Cuidados necessários para garantir estabilidade e desenvolvimento saudável em casos de divórcio
O fim de um relacionamento, por si só, costuma trazer dúvidas e angústias ao ex-casal, principalmente, quando há filhos envolvidos. Mas, quando a criança tem algum tipo de neurodivergência — como Transtorno do Espectro Autista (TEA), Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) ou outras condições que exigem cuidados especiais — os desafios podem se multiplicar. “A rotina, o apoio terapêutico e o ambiente estável se tornam ainda mais essenciais para o desenvolvimento saudável de crianças e jovens. Quando ocorre a separação, o planejamento adequado faz toda a diferença”, afirma o advogado familiarista Henrique Hollanda, que atua em casos de divórcio com filhos neurodivergentes há mais de dez anos.
Em 2024, o Ministério da Saúde divulgou dados preliminares do Relatório Nacional de Neurodesenvolvimento, estimando que cerca de 2,2 milhões de crianças no Brasil recebem assistência especializada para algum tipo de neurodivergência. Para essas famílias, a reconfiguração familiar decorrente da separação pode afetar, diretamente, a continuidade de tratamentos e a manutenção de rotinas que são fundamentais para o bem-estar dos filhos. Segundo Hollanda, a guarda compartilhada continua sendo a modalidade mais recomendada na maior parte dos casos, mas não se aplica de maneira absoluta. “Não adianta impor uma guarda compartilhada se o dia a dia não permite os devidos cuidados — seja por conflito entre os pais ou pela falta de estrutura na casa de um dos genitores”, pontua o advogado.
O ordenamento jurídico brasileiro se esforça em priorizar os interesses da criança e do adolescente, incluindo aqueles com deficiências ou condições que exigem suporte multidisciplinar. A Lei Brasileira de Inclusão (Lei n° 13.146/2015) e o Estatuto da Pessoa com Deficiência garantem uma série de direitos a crianças neurodivergentes, entre eles a facilidade de acesso aos serviços de saúde e educação adaptada. Na prática, porém, o especialista, Henrique Hollanda, explica que nem sempre é simples unir esses direitos às realidades de uma separação: “Famílias que já enfrentam sobrecarga emocional pela rotina de terapias e consultas podem passar por conflitos adicionais ao tentar dividir responsabilidades, despesas e horários de locomoção.”
Um dos pontos mais sensíveis é a manutenção das rotinas. Para muitas crianças com TEA, por exemplo, mudanças abruptas de ambiente ou de horário podem acarretar estresse e regressão em certos comportamentos. Por isso, a fim de amenizar possíveis impactos, especialistas recomendam o envolvimento de psicólogos, assistentes sociais e terapeutas familiares para elaborar uma transição planejada. “A gente percebe que, quando há orientação profissional, fica muito mais viável definir detalhes como qual genitor acompanhará consultas, quem ficará responsável por comprar medicamentos ou gerenciar terapias, e como serão organizados os períodos de convivência”, destaca Hollanda.
Outra questão fundamental é a pensão alimentícia, já que as necessidades de uma criança com neurodivergência podem requerer investimentos maiores — seja em terapias, equipamentos de locomoção ou cuidadores especializados. De acordo com o Boletim Nacional de Ações de Família do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) publicado em fevereiro de 2025, 57% das disputas envolvendo crianças com necessidades especiais apresentaram pedidos de reavaliação do valor da pensão para custear tratamentos contínuos. “Em muitos casos, a pensão precisa ser recalculada justamente para contemplar despesas fixas mais altas que o convencional, garantindo a continuidade do tratamento”, explica o advogado.
Embora a lei vise proteger o melhor interesse da criança, especialistas concordam que nenhuma norma é capaz de resolver todas as nuances emocionais de cada família. “A atuação de vários profissionais — advogados, psicólogos, pedagogos — colabora para que se chegue a um acordo que priorize, acima de tudo, a estabilidade e o bem-estar do filho. Manter o respeito e o diálogo entre os ex-cônjuges continua sendo o passo mais importante, mesmo que não seja fácil. Afinal, mais do que um papel judicial, o que está em jogo é o futuro de uma criança que merece todo o suporte para continuar se desenvolvendo plenamente”, conclui Henrique Hollanda.
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