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quarta-feira, 23 de abril de 2025

A nova globalização e o fim dos Impérios



Victor Missiato, professor de História do Colégio Presbiteriano Mackenzie – Tamboré. Dr. em História e analista político

 

Há 80 anos, três homens se sentaram em uma reunião e redesenharam o mundo a partir de três posições hegemônicas, sendo uma delas em decadência e duas em ascensão. Winston Churchill, Franklin Roosevelt e Josef Stálin se reuniram em Yalta, cidade localizada na Crimeia, então território soviético. A partir de seus interesses, os líderes da Inglaterra, EUA e URSS tinham como objetivo principal evitar um terceiro conflito mundial, bem como salvaguardar seus interesses na nova ordem pós-Europa, continente esse que deixou de ser a principal força geopolítica da Modernidade, após 1945.
 

Contrariamente ao que ocorreu na Conferência de Berlim, no século XIX, quando as potências europeias redefiniram suas colônias na Ásia e África, em Yalta, não se tratava mais de estabelecer novas fronteiras coloniais, mas expandir zonas de influência baseadas em suas ideologias. A autodeterminação dos povos se fez presente nesse ínterim, revelando um novo tipo de imperialismo, cada vez mais político e econômico em detrimento do territorialismo material. Paradoxalmente, os investimentos em desenvolvimento militar nunca foram tão exorbitantes como daquele tempo para os dias atuais.
 

Segundo o geógrafo David Harvey, em seu livro “O Novo Imperialismo”, originalmente publicado em 2003, o petróleo se transformara no motor desse novo tipo de expansão, pois “quem controlar o Oriente Médio controlará a torneira global do petróleo, e quem controlar a torneira global do petróleo poderá controlar a economia global, pelo menos no futuro próximo”. Um pouco mais de duas décadas se passaram após essa afirmação, que vem sofrendo diversas contestações a partir de uma nova conjuntura mundial.
 

No início do século XXI, uma nova potência geopolítica ascendeu ao poder. Trata-se da China, que já possuía um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU, mas ainda não figurava entre as principais economias do mundo. Seu crescimento foi um dos mais rápidos da História, levando em consideração a mudança de 800 milhões de pessoas que abandonaram a linha da pobreza em apenas três gerações. Sem escalar nenhuma grande guerra imperialista, a China chegou ao posto de segunda maior economia do mundo sem estar envolvida diretamente em conflitos territoriais.
 

Muito estudiosa acerca dos eventos que antecederam a sua ascensão, a China compreendeu o tamanho dos problemas soviéticos e norte-americanos nas invasões malsucedidas, tanto no Vietnã, quanto no Afeganistão, bem como no Iraque, após o ataque às Torres Gêmeas, em 2001. Se a guerra contra os vietnamitas precedeu a Crise do Petróleo, na década de 1970, a falsa busca por armas químicas no Iraque contribuiu para a crise imobiliária, em 2008. O custo de uma guerra imperialista já vinha sendo observado desde o fim da Segunda Guerra, mas um novo imperialismo insistia em se fazer presente através do que ocorria nas guerras do Oriente Médio.
 

Por meio de uma nova estratégia posicional, a China emergiu enquanto potência, equilibrando uma política reformista no campo econômico sem enfrentar uma abertura radical, diferentemente de países como Rússia, Argentina e Brasil, que sofreram com tais políticas nas décadas de 1980 e 1990, conforme nos ilustra a economista Isabela M. Weber, em sua obra “Como a China escapou da terapia de choque”. Depreciando sua moeda enquanto aumentava sua produtividade, a China tornou-se a primeira potência moderna a chegar no topo sem invadir algum território. E enquanto o dólar e as bases americanas mundo afora ainda salvaguardam os interesses do último império, a China se prepara para dividir sua influência com novos atores, como a Índia.
 

Desse modo, olhando em perspectiva, a multipolaridade das potências mundiais, incluindo EUA, União Europeia, China e Índia resultará em um crescente enfraquecimento do conceito de imperialismo para explicar a geopolítica mundial como ocorreu nos últimos dois séculos. Prova disso é que no primeiro quarto deste século, o mundo ainda não viu uma Restauração pós-Napoleônica, nem um Tratado de Versalhes pós-Primeira Guerra. Nossa guerra atual é especulativa.

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