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Em Manairama, o escritor potiguar Raimundo Sales lança luz sobre as complexidades ocultas nas pequenas cidades brasileiras, particularmente no Nordeste. O romance, ambientado em uma cidade fictícia do Seridó Potiguar, utiliza personagens vívidos e simbologias poderosas para narrar histórias de desigualdades, corrupção, preconceitos e resiliência.
A obra desconstrói os estigmas frequentemente associados ao interior nordestino, mostrando não apenas os desafios do semiárido, mas também a riqueza cultural, a força coletiva e a capacidade de superação de seus habitantes. Inspirado em vivências pessoais e na cidade de Ouro Branco, onde Sales passou boa parte de sua juventude, Manairama é uma reflexão profunda sobre a realidade de muitas comunidades invisibilizadas no Brasil.
Na entrevista a seguir, o autor compartilha detalhes sobre o processo criativo, as críticas sociais presentes no romance e suas reflexões sobre o Nordeste, ao mesmo tempo que provoca seus leitores a questionar estigmas e a imaginar um futuro mais justo e próspero para a região.
Divulgação / Scortecci Editora |
Entrevista
Raimundo Sales – A CRÍTICA
· O que o
motivou a escrever Manairama? Houve alguma experiência pessoal ou
história específica que serviu como ponto de partida para a criação dessa
narrativa?
O que me motivou a escrever Manairama foi,
em parte, resgatar também aspectos do nosso Seridó Potiguar hoje não mais
utilizados, a título de exemplo, o uso de jumentos nos trabalhos da zona rural,
onde há várias ilustrações na obra. Hoje, a moto substituiu o animal. A vida e
o trabalho do meu avô materno, agricultor na região, foi a principal fonte de experiência
para a criação dessa narrativa.
· A cidade
fictícia de Manairama é inspirada em algum lugar real do Seridó Potiguar ou do
Nordeste?
Manairama é inspirada na cidade de Ouro Branco -
Rio Grande do Norte, localizada no Serido Potiguar e no Semiárido Nordestino. É
uma cidade bem pequena, com quatro mil e poucos habitantes. Morei nela dos meus
doze até meus vinte e três anos de idade. Pelo tamanho, e pelo fato de
conhecermos quase todo mundo, as histórias muito cheias de vida chegam ao nosso
conhecimento com mais facilidade.
· O elemento
da maldição e o clima hostil na narrativa servem como metáforas para os
desafios do semiárido nordestino. Como você enxerga o papel dessas simbologias
no romance?
A maldição levanta a reflexão, constantemente
frisada pelos moradores se o atraso do lugar é devido à maldição lançada, o que
é respondido no decorrer e no fim da obra. Quanto às secas, o personagem Luís
Medeiros, por exemplo, assa xiquexique nas estiagens para saciar a fome do
rebanho, fato que é muito desconhecido por pessoas que moram no próprio
Semiárido Nordestino desconhecem. Essas simbologias são desafios a serem
superados.
· Os
personagens de Manairama formam uma teia complexa que representa
várias faces da vida em cidades pequenas. Como foi a criação dessas figuras e o
que elas simbolizam para você?
Cada um desses personagens é inspirado em pessoas
reais, o que é feito por todos os escritores, fazendo alterações, por se tratar
de uma obra de ficção. Cada um deles tem uma função específica: Luís Medeiros e
o sertanejo que passa a vida no sítio; Jorge Oliveira é o nordestino que migra;
Sebastião Pereira é o prefeito do lugar e grande chefe político; Benedito
Cavalo é comilão insaciável; Cobra Parida, o bêbado; e Cristina Doida, a insana
mental, dentre muitos outros.
· Seu livro
aborda temas como desigualdades, preconceitos, negligências e corrupção
política. Qual impacto você espera que essas críticas sociais tenham nos leitores?
Tais críticas sociais visam a incutir nos
leitores a reflexão de que podemos viver numa sociedade melhor e mais justa. As
muitas “tramoias” políticas que são narradas em muitos tópicos, estão na obra
para a chamar a atenção e causar revolta. Vemos em muitos desses casos profundo
desperdício de dinheiro público, que poderiam ser empregados corretamente, em
prol do povo em geral. Um pequeno retrato do nosso Brasil.
· Mesmo em
meio às adversidades, os moradores de Manairama encontram resiliência na arte,
no humor e na fé. Por que esses elementos foram tão centrais na narrativa?
É interessante que mesmo nos trabalhos braçais
mais pesados, brocas, por exemplo, os trabalhadores sempre laboram com muito
humor, brincando, aperreando uns os outros. Apesar de Manairama ser bem
pequena, há muitos artistas locais, principalmente, poetas. A religião se faz
muito presente no início do lugar e se mantém presente no cotidiano. Todos os
três são remédios a aliviar as dores.
· Qual a
principal mensagem ou reflexão que você gostaria que os leitores levassem ao
final de Manairama?
Que, com investimentos acertados, o Semiárido
Nordestino pode se tornar um lugar ainda melhor para se viver. Acredito que a
Zona Franca de Manaus, independentemente de cor, de bandeira ou de grupo
político, era para ter sido criada no Semiárido Nordestino. Teria trazido bem
mais efetividade e justiça social. Mais sempre haverá espaço ou tempo para se
pensar em melhorias.
· Manairama desconstrói estigmas
associados ao interior nordestino. Que outros mitos ou visões equivocadas sobre
o Nordeste você gostaria de abordar em futuros trabalhos?
Que ainda há muitos preconceitos contra o
Nordeste Brasileiro, alguns, totalmente impertinentes, por exemplo, achar que
todos os Nordestinos passam fome, o que é uma tremenda ignorância. Nas obras de
ficção procuraremos desconstituir esse fato. Por isso em Manairama vários
capítulos falam em muita fartura.
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