Por César Silva (*)
O Ministério da Educação (MEC) comprometeu-se a publicar até janeiro de 2025 um novo marco regulatório para os cursos de graduação a distância (EAD). No entanto, a liberação da nova regulamentação está atrasada e há uma preocupação crescente entre educadores de que as mudanças propostas possam representar um retrocesso para a modalidade.
Desde janeiro, o texto do novo marco regulatório encontra-se na Casa Civil, e sua demora na publicação pode estar atrelada a um cenário político desafiador. A baixa popularidade do governo federal, associada à insatisfação da população com diversas pautas educacionais, pode estar influenciando a hesitação na divulgação das novas diretrizes. Além disso, há uma percepção de que o posicionamento do atual ministro da Educação, Camilo Santana, pode levar a uma visão mais restritiva para o ensino a distância.
A definição de um marco regulatório para qualquer modalidade de ensino deveria ser pautada por evidências e dados concretos sobre aprendizagem, não por suposições ou preferências ideológicas. Especialistas que atuam diretamente no setor educacional enfatizam a necessidade de avaliar o impacto do EAD com base em indicadores objetivos, e o Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (Enade), junto ao Indicador de Diferença entre os Desempenhos Observado e Esperado (IDD), representa uma das principais fontes de dados confiáveis para medir a aprendizagem dos estudantes no Brasil.
A análise criteriosa desses indicadores é fundamental, pois afirmar que os cursos EAD apresentam desempenho inferior aos presenciais sem considerar o contexto e a curva de aprendizagem dos alunos pode levar a conclusões equivocadas. Muitas vezes, os desafios enfrentados pelos estudantes a distância não decorrem da modalidade em si, mas sim da falta de adaptação dos novos entrantes ao modelo, um fator frequentemente negligenciado na formulação de políticas públicas.
O que já se conhece dos novos referenciais de qualidade para o EAD sugere um foco excessivo nas condições de oferta, em vez dos resultados de aprendizagem. Em outras palavras, há um esforço maior em restringir a expansão da modalidade do que em garantir que ela possa alcançar alunos que, de outra forma, não teriam acesso ao ensino superior. Isso representa um risco de retrocesso para a democratização do ensino no país.
A priorização de critérios estruturais em detrimento da avaliação de impacto educacional levanta um questionamento importante: qual deve ser o verdadeiro objetivo da regulação? Garantir qualidade no ensino ou limitar a expansão do acesso? Sem uma base de evidências concretas que justifique as mudanças propostas, corre-se o risco de adotar um modelo regulatório que dificulta o crescimento do setor e prejudica milhares de estudantes que dependem do EAD para obter uma formação superior.
A falta de transparência e eficiência na gestão da educação superior no Brasil é outro fator preocupante. O Enade de 2023, por exemplo, ainda não teve seus resultados divulgados, o que compromete a avaliação da qualidade do ensino superior no país. Como um governo que se propõe a reformular a regulação do ensino pode justificar tamanha demora na publicação de dados fundamentais para a formulação dessas mesmas políticas?
O atraso na divulgação de indicadores cruciais e na implementação do novo marco regulatório evidencia falhas na condução do MEC e reforça a necessidade de uma abordagem mais técnica e menos ideológica na regulamentação do ensino a distância. Se o objetivo é realmente melhorar a qualidade da educação no Brasil, o foco deve estar nos resultados de aprendizagem e na ampliação do acesso, e não em medidas restritivas que podem comprometer o futuro de milhares de estudantes.
O Brasil precisa acordar para a urgência de uma regulação equilibrada, baseada em evidências e que realmente contribua para a melhoria da educação superior no país.
(*) César Silva é Diretor-Presidente da Fundação de Apoio à Tecnologia (FAT) e docente da Faculdade de Tecnologia de São Paulo – FATEC-SP há mais de 30 anos. Foi vice-diretor superintendente do Centro Paula Souza. É formado em Administração de Empresas, com especialização em Gestão de Projetos, Processos Organizacionais e Sistemas de Informação
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