Constituição republicana consolidou o novo regime político e estabeleceu as bases do Estado brasileiro, mas manteve desafios e limitações à participação popular.
Por Carol Santos
No dia 24 de fevereiro de 1891, o Brasil dava um passo crucial para a consolidação de seu novo regime político com a promulgação da primeira Constituição republicana. Esse marco representou a formalização das bases legais do Estado brasileiro após o golpe de 15 de novembro de 1889, liderado pelo Marechal Deodoro da Fonseca, que pôs fim à monarquia e instaurou a República. A nova Carta Magna trouxe princípios fundamentais para a organização do país, como a separação dos poderes, o federalismo e a ampliação de direitos civis, ainda que de forma restrita a determinados grupos sociais.
Uma constituição, em sua essência, é o conjunto de normas que rege a organização política, jurídica e social de um país. Ela estabelece direitos e deveres dos cidadãos, delimita as funções dos poderes e define os princípios que guiam a administração pública. No caso da Constituição de 1891, o Brasil adotou um modelo inspirado na Constituição dos Estados Unidos, com a criação de um sistema federativo e a divisão entre os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, buscando equilibrar as forças políticas que emergiam no novo cenário republicano.
Segundo o advogado e professor associado na Logos University Inc., Marco Túlio Elias Alves, a Constituição de 1891 foi fundamental para dar legitimidade ao novo regime republicano, ainda que tenha refletido as complexidades e desafios da época. “Esse documento representou um avanço ao estabelecer a separação entre Estado e Igreja e introduzir o federalismo, conferindo maior autonomia aos estados. No entanto, o sistema político ainda se mantinha elitista, com restrições de participação popular”, explica.
A transição do Império para a República não foi simples. Havia uma necessidade urgente de estabelecer diretrizes claras para o funcionamento do país, que vivia um momento de instabilidade e disputas entre grupos políticos. A Constituição de 1891 surgiu como uma resposta a esse desafio, instituindo o presidencialismo e ampliando o papel das províncias – que passaram a ser chamadas de estados –, conferindo-lhes maior autonomia administrativa e financeira. Esse modelo descentralizado foi uma tentativa de atrair o apoio das elites regionais, essenciais para a governabilidade do novo regime.
Entre as principais inovações trazidas pela nova Constituição, destaca-se a criação do voto direto para a escolha do presidente da República, ainda que restrito a homens alfabetizados e maiores de 21 anos, excluindo mulheres, analfabetos e grande parte da população pobre. Outra mudança significativa foi a separação entre Estado e Igreja, estabelecendo o caráter laico do governo brasileiro, algo inédito na história do país até então.
Apesar dos avanços institucionais, a Constituição de 1891 manteve privilégios a grupos dominantes e não enfrentou questões sociais profundas, como a inserção dos recém-libertos no mercado de trabalho ou a inclusão dos mais pobres na vida política. “A concentração de poder nas oligarquias regionais foi um dos maiores desafios da República nascente, e a Constituição não conseguiu superar essa barreira, resultando em um sistema excludente”, analisa Marco Túlio Elias Alves.
Mesmo com suas limitações, a Constituição de 1891 foi essencial para estabelecer um arcabouço jurídico que sustentou a República nascente. Ela pavimentou o caminho para a construção de um Estado democrático de direito, ainda que esse processo tenha sido lento e marcado por instabilidades, como a renúncia de Deodoro da Fonseca e a ascensão de Floriano Peixoto ao poder.
A importância da Constituição para o Estado de Direito
A Constituição é o pilar central de um Estado de Direito, pois estabelece as regras que garantem o funcionamento das instituições e a proteção dos direitos fundamentais dos cidadãos. Em países democráticos, como o Brasil, ela é o instrumento que define a relação entre o governo e a sociedade, assegurando que todos estejam submetidos às mesmas normas e princípios.
No caso da República brasileira, a Constituição de 1891 foi o primeiro grande passo para garantir essa base jurídica, trazendo o conceito de legalidade e controle do poder estatal. A partir dela, o país começou a organizar suas instituições de forma mais estruturada, delimitando as competências dos governantes e ampliando o conceito de cidadania, ainda que de forma restrita.
Para Marco Túlio Elias Alves, o papel da Constituição na construção do Estado de Direito vai além da organização das instituições. “Ela é um instrumento de garantia dos direitos individuais e coletivos, além de ser um freio contra arbitrariedades do poder. A Constituição de 1891 abriu esse caminho, mas sua eficácia dependia da aplicação prática, o que nem sempre ocorreu naquele contexto”, avalia o professor.
Outro ponto fundamental é a necessidade de adaptação constitucional conforme as mudanças sociais, econômicas e políticas do país. No Brasil, essa evolução ocorreu por meio de diversas mudanças constitucionais, culminando na Constituição de 1988, que consolidou a democracia e garantiu uma série de direitos sociais antes inexistentes.
Assim, o legado da primeira Constituição republicana está na construção de um país baseado em regras claras, com a separação de poderes e a busca pela garantia dos direitos civis. Mesmo com suas limitações, ela abriu caminho para um processo contínuo de aperfeiçoamento institucional, que permanece até os dias atuais.
Em um mundo cada vez mais dinâmico, a importância da Constituição como garantidora da ordem democrática e dos direitos individuais se torna ainda mais evidente. Por isso, compreender sua função e sua evolução ao longo da história é essencial para a construção de uma sociedade mais justa e equitativa.
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