A reforma tributária, embora tardia, é um avanço necessário para o Brasil. Ela surge como uma luz no fim do túnel de um sistema caótico, complexo e injusto, que há décadas sufoca a produtividade das empresas, onera os mais pobres e impede o país de alcançar seu potencial de desenvolvimento. No entanto, como toda mudança estrutural, sua implementação exige cuidado, planejamento e, sobretudo, adaptação. E é aqui que entra um tema crucial, mas pouco discutido: a necessidade de ajustar os contratos públicos à nova realidade que a reforma tributária trará de forma gradual.
Os contratos públicos são o alicerce sobre o qual se constrói a infraestrutura do país. Eles regem desde a construção de estradas e portos até a prestação de serviços essenciais, como saúde e educação. Contudo, esses contratos foram elaborados sob um regime tributário que está prestes a mudar radicalmente. A transição para um sistema mais simplificado, com a unificação de tributos como PIS, Cofins, IPI e ICMS, exigirá uma revisão profunda das cláusulas financeiras e dos mecanismos de reequilíbrio econômico-financeiro desses contratos.
Imagine, por exemplo, uma concessionária de rodovias que calculou seus custos e tarifas com base nas alíquotas vigentes do ICMS. Com a reforma, esse imposto será substituído pelo IBS (Imposto sobre Bens e Serviços), cujas regras e impactos ainda estão em fase de consolidação. Se não houver uma adaptação contratual que preveja essa transição, o risco é de que haja desequilíbrios financeiros, litígios intermináveis e, no pior dos cenários, a paralisação de obras e serviços essenciais.
Além disso, a reforma tributária não será implementada de uma só vez. Ela ocorrerá de forma gradual, com períodos de transição que podem variar de acordo com o setor e a região. Isso significa que, durante alguns anos, conviveremos com regras antigas e novas, o que exigirá dos gestores públicos uma capacidade de planejamento e flexibilidade sem precedentes. Os contratos públicos precisarão prever cláusulas de transição, mecanismos de revisão e ajustes periódicos para garantir que as mudanças tributárias não comprometam a execução das obras e serviços.
Mas não basta apenas adaptar os contratos. É preciso também capacitar os gestores públicos, os empresários e os operadores do direito para lidar com essa nova realidade. A reforma tributária não é apenas uma mudança de números e alíquotas; é uma transformação cultural que exigirá um novo olhar sobre a gestão pública e privada. E aqui, mais uma vez, o papel do Estado é fundamental. Ele deve atuar não apenas como regulador, mas como facilitador, garantindo que todos os atores envolvidos tenham as informações e os instrumentos necessários para navegar nesse novo cenário.
Nós, do escritório Porto Advogados, estudamos o setor de saneamento básico, por exemplo. Só para que se tenha uma ideia da centralidade e gravidade do tema que tratamos, o incremento de custos nas tarifas quando a integralidade da reforma entrar em vigor será de 18%. Isto vai gerar enorme tensão entre concessionários e concedentes e, mal encaminhado o assunto, as consequências serão trágicas.
Por fim, é importante ressaltar que a adaptação dos contratos públicos à reforma tributária não é apenas uma questão técnica. É, acima de tudo, uma questão de responsabilidade política. A reforma foi aprovada com o objetivo de simplificar o sistema, reduzir desigualdades e estimular o crescimento econômico. Se não cuidarmos dos detalhes, como a adequação dos contratos públicos, corremos o risco de transformar uma oportunidade histórica em mais um capítulo de frustração e ineficiência.
O Brasil não pode mais se dar ao luxo de errar. A reforma tributária é um passo importante, mas só terá sucesso se for implementada com competência, transparência e visão de futuro. Adaptar os contratos públicos a essa nova realidade não é uma opção; é uma obrigação de todos aqueles que desejam ver o país avançar. E, como sempre digo, o Brasil merece mais do que discursos. Merece ação.
Nenhum comentário:
Postar um comentário