seja, essas megaempresas usam os dados de seus consumidores e usuários para exercer o controle sobre os mesmos.


O professor francês Pierre Levi, da Universidade de Montreal, no Canada, teme que o poder dessas empresas já não seja mais apenas econômico. Segundo ele, o poder é político pois muitas funções sociais e de infraestrutura que deveriam estar na mão do estado hoje estão nas mãos das mesmas. O mais grave é que este poder transcende as fronteiras dos países e a própria geopolítica para se constituir em um poder sobre o planeta.


Este poder político que as big techs possuem é realmente inadmissível pois, além de tudo que falamos acima, elas também têm o poder de coibir ou não o que consideram fake news e com isso, muitas vezes, conseguem influir no resultado das eleições. Como se sabe, as fake news têm sido largamente usadas em vésperas de eleições para influenciar no resultado das mesmas. E não é apenas no Brasil que este é um problema muito sério.


Muitos países estão extremamente preocupados e começam a discutir legislações para tentar disciplinar a atuação das megaempresas. O Brasil é um deles. Mas é uma tarefa dificílima pois consiste em regular o espaço digital, algo que nunca foi sequer tentado e para o que a humanidade ainda não está preparada. Justamente aqui reside a principal vantagem competitiva das big techs, pois elas têm toda competência e habilidade para atuar nesse território imenso do espaço digital. É o caso da computação em nuvem. Todos nós, e principalmente todas as empresas, precisam armazenar seus dados nas nuvens. Mas esse mercado no mundo está concentrado na mão de quatro empresas apenas: Microsoft, Ali Baba, Google e Amazon.


Em qualquer setor da economia as empresas precisam respeitar as regras e as legislações dos países onde estão localizadas. No caso das big techs isso fica muito mais difícil pois elas é que definem em qual data center de qual país elas querem armazenar qual tipo de dado. Fazem isso sem pedir autorização para nenhum governo. Como dissemos acima, os governos não conseguem controlar o espaço digital.


Em boa hora o governo brasileiro decidiu cobrar impostos adicionais sobre essas megaempresas da mesma forma como já fazem diversos países europeus e asiáticos. Isto é necessário, mas não será suficiente. Urge implantar mecanismos que coíbam o crescimento do poder assombroso dessas empresas.

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