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terça-feira, 20 de agosto de 2024

A sanha arrecadatória oportunista e os corpos estranhos na reforma tributária



Enio De Biasi*

 

A Câmara dos Deputados aprovou, no último dia 13 de agosto, o Projeto de Lei Complementar (PLP) nº 108/2024 que, dentre outras disposições, instituiu o Comitê Gestor do Imposto sobre Bens e Serviços – CG-IBS – dispõe sobre a distribuição da arrecadação do IBS entre os entes federativos e sobre o Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer bens ou Direitos – ITCMD.
 

Importante ressaltar que foi a pedido dos Estados e do Distrito Federal, beneficiários (Sujeitos Ativos) da arrecadação do ITCMD, que o segundo projeto de regulamentação da Reforma Tributária promoveu importantes mudanças na sistemática de apuração do imposto.
 

Embora a Reforma Tributária trate, especificamente, dos tributos sobre o consumo – IBS e CBS – os Estados e o DF, ao vislumbrarem a possibilidade de aumentar as suas receitas, numa sanha arrecadatória, propuseram, na prática, um aumento da carga tributária sobre as heranças e doações. É um corpo estranho à Reforma Tributária, pois se trata de um imposto sobre o patrimônio e não sobre o consumo.
 

Dentre as principais alterações, ressaltamos o dispositivo que instituiu uma nova incidência do ITCMD. Está previsto, no incido I do § 5º do artigo 160 do PLP 108/2024 que a distribuição desproporcional de dividendos, a cisão desproporcional e o aumento ou redução de capital a preços diferenciados passam a ser consideradas como doações para fins de incidência. Esse dispositivo, muito utilizado, em especial por empresas pequenas e prestadoras de serviços, cuja contribuição para o resultado está relacionada ao efetivo serviço de cada sócio, está previsto no artigo 1.007 do Código Civil – Lei nº 1.406/2002.
 

Outro ponto de destaque é a previsão expressa de incidência do ITCMD sobre os instrumentos financeiros tidos no exterior, os chamados trusts, tendo o artigo 168 do PLP 108/2024 regulamentado as bases e as condições em que serão tributados os bens e direitos que compõem o patrimônio dos trusts, considerando a mesma definição prevista na legislação do imposto de renda, em especial a Lei nº 14.754, de 12/12/2023.
 

Já o artigo 171 do 2º projeto de regulamentação do IBS e da CBS eleva o status da base de cálculo do ITCMD nos casos de quotas de capital ou ações não negociadas no mercado organizado. Antes prevista pelas esparsas legislações estaduais, a partir promulgação do PLP 108, a Lei Complementar definirá que o cálculo do ITCMD será apurada com base no patrimônio líquido da pessoa jurídica ajustado pela avaliação de ativos e passivos a valor de mercado e ainda acrescido do valor de mercado do fundo de comércio, deixando para Estados e Distrito Federal a definição das regras desses ajustes.
 

Por meio de substitutivo, a Câmara Federal aprovou outra novidade: a incidência do ITCMD sobre os valores de previdência privada, exceção feita aos aportes dos planos VGBL feitos por prazo superior a cinco anos da ocorrência do fato gerador.
 

Isso tudo sem falar na real e quase certa possibilidade de aumento das alíquotas do imposto. O artigo 174 do PLP 108/2024 definiu que a alíquota será estabelecida pelos Estados e o DF, será progressiva sobre o valor da herança ou doação e observará a alíquota máxima fixada pelo Senado Federal, que hoje é de 8%, conforme Resolução nº 9, de 1992.
 

O Estado de São Paulo, que sempre praticou alíquota única de 4%, já tem um projeto de lei em tramitação na Assembleia Legislativa (PL 7/2024) para criar uma tabela progressiva, com mínimo de 2% (até R$353.600,00) e máxima de 8% (acima de R$9.900.800,00)
 

Fiquemos atentos, pois o Senador Cid Gomes (PDT-CE) apresentou o Projeto de Resolução nº 57, em 2019, elevando a alíquota máxima para 16%, projeto esse que ainda está em tramitação, na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE). O PLP 108/2024 também define quem são os sujeitos ativos e passivos do ITCMD e a sua fiscalização, além de alterar o Código Tributário Nacional no que se refere ao ITBI. Mas isso é material para outro artigo. E vamos aguardar os próximos capítulos, pois a sanha arrecadatória está crescendo na carona da reforma que tramita no Congresso Nacional.
 

*Enio De Biasi é sócio-diretor da Elebece Consultoria Tributária.

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