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terça-feira, 11 de março de 2025

Parada cardíaca e morte súbita em atletas jovens não aumentaram durante a pandemia de COVID-19, diz pesquisa

Com a participação de cientista brasileira, o estudo aponta que nem a doença nem a vacina estão ligadas a um maior risco cardiovascular nesse público, ao contrário de desinformações divulgadas à época


Em 2023, o jogador de futebol americano Damar Hamlin, do Buffalo Bills, sofreu uma parada cardíaca após forte impacto no peito e teve de ser removido do campo às pressas. O fato reforçou a onda de desinformação antivacina (foto: Schetm/Wikimedia Commons)

Luciana Constantino | Agência FAPESP – Pesquisa com a participação de cientista brasileira derruba uma desinformação amplamente divulgada durante a pandemia de COVID-19: concluiu que não houve aumento de casos de parada cardíaca ou morte súbita entre atletas jovens nos Estados Unidos provocados pela doença ou pela vacina.


De acordo com o trabalho, publicado na revista científica JAMA Network Open, os registros de parada cardíaca e morte súbita em atletas foram semelhantes entre o período anterior (2017-2019) e o pandêmico (2020-2022).


O estudo analisou laudos médicos e um conjunto de dados de atletas entre 10 e 34 anos identificados por meio de um programa do National Center for Catastrophic Sport Injury Research (NCCSIR), mantido desde 2014 com o objetivo de acompanhar lesões e doenças relacionadas à participação em esportes. Os resultados mostraram dados semelhantes: foram 184 registros de paradas cardíacas ou mortes súbitas durante a pandemia e 203 no período anterior.


Os pesquisadores incluíram na coorte atletas dos níveis juvenil, ensino médio, faculdade ou profissional de vários esportes – entre eles, basquete, futebol americano e futebol – que sofreram miocardite, parada cardíaca súbita ou morte, seja durante exercícios ou em situações consideradas de repouso.


A parada cardíaca foi definida como um colapso inesperado no qual a ressuscitação cardiopulmonar e/ou desfibrilação chegaram a ser feitas. Nos casos de óbito foram incluídas causas cardíacas ou as que não tiveram outra explicação, mas um histórico consistente com morte relacionada ao coração.


“Nos Estados Unidos foram feitas muitas associações entre casos de atletas que tiveram paradas cardíacas enquanto jogavam, a COVID-19 e a vacinação. Em redes sociais chegaram a usar hashtags e a circular um vídeo produzido por ativistas antivacinas sobre o assunto. Mas nossa pesquisa mostra que não houve aumento desses casos nem de miocardite durante a pandemia”, explica a fisiologista do exercício Camilla Astley, primeira autora do artigo.


Integrante do Centro de Medicina do Estilo de Vida da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FM-USP), coordenado pelo professor Bruno Gualano, Astley é bolsista da FAPESP.


Ela conduziu o trabalho durante um intercâmbio na Faculdade de Medicina da University of Washington (Seattle) sob a supervisão do professor e também autor do artigo Jonathan Drezner, que é diretor do UW Medicine Center for Sports Cardiology e médico das equipes de futebol americano Seattle Seahawks e Washington Huskies.


“Acredito que o resultado do nosso estudo responde às preocupações levantadas nas redes sociais. Em nossa análise de sensibilidade removemos os anos de 2019 e 2020, pois os adiamentos e cancelamentos de eventos esportivos geraram incertezas sobre a participação total. Assim, comparamos 2017/2018 com 2021/2022, incluindo dois anos em que as vacinas estavam sendo utilizadas, e não houve alteração na frequência de risco de miocardite e parada cardíaca súbita ou morte cardíaca súbita em atletas jovens e competitivos nos EUA antes ou durante a pandemia”, detalha Drezner à Agência FAPESP.


Desinformação


Em 2021, uma compilação de vídeos postada em site de ativistas americanos antivacina mostrava atletas desmaiando ao som de música de terror e sugeria ligação com a COVID-19. À época, casos exibidos já haviam sido desmentidos, sendo que alguns jogadores nem sequer teriam sido vacinados antes de adoecerem.


A onda de desinformação voltou em 2023, quando o jogador de futebol americano Damar Hamlin, do Buffalo Bills, sofreu uma parada cardíaca após forte impacto no peito em uma partida. Ficou recuperado e acabou se tornando um símbolo para conscientizar sobre doenças do coração. Meses depois, durante um treino na universidade, Bronny James, filho do astro do basquete LeBron James, teve uma parada cardíaca decorrente de uma doença congênita, porém, seu caso foi usado pelo movimento antivacina.


Outros estudos científicos publicados nos últimos dois anos (por exemplo, no periódico Circulation  no British Journal of Sports Medicine) já vinham demonstrando que não há evidências de aumento do risco ou a associação entre parada cardíaca fora do hospital e vacinação contra a COVID-19.


A parada cardíaca acontece quando o funcionamento do coração é interrompido, resultando na ausência de fluxo sanguíneo e impedindo a chegada de oxigênio a órgãos vitais. Apesar de ser mais comum em idosos e pacientes com fatores de risco e ou sedentários, pode ser provocada, por exemplo, por cardiomiopatia hipertrófica (caracterizada pelo espessamento das paredes dos ventrículos), por distúrbios genéticos ou defeitos congênitos.


Em atletas jovens, a maioria das mortes cardíacas súbitas ocorre mesmo sem que as pessoas apresentem anomalias na estrutura cardíaca. Asma, insolação e o uso de medicamentos para aumentar o desempenho físico podem contribuir para causar esse tipo de morte. Estima-se que de um a três em cada 100 mil atletas jovens saudáveis possam desenvolver anomalias do ritmo cardíaco e morrer repentinamente fazendo exercícios.


“Muitas vezes, as pessoas têm uma condição congênita e nem sempre detectam para tratamento até registrar a parada cardíaca, mesmo sendo jovens”, completa Astley.


Para Gualano, que não participou da pesquisa, mas é o orientador do doutorado de Astley, esses resultados são importantes porque confirmam a segurança das vacinas e reforçam a hipótese de que a COVID-19 não causa doenças cardíacas em atletas, conforme apontado em publicação de 2022 do Centro de Medicina do Estilo de Vida. “A ciência, em seu tempo, é capaz de desmascarar pseudoteorias que são ameaças à saúde das pessoas”, completa o professor.



O artigo Sudden Cardiac Arrest Among Young Competitive Athletes Before and During the COVID-19 Pandemic pode ser lido em: https://jamanetwork.com/journals/jamanetworkopen/fullarticle/2830557?utm_campaign=articlePDF&utm_medium=articlePDFlink&utm_source=articlePDF&utm_content=jamanetworkopen.2024.61327.
 

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